segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Muitos direitos e liberdades para poucas garantias efectivas

O "Tendências e Debates" da RNA do último sábado teve como tema a Constituição da República na vertente dos Direitos, Liberdades e Garantias Fundamentais.
Esta vertente é quanto a mim a parte mais importante de qualquer texto constitucional moderno, já que ela tem a ver com a protecção e promoção do principal pilar do Estado Democrático de Direito que são as pessoas, que são os cidadãos, que continuam a ser os grandes ausentes da vida política sobretudo dos países que praticam a democracia de fachada, também conhecida por democratura.
Em síntese diremos que a primeira constituição legítima de Angola que assinala agora em Fevereiro o seu primeiro ano de vida, evoluiu bastante em matéria de direitos e liberdades, o que não teve, entretanto, a necessária correspondência no dominio das garantias desses mesmos direitos e liberdades.
Em matéria de garantias o texto é muito pouco sólido, o que pode transformar todos os direitos e liberdades dele constantes em meras figuras semânticas, como é o caso emblemático do direito à manifestação, num país onde a administração/polícia interdita por principio qualquer pretensão que não esteja de acordo com a política oficial.
A única solução que vejo para este (propositado) defeito de fabrico é ao nível da lei ordinária trabalhar-se urgentemente na criação de instituições realmente independentes e credíveis que possam garantir a exequibilidade do nosso "bill of rights", começando pela regulação da comunicação social. ‎Foi de facto um debate interessante aquele que a RNA promoveu no passado sábado, com um painel que terá, entretanto, pecado pela ausência de um representante do principal partido da oposição.
[Mas mesmo assim o painel conseguiu equilibrar-se em matéria do contraditório para produzir o necessário debate, que esteve de algum modo polarizado entre o signatário e o deputado João Pinto do MPLA, que quanto a mim se excedeu na defesa da sua dama, já que o papel da Assembleia Nacional tem sido muito pouco efectivo/visível na garantia dos direitos e liberdades fundamentais.
Com a desactivação temporária da sua função fiscalizadora do Executivo, que é fundamental em qualquer democracia que não seja de fachada, o Parlamento corre o sério risco de nesta legislatura ficar a ver a banda a passar.
A "banda" é o Executivo e os seus projectos legislativos que acabam por absorver a actividade produtiva da Assembleia na sua quase totalidade.
O resto do tempo disponível é para as férias parlamentares, passe o exagero misturado com algum corrosivo humor.]
O importante para mim é a substância das coisas, num país que vive muito da retórica política e das promessas em dias melhores.
Com isto não quero dizer que o governo não esteja a trabalhar.Muitas vezes, entretanto, trabalha mal e os resultados estão à vista, porque muitos dos seus ministros/dignitários não gostam de ouvir conselhos de quem sabe realmente do assunto. Preferem receber pareceres favoráveis pagos a preços exorbitantes a consultores da xaxa, sejam eles estrangeiros ou nacionais. O governo gasta/desperdiça milhões no mercado da consultoria.
Há sempre (boas) justificações para o que ainda não foi feito pelo Governo.
A herança da guerra serve para contornar tudo e todos e o tempo vai passando, a caminho dos nove anos sem o barulho ensurdecedor dos canhões, que agora foi substituído pelo ruído irritante do marketing político.
O que eu acho é que algumas pessoas "contentam-se" em enunciar os direitos constitucionais, quando o mais importante já é garantir a sua implementação na prática, com a criação das instituições fortes e independentes, sugeridas pelo "puto" Obama em Accra, começando pelo poder judicial.
Angola continua a viver de "homens (demasiado) fortes".