sábado, 30 de julho de 2011

Uma unanimidade chamada Jerónimo Belo

Angola é um país de difíceis consensos, não importa o que esteja em causa.
Pela positiva, muito dificilmente conseguimos ter uma unanimidade nacional, pelo que as poucas existentes são de valorizar duplamente e homenagear sempre que haja oportunidade para tal.
A dificuldade de atingir este patamar, só pode resultar do mérito próprio de quem o alcança, o que só é possível com muito trabalho, espírito de entrega, sacrifício e abnegação e muita paixão qb.
Jerónimo Belo (JB) é uma dessas raras unanimidades nacionais, quando se trata de falar, discutir, criticar, promover, ouvir e ver jazz em Angola.
O que seria do jazz em Angola, se não tivéssemos tido por cá o Jerónimo, se o JB não nos tivesse feito o favor de ser angolano, de gostar tanto desta manifestação artística e de tudo fazer para partilhar com todos nós esta sua paixão?
Nesta matéria de facto não conheço ninguém que no pós-independência, tenha feito mais pelo Jazz que o Jerónimo Belo, ao ponto de já não ser possível desligar as duas coisas ou mesmo de admitir um outro cenário, que passaria pela sua ausência.
Estou convencido que esta avaliação será partilhada por inteiro por todos quantos, muito poucos ainda, integram as hostes jazzísticas locais em permanente crescimento com todos os fluxos e refluxos que se conhecem.
Se estiver enganado, agradeço, naturalmente, que me corrijam.
É esta a percepção que tenho do papel central do JB no desenvolvimento das diferentes etapas que o fenómeno jazzístico tem conhecido em Angola, desde os tempos mais cinzentos da República Popular, até chegarmos aos dias de hoje, com o concurso, certamente, de outros valiosos protagonistas e contributos.
Luanda já tem direito a um festival internacional que se quer afirmar como uma aposta regular e que nestes últimos três anos já trouxe até à nossa capital algumas das mais renomadas figuras do jazz mundial.
Acredito que sem a paixão que o Jerónimo Belo tem dedicado ao longo de todos estes anos à divulgação e promoção do jazz em Angola, também muito dificilmente chegaríamos a este nível de realização.
Como se sabe em termos de mercado, o jazz ainda não é um produto aliciante para a indústria local do show business.
Ao JB só tenho que lhe agradecer o que tem sabido fazer pela sobrevivência do jazz em Angola, numa aposta que apesar de ainda não estar ganha, hoje já não está ameaçada de morte, graças ao seu amor por esta grande música afro-americana que hoje já é património universal.
Saravá JB!

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Cobertura jornalística eleitoral e o principio da igualdade no tratamento (3)

Considero ser igualmente problemática a aplicação do princípio previsto na actual lei eleitoral que obriga a comunicação social a dispensar um tratamento igual aos partidos concorrentes durante a campanha eleitoral, para além dos tempos de antena previstos.

Como traduzir em termos mais práticos este princípio é a grande questão já que as acções mobilizadores de cada partido são necessariamente diferentes em quantidade e qualidade, ao mesmo tempo que o desempenho editorial de cada órgão apresenta particularidades que os distinguem.
Esta questão coloca-se sobretudo à comunicação social pública tendo em conta as suas responsabilidades constitucionais/legais.
A Lei Eleitoral recomenda que os órgãos de comunicação social públicos e privados e seus agentes devem agir com rigor e profissionalismo em relação aos actos das campanhas eleitorais. A este respeito a lei acrescenta que, com a excepção dos órgãos partidários, as publicações periódicas, informativas, públicas e privadas devem assegurar a igualdade de tratamento aos diversos concorrentes.
Até aqui e com base neste levantamento do nosso universo de jure fica claro que são idênticas as responsabilidades da comunicação social pública e privada em relação aos protagonistas eleitorais.
É nosso entendimento que com base nestes pressupostos legais não é permitida a imprensa pública e privada tomar partido por nenhum dos concorrentes ou candidatos, com a excepção já mencionada.
Para além do acompanhamento in situ dos actos de campanha, com destaque para os comícios e reuniões, uma boa cobertura jornalística eleitoral faz-se sobretudo com a promoção do debate entre os concorrentes, pois é a melhor forma de esclarecer a opinião pública e os eleitores sobre a essência das propostas de cada um dos e as diferenças entre todos.
Na campanha eleitoral de 2008 praticamente não houve debates em directo na comunicação social entre as lideranças dos partidos concorrentes, o que a lei também não obriga. Senti que as maiores resistências a concretização do debate de ideias foram subscritas pelo partido da situação, por razões que julgo entender no âmbito da sua própria estratégia.
Sem ferir a liberdade dos concorrentes em conduzir as suas campanhas como melhor entenderem dentro de alguns limites éticos estabelecidos pelo Código de Conduta, acho que os partidos deveriam discutir em sede da próxima revisão do pacote a possibilidade de se introduzir o debate público como um compromisso da campanha eleitoral.
Enquanto isso não acontece iniciativa do debate vai continuar a estar com a comunicação social e com os jornalistas que têm a responsabilidade de convencer os protagonistas a saírem dos seus quartéis-generais para virem até ao domínio público discutirem em directo as suas propostas de governação e de explicarem o que fizeram e o que não fizeram no caso dos partidos que estão no poder.
(Fim)

Assim não dá!

O rigôr jornalístico volta a ser tema de debate neste morro, na sequência de algumas histórias pouco rigorosas dadas à estampa na nossa imprensa nas últimas semanas, onde se inclui a on line. A que mais me preocupou foi a do ressurgimento de Fernando Garcia Miala e do seu regresso à "entourage" presidencial, que, ao que tudo indica, não tem nada a ver com a realidade dos factos. A "interpretação" feita pelo Jornal de Angola das palavras da SG do SJA, Luísa Rogério, à saída da audiência com Angela Merkel, sem qualquer citação das mesmas, foi outra referência que chamou a nossa atenção.
Este fim-de-semana as coisas podem-se ter complicado ainda mais com a "bomba" que se prepara para explodir no quintal de duas proeminentes figuras do Executivo. Não quero pregar sermões à ninguém, mas começa a ser difícil entender algumas "falhas" ao nível do contraditório e do cruzamento das fontes. O resultado só pode ser a imprecisão e a especulação, com todas as consequências que se adivinham negativas quer para o autor da matéria, quer para as pessoas referidas na história. Uma das máximas do jornalismo sensacionalista é: Se tens um "furo" (exclusivo), não percas tempo em confirmá-lo. Publica-o imediatamente. Depois logo se verá. Não é por aí que queremos ir, mas na prática é este o caminho que continuamos a percorrer em nome da lei do menor esforço e do jornalismo de encomenda. O outro jornalismo, o de investigação continua de férias...

