sábado, 27 de setembro de 2008

Democratização em Angola: A caminho da terceira República sem muitas garantias

1-Angola prepara-se para ver nascer a 3ª República dentro de mais alguns dias, quando o parlamento resultante das legislativas de 5 de Setembro de 2008 tomar posse, retirando definitivamente da cena política a actual legislatura que se preparava para completar 16 anos de vigência. Provavelmente, o mais prolongado mandato constitucional que um parlamento já conheceu na história universal das democracias parlamentares. Isto, se Angola for aceite pelos historiadores como membro de pleno direito dessa instituição virtual (das democracias parlamentares) que estamos aqui a criar apenas para efeitos de análise. Em princípio assim será, porque as eleições de 1992 foram aceites pela comunidade internacional como tendo sido de uma forma geral livres e justas de acordo com o veredicto de Madame Anstee. Faltou o transparente no pronunciamento da diplomata britânica que esteve por aqui a representar o mundo no primeiro teste (mal sucedido) de admissão que Angola fez para ser aceite na comunidade internacional como um “país normal”, após 16 anos de guerra civil e regime monopartidário. Na altura, recorde-se, os EUA ainda não tinham reconhecido Angola o que só viria a acontecer em 1993, após o fracasso da ronda de Abidjan, com a assinatura de Bil Clinton. O que se passou depois com o devastador conflito pós-eleitoral que se prolongou até 2002, também foi aceite pela comunidade internacional como razão suficientemente impeditiva para não se realizarem eleições novamente em Angola. Foi assim conferida a necessária legitimidade (ou legalidade?) ao actual parlamento para continuar em funções ao abrigo do artigo 81 da Lei Constitucional, segundo o qual “o mandato dos Deputados inicia-se com a primeira sessão da Assembleia Nacional após as eleições e cessa com a primeira sessão após as eleições subsequentes, sem prejuízo de suspensão ou de cessação individual do mandato”. 2-Por razões óbvias, a terceira República vai fazer renascer na mente dos mais cépticos (ou frustrados se quiserem, que ainda são mais do que muitos) com bastante força, o fantasma da primeira República que era Popular, trazendo de volta com toda a legitimidade que acaba de ser conferida pelas urnas, o conceito da “ditadura democrática”. Originalmente o conceito praticado nos primeiros anos da Dipanda era o da “ditadura democrática revolucionária”. Tendo o MPLA deixado cair há já bastante tempo o seu marxista “PT”, não haverá em principio que recear por mais alguma revolução em solo angolano, embora o “PRESILD” tenha voltado a assustar alguns observadores. Os “camaradas” há muito que já se converteram às delícias do capitalismo liberal (ou selvagem?) e da propriedade privada, o que é facilmente verificável e contabilizável no seu actual modo de vida, embora também aqui se levantem algumas dúvidas em relação à consistência do modelo, tendo como referência os princípios mais sagrados da própria economia de mercado. Nesta altura e com a utilização de capitais públicos até já estão a actuar em praças financeiras além-mar, exportando toda a pujança do suis generis capitalismo local, nomeadamente, para terras portuguesas, diante de alguma apreensão dos seus anfitriões que têm vindo a reagir a este “segundo regresso das caravelas” de forma algo desorientada e contraditória. Mas o que nos interessa esta semana, é mesmo falar da terceira República e muito particularmente do prosseguimento do processo democrático que agora vai apenas ter como garantias a palavra e as promessas dos vencedores e os limites da revisão constitucional estabelecidos no actual texto da Lei Constitucional. 3-Mesmo com a sua maioria super qualificada, o “esmagador” MPLA não deve nem pode, em princípio e à falta de um melhor entendimento, fazer aprovar uma nova constituição à revelia de seis princípios fundamentais. São eles: 1) a independência, integridade territorial e unidade nacional; 2) os direitos e liberdades fundamentais e as garantias dos cidadãos; 3) o Estado de direito e a democracia pluripartidária; 4) o sufrágio universal, directo secreto e periódico na designação dos titulares electivos dos órgãos de soberania e do poder local; 5) a laicidade do Estado e o principio da separação entre o Estado e as igrejas; 6) a separação e interdependência dos órgãos de soberania e a independência dos Tribunais. Este “pacote” é para já a única garantia concreta que todos temos, os que acreditam e os que não acreditam nas boas intenções do maioritário, de vermos Angola prosseguir nos trilhos da democratização, mesmo que seja só para inglês ver. A outra garantia é a existência do Tribunal Constitucional que tem competência para analisar todos os actos, praticados sejam por quem for, que, eventualmente, possam pôr em causa os limites da alteração da constituição atrás referidos. A alçada do TC estende-se a outras manifestações menos pacíficas que possam ferir letras e espíritos assentes em diplomas fundamentais do direito internacional que Angola já subscreveu. É pois com estas garantias mínimas, que são manifestamente insuficientes, sobretudo para os que não acreditam em boas intenções, sejam de quem for, que nos preparamos para entrar na terceira República. Já aqui o dissémos que nas condições concretas de Angola, governar é uma coisa, democratizar é outra, pelo que as duas tarefas terão de marchar em paralelo e em sintonia, tendo em conta o passado do país. É fundamental que a consciência de quem governa (ou comanda a governação) esteja atenta permanentemente ao estado da nação e ao desempenho qualitativo das suas instituições no relacionamento com os cidadãos e com todos os interesses em presença no vastíssimo quadro da nossa geografia que continua demasiado refém do que se faz e se decide em Luanda. 4-O grande teste da democratização será a aprovação da primeira Constituição para Angola. Depois de ter aprovado todos os textos constitucionais que já figuraram no nosso ordenamento jurídico desde 1975, o MPLA volta a estar sozinho em pleno regime democrático, desta feita por ausência de qualquer oposição, com a grande responsabilidade de fazer aprovar uma constituição que nos dignifique a todos. Do que “sobrou”, como divergência de peso da fracassada constituinte da segunda República, quando a oposição ainda tinha alguma capacidade de negociação, está claro que o grande desafio do MPLA é desenhar um sistema de governação assente num modelo democrático já testado internacionalmente e não tentar “descobrir” novamente uma solução angolana apenas para resolver problemas de conjuntura. Os homens passam, os países ficam. Mais claramente do que isso talvez fosse necessário dizer que, praticamente, já não há nada para inventar em matéria de modelos constitucionais. Ou é ou não é. Agora tentar querer ser tudo e depois, na hora da prestação de contas, não ser nada é que não dá. Não é, certamente, um modelo democrático.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

