quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

MPLA entre a direita e a esquerda democrática (3)

As esclarecedoras considerações que, com a devida vénia, transcrevemos para este espaço, são da autoria da brasileira Maria Hermínia Tavares de Almeida, doutora em ciência política pela USP.
Ela é professora titular do Departamento de Ciência Política e vice-directora do Instituto de Relações Internacionais da USP. "Através" destas considerações estaremos, certamente, em melhores condições para avaliarmos o relacionamento da praxis da actual direcção do MPLA com a teoria do que deve ser a "esquerda democrática".
Não será muito dificil para os mais críticos concluirem que o MPLA está de costas voltadas para a esquerda democrática.
(...) Existe uma esquerda autoritária, que vibra com as arengas de Fidel Castro, e uma esquerda democrática, que se inspira no espanhol Felipe González, na irlandesa Mary Robinson ou na norueguesa Gro Brundtland; uma direita autoritária e antiliberal, que admira o francês Le Pen e os skinheads, e uma direita ultraliberal, que venera a inglesa Margaret Thatcher. (…) Como o pensador italiano Norberto Bobbio (1909-2004), acredito que o tema da igualdade é o grande divisor de águas entre elas. Diz respeito à distribuição de recursos e oportunidades entre os membros de uma sociedade.
1-A direita democrática, que defende a igualdade civil e política, considera naturais e aceitáveis as desigualdades produzidas pela economia de mercado, aposta na capacidade dos indivíduos de prover a própria subsistência e quer reduzir ao mínimo a actuação dos governos sobre o mercado, além de rever o sistema de protecção social erigido ao longo do século 20.
2-A esquerda democrática concebe a igualdade de maneira mais ampla. Ela deve comportar não só garantias individuais e direitos políticos mas também direito a bens e serviços que assegurem aos cidadãos, no curso da sua vida, condições decentes de existência e acesso a oportunidades e recursos sem discriminações. Defende a economia de mercado, mas sabe de suas imperfeições e das consequências socialmente perversas que elas produzem. Aceita a competição, mas sabe que é necessário igualizar as condições em que ocorre.
3-Na realidade, o que distingue a esquerda democrática da direita democrática é o objectivo de reduzir as desigualdades ao mínimo compatível com a preservação das liberdades individuais e da democracia.
Propriedade estatal ou regulação pública de actividades privadas; provisão de bens e serviços pelos governos, por empresas privadas ou por organizações não governamentais -são apenas meios, e não fins. Não é por aí, portanto, que se distingue a esquerda democrática.
Em suma, enquanto a igualdade entre as pessoas for um valor moral e político amplamente compartilhado, e enquanto sociedades e mercados continuarem produzindo desigualdades de vários tipos, os termos esquerda e direita continuarão a fazer sentido.