quarta-feira, 27 de julho de 2011

"Furo" jornalístico

Dois importantes terrenos urbanos públicos situados no municipio da Ingombota (Cine Luanda/Edel e Escola 7) foram transferidos para o domínio privado, com a emissão dos correspondentes direitos de superfície a favor de empresários estrangeiros.
Esta transferência parece estar ferida de uma profunda ilegalidade praticada por entidade afecta ao Executivo.
Mais do que um "furo", esta é apenas uma pista para quem gosta de fazer algum jornalismo de investigação, que o morro garante ser de muito boa fonte.
Pista complementar: Quem tem competência em Luanda para lavrar os direitos de superfície ou como é que eles são lavrados?
Pista suplementar: Os intermediários locais estão a facturar "feio".

terça-feira, 26 de julho de 2011

CPI/Intolerância foi a primeira iniciativa do Estado em prol da reconciliação

Na edição deste domingo do Semana em Actualidade um dos temas do debate esteve relacionado com a aprovação das conclusões da CPI sobre a intolerância política no Huambo.
No seu conjunto as conclusões e recomendações foram todas desfavoráveis às queixas apresentadas pela UNITA e que estiveram na origem da criação da referida comissão parlamentar, que desde logo teve o sabor de um "presente envenenado".
Sempre disse que do ponto de vista da estratégia política, que é aquela que mais ordena, não havia qualquer possibilidade do maioritário MPLA permitir que esta CPI desse razão à  minoritária UNITA.
Admiti, contudo, que no âmbito das recomendações houvesse um maior espaço de manobra, para acolher outro tipo de preocupações mais relacionadas com a necessidade de se promover a coabitação pacífica entre os angolanos, independentemente dos seus credos partidários, elegendo-se deste modo o valor "ser angolano" como o mais importante.
Estou convencido que este é um terreno que continua demasiado minado e instrumentalizado pelas estratégias partidárias do MPLA e da UNITA, sendo de todo aconselhável que o calor das rivalidades politico-eleitorais não ultrapasse uma determinada temperatura, que pode levar à "fissão nuclear" do nosso ainda demasiado instável tecido social.
Sou das pessoas que acha que para além das motivações e dos resultados, a CPI do Huambo acabou por ser uma boa iniciativa, porque permitiu discutir em concreto o problema da intolerância política, tendo deste modo ajudado as populações locais a gerirem melhor o seu relacionamento do ponto de vista politico-partidário.
Se tivesse havido uma cobertura mediática mais adequada, com a transmissão em directo de todas as audiências públicas pela TPA e a RNA, o impacto positivo desta CPI a nível nacional seria certamente muito maior. A referida cobertura foi má e acabou por ser manipulada, para não variar.
A CPI do Huambo, passe o possível exagero desta afirmação, foi a primeira iniciativa institucional ao nível do Estado virada efectivamente para a promoção da reconciliação nacional entre os antigos "irmãos desavindos" (mas não só), desde que as armas se calaram em Fevereiro de 2002.
De facto não me lembro de ter visto nestes últimos cerca de dez anos, o Estado angolano preocupado com a reconciliação, para além de algumas referências de circunstância, espalhadas pelos discursos dos políticos, onde se inclui o Presidente da República.
Por tudo isto e por muito mais, acredito que na prática esta CPI contribuiu para a aproximação dos angolanos.Contribuiu para a consolidação da paz.
Foi, contudo, um passo muito pequeno, uma gota de água no oceano da intolerância que continua a banhar as nossas costas, com muitas ameaças.
A CPI do Huambo não pode negar algumas evidências com que nos confrontamos todos os dias em todo o país, onde de facto o "ente angolano", ainda vem depois do "ente partidário", com todas as consequências que esta precedência implica para o relacionamento das pessoas, incluindo membros da mesma família.

A cobertura jornalística eleitoral e as sondagens(2)

No seu conjunto o pacote legislativo eleitoral vai agora ser revisto, mas acredito que não haverá muitas alterações em relação ao que está estabelecido para o trabalho da imprensa, com a lamentável excepção de um aspecto que eu reputo de grande importância e que em meu entender poderá alterar bastante, caso venha a ser aprovado, o tipo de cobertura jornalística eleitoral que nos preparamos para fazer no próximo ano, caso as previsões iniciais não venham a sofrer algum adiamento, o que sempre é possível.
Este aspecto tem a ver com a divulgação de sondagens no decorrer do período da campanha eleitoral, o que vai introduzir um elemento novo e perturbador no que toca a cobertura jornalística eleitoral.
Sou das pessoas que sempre defendi que a ainda actual interdição divulgação de sondagens durante a campanha eleitoral foi uma medida bastante acertada do nosso legislador pelo que se deveria manter em nome da igualdade de tratamento que os concorrentes têm direito.
Antes de mais estou convencido que o referido instrumento cria demasiado ruído na campanha e acaba sempre por beneficiar um dos concorrentes que eventualmente é o mais bem colocado, mas que também pode não ser efectivamente, beneficiando deste modo dos seus resultados que têm sempre um valor muito relativo, já que são feitas com base numa determinada amostragem que normalmente não ultrapassa os dois mil inquiridos.
As sondagens funcionam muitas vezes de forma perversa e podem ser facilmente manipuláveis, já que são elaboradas por empresas privadas que obviamente têm sempre os seus interesses próprios, incluindo os políticos, mesmo quando são estrangeiras.
No caso de Angola a nossa realidade concreta no que toca as capacidades e potencialidades é caracterizada por um desequilíbrio acentuado entre os partidos concorrentes, tendo de um lado o partido no poder com todas as soberbas vantagens que se conhecem e do outro as formações da oposição cujas disponibilidades materiais e financeiras são tão modestas que até dá dó falar delas, quando se trata de fazer comparações.
Mesmo vivendo a UNITA uma outra realidade, as coisas actualmente já não se alteram muito quando chega a hora de comparar dimensões, tendo do outro lado o MPLA.
Neste contexto a entrada de empresas de sondagem para o barulho da campanha eleitoral só vai acentuar os desequilíbrios estruturais existentes, já que à partida os partidos da oposição não têm recursos disponíveis para encomendar tais pesquisas de opinião junto do eleitorado.
Em Angola há ainda um outro problema mais complicado que é a ausência de uma entidade reguladora que supervisione e fiscalize a actividade das empresas de sondagens de forma a prevenir o surgimento de produtos fraudulentos no mercado.
Por tudo isto e por muito mais sou daqueles que continua a defender a proibição das sondagens durante a campanha eleitoral, numa altura em que o parlamento ainda não deu inicio ao processo de revisão do pacote legislativo eleitoral. Sabendo que esta alteração faz parte da proposta do partido maioritário, ainda alimento a esperança que o debate parlamentar possa produzir um outro resultado. Como esperança aqui fica ela lavrada a partir das férteis terras malanjinas que já não visitava há cerca de 40 anos.
(cont)

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Os que gostam de Luanda devem ler esta entrevista. Os outros também...