As outras contas que a Comissão Nacional Eleitoral vai ter de fazer

Sinceramente gostaria de saber… qual foi o preço que os angolanos tiveram de pagar pelas urnas de plástico (parecidas com os recipientes que se utilizam para transportar comida), as cabines de papelão (que poderiam ter ficado completamente desfeitas se tivesse chovido a sério) e as tendas sei lá de quê sem uma lanterna sequer para contar bem os votos? Em nome da transparência acho que a Comissão Nacional Eleitoral (CNE) deveria publicar em tempo oportuno as suas contas devidamente auditadas para todos ficarmos a saber quanto é que foi gasto em toda esta democrática movimentação, começando pela campanha de educação cívica (sempre houve mesmo?) e terminando nos kits eleitorais. Não seu muito bem a quem é que a CNE deve prestar contas, mas sei que o Tribunal de Contas do Kota Julião tem, em princípio, jurisdição mais do que suficiente para pedir contas a todas as instituições deste país que utilizam recursos públicos. Com a apresentação da acta dos resultados finais das eleições de 5 de Setembro no passado 16 no Centro de Convenções de Talatona, no decorrer de uma cerimonia sem brilho, a CNE concluiu o seu trabalho cívico, com uma nota bastante sofrível para os mais exigentes e desconfiados, alguns dos quais até tentaram a impugnação das eleições no bastião luandense junto do Tribunal Constitucional. Agora falta a segunda parte desta contagem para sossegar todos aqueles que acham que foi gasto dinheiro a mais com tão pouco e com tão pouca qualidade. Não se está aqui a lançar qualquer suspeição sobre quem quer que seja, mas de facto e de jure as contas sobre a utilização do dinheiro público devem ser feitas, de preferência, em público.
É um princípio da boa governação.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Tribunal Constitucional foi a única estrela que conseguiu realmente brilhar

