quinta-feira, 7 de julho de 2011

A corrupção, o jornalismo e os processos judiciais (4)

É curioso notar que hoje de uma forma geral os políticos deste país, com destaque para aqueles que estão ligados ao poder, não gostam muito que se fale da corrupção, embora ainda não assumam esta recusa de forma mais sistemática e aberta.

Depois de ao mais alto nível já se ter reconhecido que a corrupção era o segundo mal que afectava o país, logo a seguir à guerra, as referências que hoje são feitas à corrupção em Angola são normalmente entendidas como ataques directos ou indirectos ao poder instituído.
Mais do que isso, a reacção a este tipo de informação tem sido nos últimos tempos o permanente recurso à via judicial, que como é evidente não se pode contestar, já que se trata de um direito de qualquer cidadão, quando eventualmente se sente lesado nos seus interesses ou na sua honra.
Isto não nos impede, entretanto, de ver neste tipo de reacção uma grande crispação e nervosismo da parte de quem opta pelo processo judicial, ciente de que tem a causa ganha à partida já que os tribunais funcionam com provas materiais e não com fontes. A multiplicação destes casos na imprensa, não é certamente produto apenas de delírios jornalísticos. Há de facto bastante fogo a justificar toda a fumarada que por aí se pode ver, ler e ouvir em torno da corrupção que se generaliza entre nós como um modo de estar sobretudo enquanto se é servidor público a um certo alto nível e com determinada responsabilidade.
Contrastando com a permissividade local, onde a condescendência para com o fenómeno parece ser a estranha nota dominante, com o já clássico argumento, segundo o qual a corrupção não é angolana, o actual contexto internacional é de forte pressão (embora nem sempre muito coerente) contra os países que ainda não conseguiram estabelecer uma boa governação, o que tem como consequência a existência de preocupantes sintomas, sendo sem dúvida o mais preocupante, a corrupção, pelos enormes prejuízos que acarreta ao erário público.
É hoje ponto assente que a corrupção pode traduzir-se em volumosos lucros particulares à custa da má gestão que se faz dos dinheiros públicos, que são transferidos para contas bancárias no exterior em detrimento das necessidades internas dos países onde o fenómeno é cartaz de espectáculo permanente e deprimente.
Como já dissémos, apesar da forte pressão internacional existente destinada a convencer os regimes políticos no poder que a boa governação é uma das chaves para solução de todos os problemas ligados ao desenvolvimento, o que é facto é que a nível nacional a tendência dos executivos ainda não aponta exactamente nessa direcção e quando para lá se encaminha fica-se com a impressão que um tal compromisso é apenas para inglês ver.
A sociedade acaba depois por ter na imprensa o seu principal canal por onde faz chegar a suas preocupações ao Governo, através de mensagens que são bastante críticas e desconfiadas sobretudo no respeitante ao desempenho do executivo e a idoneidade dos seus titulares.
A existência de uma imprensa atenta e actuante é no caso de Angola a única tímida garantia que a sociedade no seu conjunto tem para acompanhar a evolução do fenómeno e pronunciar-se sobre ele sempre que julgar oportuna a sua intervenção.
Facilmente chegamos a conclusão que em países como Angola a comunicação social tem um papel de grande relevo, sendo muitas vezes o único travão que as pessoas envolvidas em actos de corrupção receiam efectivamente.
Em Angola a comunicação social e os jornalistas estão cada vez mais no centro de um cruzamento onde circulam vários e contraditórios interesses; onde o cidadão comum tem cada vez mais dificuldades em entender a lógica e o altruísmo do discurso oficial; onde o Estado que em princípio é uma pessoa abstracta de bem, se confunde muitas vezes com os interesses particulares deste ou daquele servidor público; onde os problemas da transparência, da boa governação e da corrupção institucionalizada já são frontalmente assumidos pelo próprio executivo, ao seu mais alto nível de decisão política.
Segundo outras avaliações mais radicais, o quadro é muito mais cinzento, numa alusão implícita à problemática da distribuição do rendimento nacional pelo conjunto das classes sociais que integram o universo angolano.