Antes de mais gostaria que ficasse claro que com esta "promoção" não pretendo "equilibrar" a apreciação menos positiva feita em relação à interminável entrevista com Apolónio Graciano que o SA publicou em duas edições consecutivas.
Nada disso. Não é por aí que devem ir, se me quiserem "apanhar"...
A entrevista com o arquitecto Simões de Carvalho, "o homem que pariu Luanda" dada à estampa pelo SA na sua última edição, chamou a minha atenção por várias razões, todas elas bastante substantivas e legítimas.
A primeira, é porque sou um calú puro, um luandense de gema que tem todo o interesse em saber como é que a sua cidade foi "parida", para depois perceber melhor como é que ela está actualmente a ser "destruída".
Acho que Luanda está de facto a ser diariamente agredida por um conjunto de obras públicas e privadas que estão a pôr em causa o mínimo em matéria de racionalidade, coerência e sustentabilidade, no que toca ao que deve ser a correcta gestão de um espaço urbano com a dimensão de uma cidade que tem uma história própria.
Por isso e por muito mais li com bastante atenção a entrevista do meu conterrâneo Simões de Carvalho. Devo confessar que já tenho bastantes dificuldades em ler algumas "grandes" entrevistas do principio ao fim, pelo que a solução é a sua leitura em diagonal.
Não foi o que aconteceu com esta feita ao homem que "pariu" a minha cidade, apesar de ter notado que a mesma apresentava alguns problemas "técnicos" que não facilitaram muito a compreensão cabal das ideias do entrevistado. Por outro lado, estou convencido que foram muitas as perguntas importantes que ficaram por fazer ao arquitecto Simões de Carvalho, pelo que desde já desafio o jornalista que falou com ele a enviar-lhe por email mais algumas questões, já que o entrevistado não vive em Angola.
Seja como for, vale mesmo a pena ler esta entrevista, que sem ser grande nem pequena é sobretudo esclarecedora ou pelo menos tem o ponto de vista de alguém que de facto conhece a matéria de que fala, tem experiência e, portanto, pode ajudar-nos a resolver ou a evitar alguns problemas que a cidade enfrenta. Lamentavelmente muita borrada já foi definitivamente feita em Luanda em nome de interesses pessoais dos detentores do poder político.
Depois de ter lido a entrevista (como não tem direito a 2ª parte, vou voltar a lê-la), cheguei a conclusão que Luanda está a correr mais riscos no que toca à sua própria sobrevivência, do que muitos de nós imaginavam.
Percebi por exemplo porque é que os apartamentos dos prédios que estão a ser feitos na baixa de Luanda são tão caros, ou pelo menos qual é uma das razões que ajuda a explicar os seus preços milionários.
Percebi muito mais sobre o que se está a passar em Luanda de errado, o que quer dizer que depois de ter lido a entrevista tenho certamente mais argumentos para defender a minha dama dos ataques que está a ser vítima. Sei que é quase impossível parar a fúria que vai por aí, mas...
Mas o quê?
(In http://www.semanario-angolense.com/home/)

Cobertura jornalística eleitoral (1)

[A semana passada fui até Malanje participar no Vº Fórum dos Correspondentes da Emissora Católica de Angola, onde me pediram para dissertar sobre cobertura jornalística eleitoral.] 
Por cobertura jornalística eleitoral entendo toda a actividade desenvolvida pelos jornalistas e os médias no decorrer da campanha eleitoral propriamente dita que é um período determinado por lei que antecede o dia da votação. Esta actividade é centrada no acompanhamento das principais acções dos concorrentes, por um lado e na promoção de iniciativas próprias por parte dos médias destinadas a dar conhecer as ideias e os programas dos concorrentes através de entrevistas e debates.
Esta cobertura pode, entretanto, começar muito antes dos prazos previstos na lei, pois as chamadas pré-campanhas eleitorais em função da estratégia de cada um dos concorrentes/candidatos têm inicio muitos meses antes. Nesta altura há já sinais muito concretos de que a pré-campanha eleitoral pode já ter começado em Angola, a ter em conta algumas actividades partidárias em curso que apontam claramente nessa direcção.
Embora a lei não preveja qualquer disposição mais específica em termos de enquadramento para o período de pré-campanha eleitoral, cada um de nós, enquanto jornalista, terá de possuir capacidade de análise suficiente para saber discernir os acontecimentos em presença, conferindo-lhe desde logo esta marca. Trata-se de uma identificação que pode ter alguma utilidade para evitar algumas coberturas do tipo curta/longa-metragem que já temos estado a registar. Não sendo novidade este tipo de acompanhamento mediático de acções propagandistas e mobilizadoras, vale sempre a pena fazermos esta incursão numa seara que é claramente problemática para quem tem de possuir/utilizar critérios que sejam aceites como razoáveis por parte da opinião pública que é cada vez mais atenta e crítica ao desempenho dos médias e dos jornalistas.
A cobertura dos actos de pré-campanha eleitoral coloca algumas dificuldades na hora de se aplicar o princípio da igualdade e da imparcialidade no tratamento dos concorrentes, o que quanto a nós é fundamental em termos de orientação da cobertura jornalística no decorrer da campanha, como veremos mais adiante.
No nosso caso o período da campanha eleitoral é de 30 dias (mais ou menos) e tem já na legislação em vigôr uma definição clara dos seus propósitos e do papel dos seus protagonistas, incluindo os jornalistas/comunicação social. Todos nós estamos recordados dos aspectos fundamentais desta regulamentação, mas nunca é demais destacar aqui o seu conteúdo no capítulo relacionado com o papel que os médias são chamados a desempenhar.
Antes de mais é bom aqui colocar em alto-relevo o princípio constitucional resultante do artigo 17 da LCA que consagra o direito de todos os partidos políticos a receberem um tratamento igual por parte das entidades que exercem o poder público, a um tratamento imparcial da imprensa pública e o direito de oposição democrática.
Assim sendo convocaríamos de seguida, passo a expressão, para esta sala, um diploma chamado Código de Conduta Eleitoral, aprovado em 2005, que tem logo no seu preâmbulo uma sintomática alusão ao facto dos períodos eleitorais serem potenciadores de condutas contrárias à lei e aos bons costumes, bem como às regras democráticas. Por si só este alerta à navegação de todos seria mais do que suficiente para os jornalistas entenderem a grande responsabilidade que têm nas mãos durante a campanha eleitoral.
O Código de Conduta Eleitoral atribui aos órgãos de comunicação social o mesmo estatuto de agente eleitoral que é conferido a todos quantos, directa ou indirectamente, vão participar no processo desde os partidos políticos até ao cidadão eleitor, passando pelos observadores, as forças da ordem pública, as entidades religiosas, as autoridades tradicionais, etc., etc..
A todos estes agentes, o Código de Conduta Eleitoral exige a observância de princípios como o respeito pela diferença, liberdade de escolha, direito de reunião e manifestação, legalidade, tranquilidade, imparcialidade, transparência, isenção, civismo e responsabilidade.
Especificamente no que toca aos órgãos de comunicação social, tendo em conta as exigências do Código, as nossas atenções voltam a estar viradas para a imperiosa necessidade de não se permitir que os espaços mediáticos sejam veículos de propaganda indecorosa e de linguagem menos adequada que possam conduzir ou incitar os cidadãos a cometerem actos de violência ou de intimidação.
De acordo com as mesmas exigências, na cobertura do processo eleitoral para além da igualdade de oportunidades que devem dispensar a todos os concorrentes, os órgãos da comunicação social deverão actuar com rigor e profissionalismo, abstendo-se de publicar resultados provisórios não oficiais.
Os órgãos de comunicação social têm direito de acesso às fontes de dados eleitorais, à protecção pelas forças da ordem pública e de serem respeitados pelos candidatos, partidos políticos e demais agentes eleitorais.
(cont)