1-Com o acórdão nº 74/2008 pronunciado pelo nóvel e incansável Tribunal Constitucional sobre o Recurso de contencioso eleitoral interposto pela UNITA no âmbito do processo nº61/2008 terminou a “festa”. O Tribunal em causa, depois de todas as causas que soube arbitrar e decidir, sempre em tempo oportuno, acabou por ser a estrela mais brilhante da recta final do nosso processo eleitoral, onde chegou quase em cima da hora. Foi impecável, mesmo sem poder agradar a todos o que seria manifestamente impossível, até pela natureza de qualquer conflito quando os seus protagonistas recorrem aos tribunais. De outra forma a própria justiça, se optasse pelo empate como solução, entraria num impasse e perderia a sua grande utilidade social que ainda não entre nós. Aí sim, as pessoas passariam a fazer justiça com as suas próprias mãos. Sendo embora uma instância especial, o Tribunal Constitucional provou que a justiça em Angola pode ser feita respeitando prazos e procedimentos, desde que os seus juízes trabalhem e sejam efectivamente profissionais do direito, sem outras considerações paralelas, mesmo que as tenham quando vão votar, por exemplo. No meio de todos quantos concorreram para o sucesso do processo eleitoral e depois de todas as barracas da CNE, é sem qualquer esforço que estamos aqui a dar nota 10 ao Tribunal Constitucional pelo seu desempenho exemplar. Pela sua transparência numa parceria quase perfeita com a Internet. Pela própria compreensão do fenómeno eleitoral nas condições concretas de Angola que aconselhou o seu plenário a tomar algumas decisões mais complexas do ponto de vista da interpretação da própria lei, mas que não deixaram de ser muito justas para o momento. Os juízes do TC sem querer, deram uma grande lição de eficácia e de eficiência a todos os seus colegas de todas as instâncias, começando pelo Supremo que, felizmente, deixou de ter o poder de decidir sobre tudo e mais alguma coisa neste país. Finalmente!
2-Baixou o pano sobre o último acto do processo eleitoral. O país já conhece os seus novos 220 representantes que vão preencher o hemiciclo da Assembleia Nacional. A oposição de tão reduzida que ficou, vai ter, possivelmente, de se unir numa única bancada parlamentar para poder sobreviver ao princípio da proporcionalidade quando chegar a hora de se constituírem as comissões de trabalho. As normais, as eventuais e as ainda mais eventuais que serão as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI). Agora já não há mais nada a fazer, senão cumprir a nova regra da maioria altamente qualificada que passaremos a "estar com ela" dentro dos próximos quatro anos, com a missão quase impossível de retomar a democratização do país, o que não tem nada a ver com a governação propriamente dita, que vai, obviamente, continuar a ser feita. Resta agora saber se a governação será feita nos moldes antigos, se com algumas novidades em matéria de comportamento institucional, nomeadamente dos seus agentes judiciais e jurisdicionais que são aqueles que mais nos preocupam no curto prazo. Depois dos elogios rasgados feitos ao Tribunal Constitucional, não podemos passar ao lado dos pesados 12 anos de prisão que foram distribuídos gratuitamente ao nosso antigo colega em Cabinda, o Fernando Lello, a marcar o ponta-pé de saída dos tribunais nesta “nova” república que ainda não foi sequer inaugurada. Esta sentença teve por base um crime previsto numa lei, a dos crimes contra a segurança de estado, aprovada ainda durante os anos de chumbo da República Popular. Trata-se de uma lei anacrónica que tarda em ser democratizada. Esta sentença não é, certamente, um bom presságio no arranque da nova república, sobretudo para quem é pessimista por natureza e já não acredita em boas intenções e muito menos em discursos de ocasião. A existência desta lei é apenas um dos muitos sinais preocupantes que apontam bem alto para a necessidade urgente de se democratizar este país, com ou sem maiorias absolutas.

Afrikanita celebrou 50 anos de Bossa Nova com lotação esgotada

A maior sala do Hotel Trópico em Luanda encheu-se no passado sábado, dia 20, com mais de trezentas pessoas, para ver e ouvir Afrikanita e a sua banda interpretarem durante mais de uma hora alguns dos temas mais famosos do já falecido "kota" Tom Jobim, num desfile bem angolano por entre os corredores da Bossa Nova que este ano assinala meio século de existência.
A Bossa Nova foi o resultado do cruzamento da musica popular brasileira com o jazz norte-americano que teve inicio em meados dos anos 50, quando alguns musicos e compositores brasileiros que viviam no Rio de Janeiro decidiram dar um outro rumo às suas carreiras musicais com base nas harmonias jazzisticas.

