De uma forma geral pode
afirmar-se que a comunicação social é o novo fenómeno da sociedade angolana que
está a viver uma complicada fase de transição para a democracia.
Os angolanos estão a
descobrir e a exercer as novas liberdades democráticas em grande medida por
intermédio dos órgãos de informação tanto os estatais como privados, tendo por
pano de fundo um ambiente bastante contraditório, onde as tendências
autoritárias e repressivas do passado monolítico se mantêm ainda bastante
fortes a ofuscarem os novos valores e princípios democráticos que
paulatinamente estão a emergir e a afirmar-se.
Com todas as limitações
decorrentes da conjuntura política a afectar sobretudo o desempenho da
informação estatal, há uma certa convergência de opiniões em apontar a
comunicação social como sendo uma das locomotivas do processo de democratização
em Angola.
Muito mais locomotiva seria se, de facto, os actuais órgãos de informação
estatais assumissem na prática o seu estatuto de meios públicos, o que ainda
está longe de acontecer, com todas as excepções que se conhecem.
A redução desta influência pode medir-se com
alguma objectividade, tendo antes de mais como principal referência os esforços
desenvolvidos pelo poder político em manter sob seu rigoroso controlo a chamada
comunicação social estatal (Rádio Nacional de Angola, Televisão Pública e
Jornal de Angola).
A excessiva governamentalização é o principal traço da sua actuação, que se
traduz, nomeadamente, pela sua recusa em veicular pontos de vista que possam
chocar com os defendidos quer pelo partido no poder como pelo governo de JES.
Os jornalistas mais esclarecidos
que hoje trabalham na média estatal são os primeiros a reconhecer esta situação
de grande dependência dos desígnios do poder político.
Por exemplo, nas recentes
Jornadas Técnicas de Radiodifusão organizadas em Fevereiro deste ano pela Rádio
Nacional, foi exactamente esta a conclusão do grupo de trabalho que analisou a
programação informativa daquela estação emissora.
“ A insistência nas mesmas fontes, entenda-se executivo e ou partido no
poder, alternando raras vezes com as fontes da sociedade civil, ajuda a criar a
imagem de que somos única e simplesmente lambe-botas do poder instituído”.
Esta constatação foi muito
mal recebida pela direcção da RNA, tendo os seus autores sido seriamente
aconselhados a reformularem a sua apreciação.
Com a maior parte da
comunicação social existente no país sob o controlo editorial do governo está à
partida grandemente limitado o seu impacto/influencia, sobretudo quando se
trata de questionar a actuação do executivo em matérias fundamentais da vida
nacional.
Mesmo assim, não se pode
dizer que os jornalistas que trabalham para o estado sejam completamente
amorfos na sua actuação, havendo a registar alguns momentos altos da sua
prestação, com destaque para alguns dos seus colaboradores que se têm esforçado
bastante por manter o profissionalismo nos limites apertados que o
colete-de-forças rubro-negro (1) vai permitindo.
O grande problema que se coloca ao desempenho da comunicação social estatal é
nos períodos de crise, quando o Governo, como acontece actualmente com a nova
guerra, decide orientar o país para um determinado rumo.
Aí de facto a informação cede lugar quase completamente à propaganda, com a
censura, a auto-censura, a manipulação e a desinformação a regressarem em força
às redacções.
O tratamento dispensado pelo
Jornal de Angola à primeira manifestação coordenada da oposição contra o
aumento dos combustíveis realizada em Luanda (11.03.2000) ilustra bem este
“atrelamento” à estratégia governamental.
Para uma manifestação onde estiveram à vontade cerca de 1000 pessoas que já era
muito pouco para uma cidade de três milhões de habitantes, o Jornal de Angola
reduziu drasticamente o número dos participantes para “pouco mais de 100”.
A informação privada, com
todas as condicionantes decorrentes do seu limitado alcance em termos de
cobertura nacional, tem sabido conduzir-se de uma forma mais independente e
actuante, o que já levou o Presidente Eduardo dos Santos a reconhecer o seu
papel na sociedade.
Tal observação, vinda da parte de quem veio, não deixa de ser importante tendo
em conta anteriores considerações menos simpáticas do dirigente angolano em
relação ao papel dos jornalistas.
Por estar basicamente
concentrada em Luanda, onde funciona o centro do poder, a média privada é hoje
a grande referência de todas as conversas particularmente ao nível da classe
política.
Apesar de ser muito mal vista pelos representantes do poder, estes estão cada
vez mais atentos às suas matérias que já estiveram na origem de algumas
decisões tomadas pelo executivo.
O acalorado debate realizado
em Janeiro 2000 na Assembleia Nacional sobre a liberdade de imprensa, atesta
bem a importância que ela atingiu em Angola.
Como resultado deste debate o parlamento recomendou o governo “ a formulação e adopção de uma adequada
estratégia de desenvolvimento da comunicação social nacional, pública e
privada, incluíndo o fomento da imprensa regional, assim como o estudo de
formas de subsídios e isenções a conceder à mesma”. (2)
A imprensa tem contribuído
bastante para travar os excessos das autoridades, particularmente no domínio da
violação dos direitos humanos que continuam a ser constantes, numa sociedade
onde os índices de violência aumentam todos os dias.
O cidadão comum prefere
primeiro falar aos órgãos de informação para denunciar qualquer situação que
esteja a lesar os seus interesses, do que recorrer aos órgãos de administração
da justiça.
A experiência angolana já demonstrou que uma denúncia pública através da
imprensa tem resolvido melhor os seus problemas, pelo menos de forma mais célere.
Numa sociedade com as características da
angolana, onde as instituições funcionam bastante mal, onde os direitos
individuais dos cidadãos são todos os dias atropelados, onde o critério
político (filiação ou simpatia partidária) ainda é fundamental para se avaliar
quase todo o tipo de situações, a imprensa é hoje a grande alternativa que os
cidadãos e a sociedade civil têm à sua mão para fazerem valer os seus direitos
e os seus pontos de vista.
Os partidos políticos da
oposição que hoje são os grandes críticos do controlo que o partido no poder
detém sobre a comunicação social estatal, devem igualmente à média privada o
pouco espaço de intervenção que ainda vão conseguido obter para manifestarem as
suas posições sem o receio de verem os seus pontos de vista truncados ou
censurados, como tem acontecido vezes sem conta quando são objecto de algum
tratamento nos órgãos estatais.