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Sequência do debate provocado pelo meu "beef" contra Apolónio Graciano (actualizado)


Anónimo disse...
NIURA
Caríssimo WD!
1. Depois do puxão de orelhas que recebeu aquando da última sessão da CEAST, o padre Apolónio tinha que reaparecer de qualquer jeito. Pena que tenha sido com a ajuda do SA (...) que saudades dos tempos de Graça Campos e Silva Candembo, porque com eles não seria possível...
2. Os discursos do PR ultimamente têm focalizado 2 temas recorrentes: Causas da pobreza e estatísticas. Sobre a pobreza já se sabe que a culpa é da colonização, na sua óptica e quanto às percentagens, elas só são apreciativas para os interesses do Executivo (98% de analfabetos antes da independência e 30-40% de pobres em 9 anos de paz);
3. E hoje desafio o Executivo a lançar as percentagens dos angolanos que vivem em extrema pobreza, bem como a percentagem dos nossos ricos pós independência. E mais, de onde veio a extrema pobreza e a espantosa riqueza se a pobreza é herança do colonialismo?
14 de Julho de 2011 10:38
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Anónimo disse...
De facto este Pdre. para além de controverso tem a "fezada" de ter o S.A. para dar a tal ajudazinha para explicar... NADA como bem disse o RS.
PS- Gostaria de saber o posicionamento dos que ele defende se isto tudo se passasse em Cabinda!
14 de Julho de 2011 12:14
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salas neto disse...
Ó Kamu, também não é assim. Todo o mundo entrevista todo o mundo, com o Bonga a falar nada do seu Marçal, ou o Charles Bois a entrar na feitiçaria do Girabola, mas vossemecê só se implica com o SA. Sempre. Claro que já não é o tempo do Graça e do Candembo, mas olha que eles também tiveram os seus entrevistados, pelo que alguma coisa tinha mesmo de mudar. Incluindo a tua birra... Por outra, quem é este tal de niura, que só ataca acobertado no anonimato? Será também do grupo do «só para contrariar»? Abraço. Salas Neto - director do SA. e olha que na edição desta semana tem mais Apolónio. Para nós, o que ele disse é «comestível». e bem «comestível». Agora, não dá para nos incluir em alguma maka que tenhas com o homem. isto é problema teu. mais uma vez, abraço.
14 de Julho de 2011 22:01
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Anónimo disse...
Salas Neto tem, em grande medida, razao . Ja' li, se nao me engano neste mesmo espaco, o Graca Campos a ser tratado por "aprendiz de electricista" ou algo parecido, mas como nao convinha, nao apareceu Niura alguma para defende o bom do homem. Hoje Graca Campos ja nao e' aprendiz de "coisa alguma" mas sim bom rapaz, so' mesmo para agradar o autor do texto. Caso para dizer dois pesos e duas medidas, ao bom estilo da turma do so' "para contrariar". Depois dizem que os outros e' que sao bajuladores. Com essa concorrencia "bajulacional" os camaradas ainda vao ficar com inveja.
15 de Julho de 2011 10:31
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Anónimo disse...
NIURA
Caro Salas Neto e "amigo" Anónimo!
Se frequentam o morro com frequência (passe a redundância), devem ter alguma ideia sobre quem sou e não me acobardo no anonimato, mas vosso conhecimento anotem www.jozlopezpoderosa.blogspot.com.
Não tenho nada contra o Graça Campos, antes pelo contrário, admiro a sua pena e sem ciúmes espero, igual só mesmo a do Gustavo Costa. Aliás, não é em vão que o NJ passou a ser o meu semanário predilecto, tirando o lugar ao SA e, por coincidência ou não, isso só aconteceu depois do Graça ter abandonado o SA.
Mais um recado pra os machistas: "...quem é este de Niura..." usado pelo Salas é tendencioso. Não é a primeira vez que me confundem com o género oposto, o Mena Abrantes vez o mesmo quando, neste mesmo espaço, trocamos inteligências sobre o posicionamento do Executivo sobre a crise na Côte d'Ivoire.
Não sou culpada pelo facto da maioria das mulheres deste país possuírem um baixo nível de instrução e não sou igualmente culpada pelo facto da minha elevação intelectual ser equiparada a de muitos "machos" que se acham catedráticos.
Bajulação é um bom trunfo pra os incompetentes. Já imaginaram a composição "química" entre intelectual e bajulador. Senão sabem eu digo, é igual aos comités de especialidade do M.
PS: Deixem o caríssimo WD de lado, porque eu estou aberta ao debate de ideias, sem conotações nem ofensas.
Se aceitam o desafio então que haja homem...
15 de Julho de 2011 15:30
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(Tudo leva a crer que o debate segue dentro de momentos...)
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 Gil Gonçalves disse...
Até decretaram que temos direito, que receberemos a nossa quota-parte dos rendimentos do petróleo, que afinal concluíram que não são só deles. Bons governantes sim senhor, abençoados pela habitual militância consequente e eloquente do tal cónego, o Santo Apolónio, ainda não canonizado. Uma coisa aqui não entendo: mas um padre não se obriga e abriga na pregação teológica? É que pelo que vejo essas epístolas do nosso querido Santo Apolónio, estão tão estilizadas, estalinizadas. Mas acredito e oro que essa ovelha ranhosa será recuperada para o rebanho do Senhor. É que na manada do Senhor há sempre lugar para os falsos cordeiros tresmalhados. Se ele não receber a emenda do Senhor, decerto um lobo lhe mostrará o caminho. Meu filho, vem, a Igreja recebe-te de braços abertos, e quando acontecer, nesse dia o Senhor rejubilará. Não nos abandones, não nos atraiçoes, porque também serás abandonado e atraiçoado. Não faças da religião uma maratona à Politburo.
Eis o campeonato nacional da corrupção, mais conhecido por giracorrupção. Num encontro decisivo, a equipa do Politburo deu uma cabazada, melhor, liquidou o seu adversário, a teimosia da equipa dos Honestos por arrasadores 32-0. Assim, o Politburo continua imbatível, invicto. Facilmente se pode “vertiginar” que o futuro de Angola está na corrupção. Prova-o o perseverante Politburo. Podemos parafrasear: e se mais corrupção houvera lá chegara. Desenvolver é corromper. Tudo é composto de corrupção.
16 de Julho de 2011 07:01
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Ngongo disse...
A temperatura subiu imenso no morro neste cacimbo. Com alguma sorte teremos ainda de chamar os bombeiros(temos mesmo bombeiros em Angola!?) para apagar o fogo ou chamar um(a) medico(a) para aliviar a congestão, já que alguem prometeu mais Apolonio "comestivel" para digerir nos próximos dias.
Não sou jornalista e não tenho nenhuma intenção de ferir a classe jornalistica na sua globalidade mas atrevo a dizer que cerca de 50% do nosso jornalismo é feito de notícias inuteis e entrevistas cheias de "nada", como esta entrevista do Apolonio ao SA. Caro WD, com a "qualidade" do nosso jornalismo "sempre a subir" serás obrigado a mandar mais "beef" praticamente todos os santos.
16 de Julho de 2011 12:42