domingo, 14 de setembro de 2008

A SIC-Noticias e a muito aceitável cobertura das eleições angolanas

Muito antes de ter rebentado a recente bronca entre os nossos sempre vigilantes “SMEs” e os jornalistas de alguns órgãos da comunicação social portuguesa, a quem foi recusado o visto de entrada em Angola para fazerem a cobertura das eleições, já tinha manifestado o meu apreço pela qualidade e o profissionalismo do Canal SIC-Notícias. Definitivamente é o canal que mais vejo e do qual mais informação recebo do mundo com Angola incluída. É claramente o meu canal favorito, opinião que saiu ainda mais reforçada agora com a cobertura que a SIC-Notícias fez das eleições angolanas, mesmo sem ter conseguido fazer deslocar a Luanda uma equipa de reportagem. Se calhar, permitam-me aqui este parêntese, a minha estação preferida até deveria ser a RTP-África, canal com o qual o meu sócio e sósia, o Reginaldo Silva (RS), colaborou durante vários anos, findos os quais teve de abandonar por razões de força maior relacionadas com o (não) respeito de alguns valores, incluindo os monetários. O que é facto é que volvidos cerca de cinco anos, o espaço que ele preenchia na grelha daquela estação portuguesa continua vazio, sendo Angola o único país africano lusófono que depois da sua saída deixou de apresentar o “Fórum-Africa”, um programa semanal de entrevistas que ele conduzia. Como é evidente, os burocratas de Lisboa nem deram pela falta do programa depois de terem “engolido” uma explicação qualquer que lhes foi enviada a partir de Luanda sobre o abandono do RS. Com este parêntese, que pode parecer algo forçado e extemporâneo, fica aqui uma explicação devida que nunca foi dada ao público da RTP-África, que de repente se viu privado daquele espaço de opinião sem qualquer justificação. Em obediência ao princípio do mais vale tarde do que nunca, o RS achou por bem recordar os seus velhos e televisivos tempos pelo (periférico) audiovisual português, a propósito da recente bronca com a SIC (e não só), que ainda anda por aí a fazer alguns estragos no relacionamento bilateral. Os jornalistas da SIC e da SIC-Notícias, onde se inclui a minha amiga Cândida Pinto, não estiveram entre nós como era seu ardente desejo, porque foram vítimas de outros “desejos” locais menos simpáticos em relação ao desempenho editorial da sua estação. Estamos, certamente, todos recordados das ondas de choque provocadas pelo programa de opinião da SIC- Notícias, o “Eixo do Mal”, na sequência das declarações proferidas em Lisboa pelo mui british Sir Bob Geldolf. Em abono da verdade o mundialmente famoso roqueiro britânico até acertou em cheio no elevado preço das moradias que se vendem e se alugam em Luanda, tendo, obviamente, falhado na adjectivação insultuosa que depois utilizou para enviar uns azedos “recados” à nossa nomenklatura. Impedida de vir a Luanda, a SIC fez, entretanto, uma cobertura bastante aceitável das eleições angolanas quer no plano informativo, quer em termos de análise. Com este desempenho a estação de Carnaxide demonstrou que é possível, em qualquer circunstância, manter o profissionalismo como sendo a principal referência da actividade jornalística que de facto tem padrões e normas a respeitar e uma ética a defender. Pela SIC-Noticias tivemos o grato de prazer de acompanhar em directo interessantes debates televisivos sobre Angola, onde prevaleceu o princípio do contraditório, que, como sabemos, foi um dos grandes ausentes da cobertura jornalística feita entre nós pela comunicação social estatal. Uma ausência sentida mesmo ao nível dos chamados “opinion makers”, seleccionados a dedo, de acordo com as cores das respectivas camisolas, para evitar alguns conhecidos “problemas” relacionados com as consequências da liberdade de opinião e de crítica. Não é possível nem é credível discutir seja o que for, utilizando, mesmo que de forma parcial, a famosa lei da rolha, que esteve bem presente no decorrer desta campanha eleitoral no desempenho dos médias estatais. O programa "Opinião Pública" que a SIC-Notícias transmitiu (sempre em directo) na manhã de segunda-feira dia 8 de Setembro onde o tema foram as eleições angolanas, foi um verdadeiro e acalorado festival de abertura e de confronto de opiniões e ideias, sem papas na língua, por parte dos telespectadores que telefonaram para o canal, tendo alguns deles feito este exercício a partir de Angola. Durante a cobertura à distancia efectuada pela SIC-Notícias, entre as várias vozes e rostos que tivemos a oportunidade de ouvir e ver desfilar pela SIC-Notícias falando de Angola e das eleições angolanas, uma delas foi a da minha amiga Nicole Guardiole. Os que por aqui criticaram a SIC-Noticias, mas ao mesmo tempo elogiaram a postura da referida jornalista, “esqueceram-se” que foi no palco do tão mal querido canal, que a Nicole foi convidada a dar o seu “show de sapiência” sobre Angola. E “esqueceram-se”, apenas porque só gostam de ouvir o que lhes agrada, são alérgicos à crítica e à liberdade de opinião, preferindo, obviamente, o regresso ao sistema das correias de transmissão, onde a imprensa é apenas mais um elo da engrenagem comandada pelo Big Brother. A SIC-Notícias, mesmo sem ter vindo a Angola, acabou por fazer o seu trabalho sem ter necessidade de “puxar o saco” de ninguém, dando primazia aos factos com recurso às imagens da TPA-Internacional e ouvindo todas as opiniões possíveis dentro dos condicionalismos em que foi obrigada a trabalhar Os que bateram palmas a Nicole Guardiole, não gostaram certamente de ouvir o Rafael Marques nem o José Eduardo Agualusa. Eu gostei de ouvir todos, o que não quer dizer que tenha concordado com todos eles, incluindo o empresário português (não me consigo agora recordar do seu nome) que participou no programa "Expresso da Meia-Noite" (edição de 5 Setembro) e que fez uma das defesas mais bem conseguidas da imagem do regime angolano em Portugal. É mesmo assim que as coisas são e se apresentam quando o tema é Angola e quando o espaço mediático tem a necessária autonomia, independência e liberdade para não ser engolido, nem manipulado pelo vizinho politico-partidário do lado, esteja ele situado à direita, ao centro ou à esquerda.
Seja ele neo-liberal, capitalista reciclado ou ex-comunista com saudades do passado. Viva a eterna liberdade de imprensa, que todos os concorrentes ao pleito recém-terminado disseram respeitar e promover. A ver vamos, pois agora promessa passa a ser dívida e tem apenas quatro anos para ser liquidada, antes de fazermos o próximo balanço sobre o real estado da comunicação social em Angola, depois do desastre eleitoral que quase ia retirando a oposição do mapa político local.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Processo de democratização enfrenta segundo impasse

