sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Obama é o primeiro presidente não branco dos EUA (2)

1-Barack Obama acaba de ser eleito para a presidência dos EUA, onde vai figurar com a camisola nº 44 em mais de 170 anos de história dessa instituição democrática, cujo desempenho tantas decepções e frustrações já provocou, com a agravante dos seus impactos mais negativos serem sempre sentidos à escala planetária. Será o primeiro cidadão não branco a conseguir entrar na Casa Branca pela porta da frente, com as devidas honras, a que só os novos inquilinos escolhidos a dedo pela maioria dos norte-americanos, têm direito. A poderosa Casa Branca é uma mansão muito especial. Os seus inquilinos, por mais que se esforcem, por melhor que tratem dos jardins e conservem o prédio ou cumpram as restantes obrigações enquanto locatários, não podem viver lá por mais de oito anos. Nem pensar é bom! Quatro mais quatro, é o máximo que conseguem, pois o grande senhorio que é a Constituição dos EUA, não permite que ultrapassem esta barreira, em nome da saudável necessidade democrática que é a limitação de mandatos. Uma limitação que abre caminho à renovação pura e simples, sem preocupações com as inaceitáveis “continuidades”, que ainda vão eternizando por este mundo afora permanências no poder que ultrapassam os trinta anos consecutivos no poleiro. Angola, como se sabe, não é uma excepção nesta última tendência, ao integrar uma lista de países africanos, onde os seus dirigentes máximos acham que nasceram para governar ad eternum. Nos States, Obama sabe que mesmo que nas próximas eleições consiga uma maioria ainda mais expressiva, do que aquela acaba de obter, será apenas para mais quatro anos e, ponto final, parágrafo. O parágrafo será o regresso de um jovem com pouco mais de 50 anos (neste momento tem 47) à vida normal, onde vai poder sonhar com tudo, menos em voltar a ser Presidente dos EUA. Nos States onde a sua “tribo” é claramente minoritária, não ultrapassando os 13% da população, Obama pode ser chamado de “nigger”, “black”, “coloured” ou ainda “afro-american”. É evidente que a maioria que o elegeu é constituída pelos membros da “tribo” maioritária que é a branca, tida até então como demasiado conservadora para consentir que alguém de uma outra comunidade, pudesse ousar sequer pensar numa tal hipótese. Antes de qualquer outra consideração sobre o significado desta vitória, parece-nos relevante destacar o facto da América ter mudado radicalmente a sua abordagem interna de como fazer ou deixar fazer a política. Isto não quer dizer que o passado tenha desaparecido ou venha a desaparecer nos próximos anos. Nada disso, pois não é assim que a história da humanidade se processa. É preciso muito mais tempo. Apesar de ter deixado de dar notícias frescas, nada nos garante que o Klu-Klux-Klan (KKK) tenha sido extinto num congresso formal. O que vamos ter, certamente, a partir de agora, será uma América antes e depois de Obama. Para utilizarmos um chavão muito ao gosto dos analistas, diremos que depois do que se passou nesta quarta-feira, a América nunca mais será a mesma. O sonho de Obama já não é o de Martin Luther King. O Reverendo sonhava com uma América onde as raças pudessem coabitar de forma pacífica, sem os estigmas da colonização, da escravatura e da escandalosa desigualdade social e económica. Obama tem uma outra utopia. Ele sonha com uma América onde a barreira da raça deixará de constituir uma referência obrigatória ou necessária, como continua a ser nesta altura, mais de 30 anos depois de Luther King ter sido baleado. A sua eleição provou que em tese é possível chegar lá, que é possível chegar aos Estados Unidos da América, tal como eles foram idealizados pelos pais da independência norte-americana. 2-Para nós, utilizando o termo mais expressivo da gíria luandense, Obama é um "laton". Órfão de pai e mãe, o neto da Kota Sarah Obama que mora numa casa de pau-a-pique na localidade de Kogelo, situada a 500 km a noroeste de Nairóbi, capital do Quénia, está agora, com a Michelle e as duas canukas, a Malia e a Natasha, a caminho da Casa Branca em Washington DC, onde apenas deverá entrar no próximo dia 20 de Janeiro de 2009. "A América é um local onde todas as coisas são possíveis"-foram as suas primeiras palavras em Chicago, cerca de meia hora depois de McCain ter reconhecido a sua derrota e do mundo ter respirado de alívio. E agora Barack, por onde é que vais começar esta tua gigantesca tarefa de mudares a América e o Mundo (mudar para melhor, é claro)? É, certamente, a pergunta que todos quantos votaram e não votaram nele, têm na manga para lhe colocar na primeira oportunidade. Barack sabe disso e por isso estará, certamente, preparado ou a preparar-se da melhor forma, para responder a esta e a outras perguntas ainda mais complicadas e sensíveis. O problema é que as respostas, agora, não poderão ser apenas retóricas. Obama vai ter de traduzir o seu fabuloso e eleitoralista "Código de Change" em miúdos para todos nós entendermos muito bem como é que ele vai governar e assim continuarmos a brindar-lhe o apoio que ele vai certamente necessitar, em doses ainda maiores, nesta nova etapa da sua saga. O que todos nós sabemos, antes dele nos responder, com ou sem retórica, é que nada para ele vai ser fácil tendo em conta a pesada herança de makas e mais makas que George W. Bush lhe vai entregar após oito anos de desgoverno, de histeria internacional e de autismo ecológico Bush prepara-se para lhe entregar, numa bandeja feita com o mais frio alumínio, uma América à beira do colapso e um mundo cada vez mais instável (até já se fala no regresso à Guerra-Fria) e em profunda crise financeira internacional na sequência de todas as patifarias aprontadas por Wall Street. Barack Obama tem quanto a nós o grande desafio internacional de substituir as armas da destruição e da arrogância com que Bush impôs o “diálogo”, pelas armas da concertação em pé de igualdade com todos os protagonistas da cena internacional, particularmente lá onde os conflitos se eternizam e só fazem surgir mais ameaças a paz regional e mundial. O Iraque será o seu primeiro teste de credibilidade das mudanças prometidas, pois, como referimos, a partir de agora já não serão suficientes os seus dotes de oratória. Para Obama também não haverá cheques em branco, pelo menos da nossa parte. Quem prometeu vai ter de cumprir, embora saibamos que governar os EUA é muito mais complicado do que à primeira vista possa parecer, com todos os riscos, incluíndo os físicos, existentes para quem ousar desafiar o dragão. Antes de prometer, Obama já sabia, contudo, que era assim, portanto o problema agora é dele, Cá estaremos para ver e acompanhar o resto do filme que nesta segunda parte se passará a chamar “Obama in action”, com as atenções particularmente voltadas para o que deverá ser a nova política dos EUA para África.