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Um ano depois da sua morte, a homenagem merecida...

TARDE DE LOUVOR (Domingo 7 de Agosto/Cine Atlântico a partir das 15 horas)1. Discurso de abertura
Dom Alexandre, Cardeal do Nascimento
Música
2. José Maria dos Santos
Governador Provincial de Luanda
3. D. Zacarias Kamwenho
Arcebispo Emérito do Lubango
Música
4. Fr. Moisés Lukondo, OFMcap
Presidente da CSMIRMA
Música
5. Ir. Lúcia Geraldo, stj - Presidente da USMIRFA
Música
6. Rev. Gaspar João Domingos
Bispo da Igreja Metodista
7. António Panzo - Reitor do ICRA
8. Felisbela Espírito Santo
Direcção do Instituto Superior João Paulo II
Música
9. Fernando Pacheco - Coordenador do OPSA Observatório Político Social de Angola
Música
10. Ir. Manuela Nacamdumbo, DSCS
11. Mensagem das Monjas Dominicanas de Angola
Música
12. Nelson Bonavena - Docente Universitário
Música
13. Teresa do Espírito Santo
Representante da Paróquia do Carmo
Música
14. Luísa Rogério - Presidente do Sindicato dos Jornalistas
Música
15. Daniel Fernandes
Representante da família do fr. João Domingos, op
16. Fr. Miguel Chacachama, op
Vigário Provincial dos Dominicanos em Angola
Música
17. Discurso de Encerramento
D. Anastácio Kahango, Bispo Auxiliar de Luanda
(Animação musical a cargo de Pérola e Frei Zé Paulo)

Quando um "anão" vira "gigante"

O Semanário Angolense dedicou ao Cónego Apolónio Graciano seis preciosas páginas da sua última edição. 
Em termos de espaço e importância, um exagero para quem tem tão pouco para dizer-nos, ou já disse praticamente tudo (do quase nada) que tinha para partilhar com todos nós.
Como é evidente a culpa não foi do entrevistado, que uma vez mais soube "brilhar" com todas as bocas que mandou, aproveitando todo o espaço que tão generosamente foi posto à sua disposição.
O tamanho de uma entrevista tem de ser proporcional à dimensão do entrevistado. Caso contrário a imprensa corre o sério risco de transformar anões em gigantes num passe de mágica.
Foi o que se passou no último fim-de-semana com o confrade SA.