1-Somos combatentes desde a primeira hora da abertura política deste país por soluções de consenso, com base em resultados eleitorais mais equilibrados, como sendo a principal garantia de sustentabilidade do próprio processo de democratização. Como não acreditamos que possa haver a recomendável liberdade de imprensa apenas com uma rádio nacional, uma televisão pública (com um ou vários canais) e um oficioso jornal diário (com vários derivados), também não acreditamos que um partido, por si só, por mais democrático que ele seja (não é certamente o nosso caso), possa sozinho democratizar o país, sem ter que negociar minimamente com as restantes forças políticas. Com os resultados de 5 e 6 de Setembro está claramente projectado no horizonte imediato mais um impasse no processo de democratização propriamente dito. Já lá chegaremos. A novidade deste segundo impasse é que ele tem um tempo de duração limitado pelos quatro anos da nova legislatura. No caso de Angola e tendo em conta sua história oficial de pouco mais de cinquenta anos de atribulada existência, a maior parte dos quais vividos em situação de guerra aberta com os seus adversários, o MPLA que vai reinar ainda mais sozinho na nova legislatura, está muito longe, por razões óbvias, de ser um partido com sólidas tradições democráticas. Diremos mesmo que só a partir de agora com a realização de eleições regulares no âmbito do novo ciclo político que acaba de ser inaugurado, é que o MPLA vai sentir, mais intramuros, a necessidade da sua democratização interna com os seus reflexos a transbordar, necessariamente, para a sociedade. Esta evolução, note-se, não é automática. O seu líder já reconheceu que as eleições vão alterar a forma de se fazer política em Angola, o que para nós significa dizer que, até agora, a política era feita sem o impacto da pressão efectiva da opinião pública, que, como se sabe, nas democracias mais consolidadas é o principal barómetro da vida política. Nas declarações que prestou à TPA momentos após ter votado com cerca de duas horas de atraso, José Eduardo dos Santos destacou o início de um novo ciclo político. “Penso que iniciamos também uma nova maneira de fazer política e de conseguir certos objectivos em que há competição na base do respeito e da liberdade”- apontou JES. Entre nós o fenómeno opinião pública já tem a sua expressão, porque até já temos uma sociedade civil que tem vindo progressivamente a ocupar o espaço a que tem direito na vida política, sobretudo através da sua presença nos médias estatais e privados. O problema é que antes das eleições os “cães podiam ladrar” sem que nada acontecesse à caravana. Agora, a caravana já não vai mais poder passar, sem ouvir bem o que os “cães” estão a dizer com os seus latidos insistentes. Um dos problemas mais sérios e complexos que Angola enfrenta, já aqui o dissémos, é a sua democratização estrutural, 16 anos depois de estarmos a viver em democracia formal, com todos os grandes e pequenos défices que se conhecem. Os escolhos ainda são mais do que muitos estando bem patentes nas ambiguidades e nas “truculências” do actual texto constitucional que o Presidente da República já se comprometeu em “modernizar”. Restará agora saber, na sequência dos resultados das legislativas que se conhecem, qual é de facto e de jure o seu conceito de modernidade aplicado à revisão constitucional que se avizinha. 2-A democracia seja ela mais representativa ou mais participativa tem na realização de eleições periódicas a sua grande baliza, mas não se esgota no acto em si. Quando os eleitores votam, em princípio, fazem opções, alimentam expectativas, transferindo para o partido ou o candidato da sua escolha o único poder que possuem (?) de verem os seus problemas resolvidos nos próximos quatro ou cinco anos. Tendo em conta a proximidade do fim do devastador conflito militar, pensamos que nestas eleições, a lógica prevalecente ainda não foi a da razão sobre a emoção, o que também foi consequência da preponderância excessiva da propaganda sobre o debate, da agitação sobre a informação. Acreditamos que uma campanha eleitoral que tivesse outras “normas” que não aquelas que “asfixiaram” a nossa, teria certamente outros resultados. Refira-se, entretanto, que mesmo em condições normais (sem guerras recentes) em muito processos eleitorais por este mundo, a emoção continua a ditar as suas regras com mais força do que a razão, isto sem falar da utilização de outros mecanismos de condicionamento e de coerção sobre o eleitorado. Em Angola o pleito eleitoral em que participamos pode, por outro lado, ter sido o último acerto de contas entre os dois antigos beligerantes da guerra civil. Agora já não há mais dúvidas em relação ao lugar dos diferentes protagonistas na cena angolana após mais de três décadas de conflito. Pelo menos durante os próximos quatro ou cinco anos. Aguarda-se pela divulgação dos resultados finais da votação para se conseguirem fazer as contas definitivas da abstenção que pode ter ultrapassado os dois milhões de eleitores para um universo de 8 milhões e 250 mil. Pensamos é que uma taxa demasiado elevada para um país que não ia a votos há mais de 15 anos a sugerir outras leituras menos clássicas do fenómeno eleitoral. Será, possivelmente, a última consolação que restará a oposição. Em grande medida o debate (que não aconteceu propriamente) foi dominado pela mensagem do quem destruiu durante a guerra e do quem está a construir em tempo de paz, com todos os resultados que foram sendo exibidos no decorrer da campanha. Claramente aos olhos da população, a UNITA foi “triturada” neste debate, como aliás era previsível. A maratona das inaugurações presidenciais de obras públicas, com a monumental cobertura mediática que foi objecto, acabou por ser decisiva, como o próprio MPLA acabou por reconhecer na sua declaração de vitória. Trata-se de uma actividade que em tempo de campanha eleitoral não é permitida noutras paragens onde a democracia e as eleições já fazem morada há muito mais tempo.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

