terça-feira, 28 de setembro de 2010

Crónica dos últimos dias agitados

Dois acontecimentos (do foro judicial) marcaram nos últimos dias com algum destaque a crónica angolana. O Tribunal Constitucional anulou, por violação de direitos fundamentais dos réus, a decisão de primeira instância proferida pelo Juíz Januário no processo SME que condenou Quina e "sus muchachos" a alguns anos de prisão, por peculato. Esta decisão do TC pode vir a alimentar uma guerra de palavras e de nervos ao nível das instâncias judiciais do país, pois já ouvimos, ainda em surdina, vozes a defenderem que o Tribunal presidido por Rui Ferreira não tem competências suficientes para mandar soltar alguém já condenado. Depois, foi a vez do mais alto Magistrado da nação fazer justiça com as suas próprias mãos, ao anunciar que ia mandar para casa o seu ministro do interior, Roberto Leal Monteiro (Ngongo). O ministro terá cometido um erro grave assumido pelo próprio (segundo uma nota de imprensa oficial) no caso da prisão (extradição) de um cidadão português que se encontrava a residir em São Tomé e que tinha contas a acertar com os tribunais angolanos, depois de ter sido acusado de fraude milionária por Mello Xavier para quem trabalhava, na sequência de um alegado assalto a uma das contas da sua empresa domiciliada no Banco de Poupança e Crédito (BPC). Neste caso já circula pelo menos uma versão diferente, segundo a qual a iniciativa até partiu do BPC e que tudo terá sido processado pela via da Interpol, tendo sido as autoridades sãotomenses a fazer a entrega no aeroporo do referido cidadão aos policias angolanos que o foram busar. Já em Luanda, ainda segundo a mesma versão, o dito cidadão foi de imediato apresentado ao representante do Ministério Público junto da DNIC, que legalizou a sua detenção. Para já de concreto e como reacção ao "despacho" presidencial só existe mesmo o silêncio do principal atingido pela violenta chicotada em praça pública desferida do Chefe do Executivo, um ano depois dos factos terem ocorrido, o que torna ainda mais estranho este desfecho. Mas como quem cala consente, vamos ter de aguardar por outros desenvolvimentos, sem muitas expectativas de virmos a ter uma reacção pública da parte do General Ngongo, que segundo a versão aqui referida pode ter sido a "solução" encontrada no quadro do bode expiatório. A estes dois temas poderíamos acrescentar um terceiro que foi provocado pela muito sensacionalisa manchete deste fim-de-semana do "Folhinha"(história de capa), a colocar sérios problemas ao nível da ética jornalística, relacionado com o surgimento de uma suposta nova filha (mais velha) do cidadão José Eduardo dos Santos, o que obrigou o Chefe de Estado a vir a terreiro para falar aos microfones da TPA da sua vida mais intima, incluindo a sexual, num desenvolvimento a todos os títulos inédito na história do pos-independência. De forma bastante calma e exemplarmente urbana, Dos Santos desmentiu liminarmente a suposta paternidade de mais um rebento o que a confirmar-se, aproximaria dos 10, o número de membros da sua prole mais directa. A este terceiro acontecimento gostaríamos de acrescentar um quarto que é o inicio do desmantelamento do todo poderoso Gabinete de Reconstrução Nacional (GRN), que acaba de ser "decretado" pelo seu próprio criador, ao transferir parte das suas responsabilidades para a SONANGOL-Imobiliária, a nova coqueluche da petrolífera angolana que, qual polvo insaciável, adquire deste modo mais um tentáculo, no âmbito da chamada "sonangolização" do país. O engenheiro Manuel Vicente (MV), que já é membro do BP, acaba de dar assim mais um salto de cavalo na sua ascenção política pelos corredores do poder, numa altura em que certos analistas já lhe começam a atribuir algumas ambições de vulto a nível nacional que ultrapassam a sua actual condição de empresário "number one". MV é actualmente o mais poderoso homem de negócios que Angola possui no ranking da especialidade, embora se diga que já haverá alguém da sua familia política com muito mais protagonismo e poder real. Importa referir aqui que esta transferência de competências ocorre pouco tempo depois do mais influente membro da entouráge presidencial, Helder Vieira Dias (Kopelipa), ter sido "afastado" do GRN, após a sua promoção à categoria de Ministro de Estado, com a pasta de Chefe da Casa Militar da Presidência da República. Está-se assim e à falta de uma melhor explicação, diante de mais uma situação típica de esvaziamento institucional de funções (uma "ferramenta de gestão" muito usada por JES), que acabará por ditar, mais tarde ou mais cedo, o enterro do GRN, que passará a história como mais um produto descartável elaborado ao sabor da conjuntura. PS-Ainda se lembram como é que a BRICOMIL foi parar ao caixote do lixo?