sábado, 9 de julho de 2011

A morte de um homem e o desaparecimento da história

Fernando Pitta-Grós falecido esta semana em Lisboa (4/7) para além de ser um respeitável mais-velho do nosso bairro, o Bairro Económico (Vila-Alice), pai da Ducy, da Dinha, do Nino, do Fernando Helder, da Fary, do Nando Chocolate e do Doro,  foi nosso companheiro das lides políticas nos idos de 75, quando nos reencontramos na primeira Comissão Directiva do MPLA criada, salvo erro, no primeiro trimestre daquele ano, por Agostinho Neto.
Ele na altura já não se encontrava a viver na Vila-Alice, tendo ido parar àquela Comissão em representação do Comité do MPLA da Ingombota, salvo erro, enquanto eu e o Gustavo Conceição fomos escolhidos por sermos os representantes do Comité da Vila-Alice.
Ao que julgamos saber, foi efectivamente a primeira estrutura directiva a nível regional que o MPLA, na pessoa de Agostinho Neto, criou em Angola após o seu regresso a Luanda (4Fev75) na sequência do golpe de estado ocorrido em Portugal a 25 de Abril de 1974.
Esta comissão foi constituída tendo por base a integração de dois representantes de  cada um dos vários comités de acção que o MPLA possuía na altura em Luanda.
Dos vários camaradas com quem me cruzei naquele tempo e naquele organismo, lembro-me dos já falecidos António Cardoso e Beto Cambuta (que trabalhou na TAAG), da Dra. Medina, do Fernando Coelho da Cruz, do Filomento Vieira Lopes, do Muohngo (Cazenga) e, obviamente, do Gustavo.
O grande "problema" desta Comissão é que ela não figura na história oficial do MPLA, tendo a sua existência sido completamente riscada do mapa, como se constuma dizer, por razões que até agora não me foi possível apurar. Este "misterioso" desaparecimento consta das páginas dos dois tomos sobre a história do MPLA, obra publicada em 2008.
Pouco mais de dois meses antes dele ter falecido, portanto muito recentemente, tive a oportunidade de me cruzar em Luanda com o Fernando Pitta Gróz, pessoa que já não via há bastante tempo. Soube na altura pela sua própria boca que a sua saúde não estava nada bem, mas estava longe de imaginar que me estava a despedir dele.
Aproveitei a oportunidade para lhe pedir se ele tinha alguma documentação guardada nos seus arquivos pessoais sobre a referida Comissão Directiva do MPLA de Luanda, depois de lhe ter comunicado que a mesma afinal nunca tinha existido por obra e graça dos historiadores que elaboraram os dois primeiros volumes da História do MPLA. Curiosamente todas as outras comissões directivas regionais da época num total de 15 são referidas na obra com os nomes dos seus integrantes devidamente mencionados no texto, menos a de Luanda. O meu interlocutor disse-me que sim, que tinha a tal documentação, mas que estava num local pouco acessível, deixando-me entender que, pela sua pouca disponibilidade física, dificilmente poderia satisfazer a curto prazo a minha solicitação.
À falta de uma melhor explicação sobre esta OMISSÃO, julgo que mesma pode ter na sua origem uma forte razão político-partidária interna, já que a Comissão Directiva do MPLA de Luanda foi suspensa depois dos acontecimentos do 27 de Maio de 1977. Os seus integrantes foram mandados aguardar em casa e pelo que também sei nunca mais nada lhes foi dito sobre o seu futuro, até hoje.
Na altura, em 77, eu já me tinha desligado há bastante tempo da referida Comissão Directiva, pois cedo perdi o interesse pela actividade partidária directa, tendo o mesmo sido substituído pelo jornalismo.
Ingressei nos quadros da RNA em Outubro desse mesmo ano, curiosamente depois de ter ido a ainda EOA ler um comunicado partidário, no quadro da  "Semana de Unidade Nacional" que tinha sido promovida pelos três movimentos no âmbito do Governo de Transição saído dos Acordos do Alvor, como mais uma tentativa de se travar a escalada de tensão politica e militar que estava em curso e que viria a desembocar na primeira grande batalha de Luanda vencida pelo MPLA.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

A corrupção, o jornalismo e a bandeira da independência (concl)

A transição do modelo socializante de economia centralizada que o sistema de partido único tentou edificar até finais da década de oitenta, para uma economia aberta de mercado, resguardada por um projecto democrático multipartidário - tem estado a ser extremamente dolorosa e acompanhada por uma crise de valores sem precedentes, cuja tendência parece ser a sua cristalização. De uma coisa estamos certos, nada voltará a ser como dantes.
À falta de uma melhor definição, é, de acordo com alguns analistas, de capitalismo selvagem, com o estado-previdência transformado agora no estado-patrão, que se trata, com todas as consequências sociais extremamente negativas daí resultantes, cujo impacto é facilmente visível no tecido humano, a inspirar sérios cuidados.
Como mobilizar a opinião pública, tendo como pano de fundo estas e outras referências não é certamente uma tarefa fácil para a comunicação social cujo principal compromisso é, antes de mais, com a verdade dos factos relevantes que vão acontecendo num país chamado Angola.
Pela sua essência o jornalismo sempre foi a primeira frente de choque contra todos os tipos de violência e violações, pelo simples facto que tais comportamentos são acontecimentos difíceis de ignorar, por quem queira pautar a sua conduta profissional por algum rigor e isenção e objectividade.
E aqui, por favor, não nos venham com a famosa conversa das linhas editoriais, porque aqui o problema é acima de tudo constitucional, pelo que todas as restantes linhas devem obediência às fortes linhas da nossa constituição que tem de ser respeitada por todos.
Longe das unanimidades e das subserviências que já fizeram história entre nós, em democracia o relacionamento entre o poder político e os médias (que acabam por representar um outro poder) é invariavelmente conflituoso, faz parte do sistema, é estrutural.
Aliás, é assim mesmo que o sistema democrático funciona e funciona mais ou menos bem com todos os defeitos que se lhe conhecem.
Não temos qualquer dúvida em afirmar que o grande problema que o jornalismo enfrenta em todo o mundo, sem excepção, é a sua afirmação como um poder independente ao serviço da sociedade e do interesse público, que em democracia são as duas principais fontes de legitimação do poder que se renova periodicamente pelo mecanismo sufrágio universal.
Tida para muitos como uma utopia, a afirmação da independência do jornalismo é, na nossa modesta apreciação, a essência da actividade jornalística de referência, que se deve manter como uma orientação permanente de todos quantos trabalham no sector, não obstante todas as dificuldades e bloqueios conjunturais.
(Fim)

quinta-feira, 7 de julho de 2011

A corrupção, o jornalismo e os processos judiciais (4)

É curioso notar que hoje de uma forma geral os políticos deste país, com destaque para aqueles que estão ligados ao poder, não gostam muito que se fale da corrupção, embora ainda não assumam esta recusa de forma mais sistemática e aberta.