O regresso (democrático) ao partido único ou a "mexicanização" da política angolana

Está praticamente confirmado um dos cenários que projectei na penúltima semana da campanha como sendo o menos desejado, mas o mais lógico. Escrevi na ocasião o seguinte: Também admito outros cenários, sendo o mais lógico nesta altura, até com base no desempenho popular dos concorrentes nesta campanha eleitoral (com destaque para o MPLA e a UNITA), aquele que aponta para uma vitória esmagadora do partido governante, o que retiraria da agenda a hipótese de uma bipolarização efectiva (equilibrada) para passarmos a ter apenas uma bipolarização formal. Este cenário parece ser a grande aposta do MPLA, embora o seu discurso oficial de campanha ainda não tenha clarificado este desiderato, que nas contas de alguns “camaradas”, com quem temos conversado, está a ser colocado numa fasquia estratosférica a apontar para a chamada maioria qualificada. Como é evidente este não era o cenário da nossa preferência. Claramente e apesar da dinâmica distinta das duas campanhas, sendo a do MPLA, sem dúvida, a mais expressiva do ponto de vista da mobilização do eleitorado, uma distância que se acentuou ainda mais com a entrada em cena na última semana do Presidente José Eduardo dos Santos, escrevi na mesma ocasião que ainda não era líquido, em termos de previsão, que uma das duas formações em causa conseguisse obter a maioria absoluta do eleitorado com mais de 50% dos votos escrutinados. Em nome de uma sempre recomendável cautela na hora dos prognósticos tão sensíveis como este, vamos ter que admitir, por outro lado, que entre os dois “paquidermes” da política nacional possa surgir uma “manta de retalhos” integrada por alguns dos restantes concorrentes que ficaria com pelo menos 10% dos votos. A confirmarem-se as nossas previsões, que de algum modo se confundem com os nossos desejos enquanto cidadão, teríamos a futura Assembleia Legislativa dominada pelo MPLA e pela UNITA, mas sem possibilidades de nenhum dos dois possuir sozinho a maioria absoluta, à semelhança do que existe actualmente. Das projecções e dos desejos para a realidade dos números e da vontade popular, já pouco mais falta por contar neste “pesadelo” que a oposição e o país vão ter de saber digerir nos próximos quatro anos. O MPLA vai dominar a futura Assembleia Nacional com cerca de 80% dos seus 220 assentos, o que lhe permitirá continuar a governar "na maior das calmas" e aprovar a nova constituição sem necessidade de negociar com mais ninguém. É claramente e quase por aclamação, o regresso ao partido único, restando apenas aguardar pela “entronização” de José Eduardo dos Santos que terá lugar dentro de um ano, quando forem convocadas as eleições presidenciais. A questão que se coloca nesta altura é saber se haverá algum candidato disponível com “coragem” suficiente para enfrentá-lo, depois do “massacre” que estamos a presenciar. Seja como for e com base no actual resultado, o "massacre" poderia ter virado "genocídio" se as duas eleições se realizassem em simultâneo, conforme defenderam alguns circulos da oposição. Salvaguardando as devidas distâncias, o cenário da "mexicanização" da vida política angolana já é uma realidade. O Partido Revolucionáro Institucional (PRI) governou sozinho o México por mais de 70 anos(de 1929 a 2000) tendo vencido, durante este periodo, todas as eleições que tiveram lugar em terras de Pancho Villa e Emiliano Zapata. [A oposição ao partido, como académicos e historiadores dizem que durante o poder do PRI, as eleições eram nada mais que uma simulação de uma aparente democracia. Também lembram de fraudes eleitorais, incluindo repressão e violência contra os eleitores, eram recursos utilizados pelo PRI quando o sistema político não funcionava como o partido pretendia. Em 1990 o escritor peruano Mario Vargas Llosa chamou o governo mexicano de uma "ditadura perfeita"] in Wikipédia

