domingo, 23 de novembro de 2008

António Jaime foi brutalmente assassinado há um ano

Aconteceu há um ano, numa madrugada de sábado à saída da discoteca Mayombe, nas imediações da Cadeia de São Paulo.
Alguém decidiu que António Jaime estava a mais na nossa cidade de Luanda e por isso achou que ele tinha de ir morar noutro sítio, tinha de mudar de endereço, definitivamente.
Esse alguém que impávido, sereno e completamente imune e impune, continua escondido nas trevas da nossa cidade, não foi capaz de executar sozinho o seu ardente desejo.
Esse alguém, convocou um grupo de pessoas igualmente desconhecidas e organizou uma emboscada mortal ao carro onde seguia António Jaime.
Chamar emboscada aquilo é complicado pela ideia que temos da palavra quando aplicada à tácticas de guerrilha.
Os termos brasileiros tocaia ou arapuca talvez se apliquem mais ao estratagema utilizado pelos seus carrascos, que não eram assim tão desconhecidos pois em momento algum do assalto fizeram questão de esconder os seus rostos, diante de alguns curiosos que presenciaram o crime, numa zona que já conhecia algum movimento de pessoas aquela hora da madrugada.
Já crivado de balas, o António Jaime ainda teve "direito" ao chamado tiro de misericórdia com que se abatem os cavalos moribundos.
O novo endereço de António Jaime está agora localizado no nº 49 do Cemitério Velho, onde pode ser visitado sem vida.
O António Jaime não era só meu amigo. Eu também era amigo dele.
Com ele aprendi um pouco mais sobre o valor da amizade para além dos interesses, das conjunturas e dos jogos de cintura, no país real chamado Angola.
Naquela madrugada também morri um bocado com ele, para além do risco físico que corri e que, se calhar, ainda continuo a correr, pelo menos enquanto o crime não for esclarecido, apesar de já se ter passado um ano.
Mais um caso a caminho do esquecimento?
Tudo leva a crer que sim.
Naquela madrugada de sábado morri um bocado, sobretudo, na fé que era suposto ter na bondade dos homens e muito particularmente dos angolanos.
Em contrapartida a minha consideração pelos animais, particularmente os considerados selvagens, aumentou ainda mais.
A minha confusão em relação a localização exacta da selva passou a ser total.
Estávamos juntos e os nossos destinos foram separados por alguns minutos, graças aos percursos distintos que, à saída do Mayombe, as nossas viaturas seguiram em direcção ao Alcobaça onde deveríamos ter tomado um reparador muzongué.
Até hoje não sei o quê que se passou e porquê que se passou daquela forma.
Sei, no entanto, que se estivesse no mesmo carro ou se as nossas viaturas tivessem seguido a mesma rota, não estaria aqui a escrever esta crónica da saudade.
Sei também que o António Jaime tem agora uma campa raza no Alto das Cruzes.