Depois de ao mais alto nível já se ter reconhecido que a corrupção era o segundo mal que afectava o país, logo a seguir à guerra, as referências que hoje são feitas à corrupção em Angola são normalmente entendidas como ataques directos ou indirectos ao poder instituído.
Mais do que isso, a reacção a este tipo de informação tem sido nos últimos tempos o permanente recurso à via judicial, que como é evidente não se pode contestar, já que se trata de um direito de qualquer cidadão, quando eventualmente se sente lesado nos seus interesses ou na sua honra.
Isto não nos impede, entretanto, de ver neste tipo de reacção uma grande crispação e nervosismo da parte de quem opta pelo processo judicial, ciente de que tem a causa ganha à partida já que os tribunais funcionam com provas materiais e não com fontes. A multiplicação destes casos na imprensa, não é certamente produto apenas de delírios jornalísticos. Há de facto bastante fogo a justificar toda a fumarada que por aí se pode ver, ler e ouvir em torno da corrupção que se generaliza entre nós como um modo de estar sobretudo enquanto se é servidor público a um certo alto nível e com determinada responsabilidade.
Contrastando com a permissividade local, onde a condescendência para com o fenómeno parece ser a estranha nota dominante, com o já clássico argumento, segundo o qual a corrupção não é angolana, o actual contexto internacional é de forte pressão (embora nem sempre muito coerente) contra os países que ainda não conseguiram estabelecer uma boa governação, o que tem como consequência a existência de preocupantes sintomas, sendo sem dúvida o mais preocupante, a corrupção, pelos enormes prejuízos que acarreta ao erário público.
É hoje ponto assente que a corrupção pode traduzir-se em volumosos lucros particulares à custa da má gestão que se faz dos dinheiros públicos, que são transferidos para contas bancárias no exterior em detrimento das necessidades internas dos países onde o fenómeno é cartaz de espectáculo permanente e deprimente.
Como já dissémos, apesar da forte pressão internacional existente destinada a convencer os regimes políticos no poder que a boa governação é uma das chaves para solução de todos os problemas ligados ao desenvolvimento, o que é facto é que a nível nacional a tendência dos executivos ainda não aponta exactamente nessa direcção e quando para lá se encaminha fica-se com a impressão que um tal compromisso é apenas para inglês ver.
A sociedade acaba depois por ter na imprensa o seu principal canal por onde faz chegar a suas preocupações ao Governo, através de mensagens que são bastante críticas e desconfiadas sobretudo no respeitante ao desempenho do executivo e a idoneidade dos seus titulares.
A existência de uma imprensa atenta e actuante é no caso de Angola a única tímida garantia que a sociedade no seu conjunto tem para acompanhar a evolução do fenómeno e pronunciar-se sobre ele sempre que julgar oportuna a sua intervenção.
Facilmente chegamos a conclusão que em países como Angola a comunicação social tem um papel de grande relevo, sendo muitas vezes o único travão que as pessoas envolvidas em actos de corrupção receiam efectivamente.
Em Angola a comunicação social e os jornalistas estão cada vez mais no centro de um cruzamento onde circulam vários e contraditórios interesses; onde o cidadão comum tem cada vez mais dificuldades em entender a lógica e o altruísmo do discurso oficial; onde o Estado que em princípio é uma pessoa abstracta de bem, se confunde muitas vezes com os interesses particulares deste ou daquele servidor público; onde os problemas da transparência, da boa governação e da corrupção institucionalizada já são frontalmente assumidos pelo próprio executivo, ao seu mais alto nível de decisão política.
Segundo outras avaliações mais radicais, o quadro é muito mais cinzento, numa alusão implícita à problemática da distribuição do rendimento nacional pelo conjunto das classes sociais que integram o universo angolano.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

A Corrupção, o Jornalismo e o Compêndio da UCAN (3)


A corrupção tem hierarquias e estabelece uma relação de causa/efeito com os vários degraus do poder político e da administração pública, por isso hoje percebemos melhor com base em tudo quanto se observa em Angola e no resto do mundo, que como disse Lord Acton “se o poder tende a corromper, o poder absoluto corrompe absolutamente".
Na avaliação de Lord Acton a autoridade política, nas sociedades humanas, em função apenas e tão-somente da sua existência tende a danificar as relações entre seres inicialmente dotados de igualdade.
Angola é já um caso de estudo que dá bastante substância a este estranho primado da política como fonte de um poder que se tem estado a distanciar cada vez mais da ética, embora mantenha as aparências e alguma iniciativa mesmo ao nível da moralização, da transparência e da própria fiscalização.
Felizmente que já temos entre nós na Universidade Católica de Angola um compêndio sobre a Introdução da Ética no Sector Público da autoria conjunta do norueguês Inge Amundsen e do angolano Justino Pinto de Andrade, onde é possível ter uma ideia do que é a corrupção política e do que ela representa para depois não fazermos confusão com as formas consideradas mais burocráticas e menos lesivas deste fenómeno gangrenoso.
De acordo com o citado compêndio a “corrupção política é qualquer transacção entre os actores do sector privado e do sector público através da qual os bens colectivos são ilegitimamente convertidos em recompensas privadas. Esta definição, no entanto, não distingue claramente entre corrupção política e corrupção burocrática. Estabelece o necessário envolvimento do estado e dos agentes estatais na corrupção, sem qualquer noção acerca do nível de autoridade na qual a corrupção acontece.
Numa definição mais estrita, a corrupção política envolve decisores políticos. A grande corrupção, ou corrupção política, acontece nos mais altos níveis do sistema político. Acontece quando os políticos e agentes estatais, que estão mandatados para criar e a aplicar leis em nome do povo, são eles próprios corruptos. A corrupção política existe quando os decisores políticos utilizam o poder político do qual dispõem, para sustentar o seu poder, status e riqueza. Deste modo, a corrupção política pode ser distinguida da corrupção burocrática ou de baixo nível, que consiste na corrupção na administração pública, na extremidade ligada à implementação das políticas”.
O compêndio que estamos a citar é verdadeiramente assustador na identificação das motivações e do “modus operandi” dos seus agentes.
Esta corrupção tem propósitos ao nível do enriquecimento pessoal da elite política dirigente e da manutenção do poder a qualquer preço e com a utilização de todos os meios possíveis e imaginários.
Num país onde este tipo de corrupção se instala pode-se dizer que nunca se sabe às quantas andamos, pois até as decisões aparentemente mais pacíficas podem ter consequências complicadíssimas para além dos desvios que depois se podem verificar no aumento do património pessoal.
Diante de muralhas como estas, de facto os jornalistas farão muito pouco  se continuarem a perder tempo com as tais histórias da carochinha, ao ponto de já termos ouvido de algumas vozes conhecedoras dos grandes dossiers nacionais matéria piadas recorrentes como vocês andam mesmo a ver lulas ou no mínimo andam muito distraídos. É verdade.
Não temos qualquer dúvidas em admitir que em termos de importância é quase residual a informação que hoje gerida ao nível da imprensa e que tem trazido para o domínio público histórias de corrupção que não sejam apenas da carochinha.
PS: Pode descarregar o conteúdo do Compêndio da UCAN em:http://www.cmi.no/publications/file/3311-introduction-to-public-sector-ethics.pdf

terça-feira, 5 de julho de 2011

A corrupção, o jornalismo e as histórias da carochinha (2)

É por esta drenagem feita a partir do OGE, que também se consegue perceber que actualmente e de acordo com a própria ANIP, uma percentagem crescente e significativa do investimento privado fora do sector petrolífero, já esteja localizada em solo nacional, já seja assumida por angolanos genuínos.