domingo, 7 de setembro de 2008

Uma campanha dominada pela figura do Presidente José Eduardo dos Santos

1-Em Angola copiamos muita coisa que vem do Brasil, incluindo o sotaque e o“português mal falado” dos seus mais de 100 milhões de habitantes, sendo neste último e linguístico caso, os seus mais fiéis seguidores, os prosélitos locais da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). Saravá! O que não copiamos, sobretudo ao nível das instituições que integram o aparelho governativo angolano, são as boas práticas de gestão da coisa pública que já vão fazendo escola no Brasil de Lula, a marcar uma diferença substancial com o passado recente daquele gigante latino-americano. Como estamos em tempo de eleições e por que, de facto, são mais do que muitos os reparos que estão a ser feitos ao desempenho das entidades que exercem o poder público em Angola no seu relacionamento com os partidos políticos concorrentes, gostaríamos de salientar que a legislação eleitoral brasileira não permite a nossa “confusão”, que é total e absoluta. As normas de conduta brasileiras são completamente alérgicas à forma como está a ser praticado entre nós o “desporto” eleitoral. Os brasileiros sabem, por exemplo, que “durante a campanha, está proibida a propaganda institucional ou oficial. Entende-se que nem a autorização, nem a própria propaganda podem ocorrer nesse período”. Os brasileiros sabem ainda que está igualmente proibida “a distribuição gratuita de bens e serviços públicos em beneficio de candidato em ano de eleição; não se proíbe a distribuição regular de bens e serviços (merenda escolar, livros didácticos, campanha do leite, vacinações, assistência judiciária gratuita, etc), mas sim o uso promocional e político. Os brasileiros sabem tudo isto e muito mais em nome de um bem jurídico-constitucional altamente protegido que é “a igualdade na eleição” e que teve como consequência a definição de um conjunto de condutas vedadas aos agentes públicos em campanha eleitoral. O primeiro destes agentes é o Presidente da República, é aquele que deve dar o exemplo. Tais condutas são actos bem definidos na lei e que se caracterizam pelo abuso do poder político, pela exploração da máquina administrativa ou de recursos estatais em proveito de uma candidatura. 2-Importa referir que o nosso Código de Conduta Eleitoral também tem disposições suficientes (embora muito genéricas) para fazer face ao “caos” que se instalou por estas bandas, ao ponto de alguém já ter afirmado que houve mais concorrentes do que aqueles que foram licenciados pelo Tribunal Constitucional (TC). Em causa está, em primeiro lugar, o activo e decisivo papel desempenhado na campanha eleitoral pelo Presidente da República a favor do partido que tem na liderança e no coração, seguido das mega-toneladas de propaganda institucional do governo e complementado pela “cobertura jornalística” dos médias estatais, num verdadeiro golpe de misericórdia contra a oposição. Uma oposição que não esteve bem nesta estreia, mas que, por melhor que estivesse, dificilmente poderia fazer face a uma ofensiva tão poderosa e tão bem combinada e articulada por parte do partido governante. Com estas observações que são objectivas, não se pretende diminuir, de forma alguma, o valor e a abrangência nacional da campanha eleitoral que o MPLA levou a cabo no terreno dos comícios e bebícios, das passeatas, das farras, das maratonas, dos contactos porta-a-porta, corpo-a-corpo e mesmo boca-a-boca, como alguém, possivelmente, equivocado já se referiu. Seja como for o contacto boca-a-boca pode ser até recomendável para quem de facto queira aprofundar um pouco mais a intimidade com os eleitores, que de facto precisam de sentir mais de perto o bom ou mau hálito dos concorrentes e das suas promessas após tantos anos de ausência. Algumas delas, cheiram claramente a esturro, não sendo sequer necessário o contacto boca-a-boca com o proponente para identificar a sua halitose, o que, entretanto, não é entendido da mesma forma pelos eleitores mais permeáveis à propaganda e aos apelos emocionais, que acabam por ser a maioria. Isto mesmo diante de algumas evidências que ultrapassam qualquer capacidade técnica, humana e política disponível de as concretizar pelo menos em Angola, a não ser que haja eleições todos os anos. Aí sim, talvez fosse possível. Talvez… É aí que, para efeitos de esclarecimento dos eleitores, devia entrar um outro candidato não licenciado pelo TC chamado debate publico contraditório, que acabou por ser o grande ausente desta campanha. 3-Excluído o grande empurrão dado pelo seu líder nas vestes de Presidente da República e de Chefe de Governo, com a sua impressionante maratona de inaugurações e comícios um pouco por todo o país, a campanha do MPLA em termos mobilizativos, foi de longe, mas mesmo muito de longe, superior a de todos os restantes concorrentes juntos, incluindo a UNITA. Para esta diferença abissal terá certamente contribuído, para além naturalmente do vigor da sua mensagem, o imenso poderio financeiro do partido da situação, que não tem qualquer comparação possível com a pequenez e mesmo insignificância dos restantes concorrentes, incluindo a UNITA. Como se sabe a actividade política em tempo de campanha eleitoral é particularmente exigente em matéria de recursos financeiros. Não é de todo despiciendo afirmar que sem dinheiro não há qualquer possibilidade de se ganhar uma eleição, por mais justas e pertinentes que sejam as nossas ideias e as nossas críticas ou por mais desastroso que tenha sido o desempenho do partido no poder. Talvez também por aí se perceba melhor o apelo algo paternalista de JES feito no Huambo, para que os restantes partidos tenham paciência, no sentido de entenderem que estas eleições ainda não são para eles. Talvez as próximas, admitiu. O problema central de qualquer campanha eleitoral não são as ideias e os projectos. A questão fundamental acaba por ser técnico-material; é como fazer chegar a nossa mensagem a milhões de pessoas em muito pouco tempo. Só com meios poderosos, muitos meios e muitos recursos se pode chegar lá.