Lembro-me de em finais do ano de 2003 ter feito um patético apelo bem revelador das minhas preocupações como cidadão e jornalista nesta matéria e que de lá para cá tenho repetido e reiterado sempre que a oportunidade surja.
Na altura escrevi algures, como resultado de uma conversa mantida com os meus botões, cheguei a conclusão que para engalanar os meus votos de ano novo próspero num país chamado Angola, com uma longa e contumaz tradição de má gestão da coisa pública, com todo o seu cortejo de grandes e pequenos desvios de fundos dos vários OGEs existentes, para conhecidos mas não comprovados bolsos, o melhor seria fazer um apelo sincero à contenção. Apenas isto. Nada de grandes exigências.
Sincero e realista.
Modéstia à parte, mas somos já conhecedores profundos da movediça realidade nacional, das suas limitações e sobretudo do feitio mal-humorado e por vezes violento dos seus protagonistas, alguns dos quais optaram claramente há já bastante tempo pela teoria dos dois discursos. Uma teoria que tem no terreno da política o seu principal campo de ensaio, com resultados muito animadores para os seus adeptos.
O resto faz-se na comunicação social e com a repetição até à exaustão de alguns chavões do discurso oficial.
O apelo lançado nos últimos dias de 2003 teve como principais e únicos destinatários todos aqueles que têm a responsabilidade de gerir o erário público, aos vários níveis, do topo à base, dos vários OGEs e de todos os sacos azuis, vermelhos, verdes e pretos que integram o arco-íris da nossa desgraçada existência.
“Que em 2004 se roube menos!” foi, preto no branco, o conteúdo do apelo sincero que subscrevi, convencido que uma tal economia de recursos se apresenta com um potencial de soluções muito grande, na luta contra a escandalosa pobreza que humilha, desespera e faz sofrer tremendamente muito mais de metade da nossa população, numa altura em que assistimos a uma briga de estatísticas entre o IBEP e o CEIC, sobre o nível efectivo da pobreza em Angola. Um tema da maior importância que seria de imediato e noutras latitudes matéria mais do que suficiente para vários debates públicos promovidos pela comunicação social.
Aqui é o que se vê…
Como é evidente, tais considerações feitas há mais de sete anos mantêm no essencial, lamentavelmente, a sua preocupante robustez física, depois da tolerância zero ter já caído no esquecimento de mais uma partida em falso, como ficou bem patente no famoso discurso feito por JES em Março último.
Dizia que apesar de muito estar a fazer, a média só parcialmente tem contribuído com a necessária profundidade para que a cruzada contra a corrupção atinja os seus objectivos.
Constata-se que grande parte dos espaços mediáticos dedicados ao tema é preenchido com as chamadas histórias da carochinha, enquanto ainda vemos jornalistas preocupados com o facto dos vendedores ambulantes não pagarem impostos e fazerem disso matérias de capa, num país onde a evasão fiscal é brutal e se estima em largos milhões com os mais ricos a não pagarem um tostão do que devem pelos rendimentos que deviam declarar ao fisco e nunca o fizeram.
De facto sobre a corrupção, seus anexos, arredores e periféricos vamos continuar a ter histórias da carochinha na imprensa enquanto não nos concentrarmos no que é fundamental.
(cont)

segunda-feira, 4 de julho de 2011

A corrupção e o jornalismo(1)

O ante-projecto do Código Penal que finalmente foi submetido à consulta pública tem tipificados vários crimes de corrupção num total de oito, incluídos em dois capítulos, a saber, o dos crimes cometidos no exercício de funções públicas e em prejuízo de funções públicas e no dos crimes contra o consumidor e o mercado.
Nenhum dos oito crimes referidos aborda o que é fundamental nesta matéria, num país com a história de Angola, onde de facto a corrupção mais preocupante no que toca aos seus impactos negativos/desastrosos sobre o conjunto da economia e a sociedade é aquela que resulta do exercício directo do poder ou a coberto deste.
Quando ao mais alto nível do sistema já se admite e cinicamente se lamenta, a existência de uma grande promiscuidade entre os negócios públicos e privados, está tudo dito neste domínio que explica a jusante a parte mais importante do fenómeno corrupção em Angola, que é de facto a corrupção institucionalizada.
Trata-se de um fenómeno que já não é possível ignorar pois está à vista de todos a fazer lembrar-nos, contudo e uma vez mais, a história do “Rei vai nú”.
Toda a gente vê o rei sem vestes, incluindo o próprio, mas todos receiam, incluindo o próprio, dizer/admitir a verdade, até que surge uma criança e grita o que é evidente, que o soberano está com tudo o que de mais intimo a natureza lhe deu, à mostra, completamente ao léu.
Esta referência conduz-nos directamente ao papel que a comunicação social/jornalistas deviam assumir nesta cruzada que é do maior interesse público e que levou a AJPD a trazer novamente o assunto a um debate que muito dificilmente, para além de algumas notícias superficiais, será capaz de mobilizar a média estatal para outros voos mais profundos/abrangentes.
Ingénuos como também às vezes gostamos de ser, para descansarmos um bocado do nosso pessimismo crónico, voltamos a acreditar recentemente na possibilidade de todos, em sincero exercício de reflexão nacional, admitirmos a nudez do rei, quando em Novembro de 2009 começamos a ouvir a falar de tolerância zero, que mesmo assim já não era bem, era apenas uma espécie.
Penso, apontou na altura JES nas suas vestes de líder do MPLA, “que devíamos assumir uma atitude crítica e auto-crítica em relação à condução da aplicação da política do Partido neste domínio. A transparência dos actos de gestão e a boa governação são uma frente em que ainda há muito trabalho a fazer”.
Com esta declaração de tão modestos rendimentos, numa frente onde o óptimo devia ser o grande amigo do bom, fomos dos primeiros a tentar dar o benefício da dúvida, como sempre, aliás, fazemos para não sermos acusados de intolerância.
“Como Partido maioritário, Partido do Governo, o MPLA, pontualizou JES, aplicou timidamente o princípio da fiscalização dos actos de gestão do Governo, quer através da Assembleia Nacional, quer pela via do Tribunal de Contas”.
De facto e apesar de algum barulho feito à volta do assunto, começo por dizer que só muito parcialmente a média tem assumido as suas responsabilidades na identificação da corrupção como sendo a grande ameaça já transformada no mais duro e corrosivo obstáculo ao desenvolvimento da economia nacional. Em causa está nas nossas empíricas contas um colossal volume de recursos públicos que todos os anos e pelas mais diferentes engenharias e malabarismos, é retirado da circulação pública rumo a conhecidos endereços particulares em detrimento da sua aplicação inicialmente programada, sendo mesmo assim já essa, algumas vezes de questionável utilidade no âmbito das efectivas prioridades nacionais.
(cont)