A fotografia mais sexy das Olimpíadas de Bejing

Esta monumental "kibiona" pode ter muito a ver com os resultados das eleições angolanas

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Caos no arranque da votação em Luanda

Foi uma perfeita desgraça o arranque do processo de votação em Luanda.
Um grande numero de assembleias de votos na capital angolana até ao meio dia não tinha dado incio aos seus trabalhos por falta de boletins de voto.
Para se ter uma ideia do impacto desta "partida em falso" do processo só mesmo depois da contagem dos votos.
Receio que as coisas, como resultado do caos que marcou as primeiras horas do processo de votação, possam ter ultrapassado alguns limites mais críticos, quando se fizerem as contas finais da abstenção.
Espero estar enganado.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Os angolanos vão deixar de mendigar para passarem a cobrar o que lhes é devido

1-Que mais dizer desta campanha em cima do dia D? Este será, possivelmente, o meu derradeiro apontamento sobre o que foi a campanha eleitoral, sem termos ainda em conta o comportamento dos eleitores no exercício do único poder soberano que a nossa constituição confere aos angolanos de uma forma geral. Temos de facto o poder de votar e de escolher os nossos “distantes” representantes. Se fosse verdade deveria dizer os nossos directos delegados, mas não é, pelo menos na prática. Escolhemos, mas depois a tal democracia representativa que “estamos com ela”, não nos permite controlar o seu desempenho no dia-a-dia das instituições e muito menos retirar a nossa confiança. É aí que terminam as ilusões de termos algum poder, enquanto eleitores e começa o sofrimento e a decepção de milhões por este mundo que acreditam que o voto pode ter alguma utilidade. Temos que esperar depois mais quatro ou cinco anos, para voltarmos a acertar as contas com as promessas feitas durante esta campanha que foram muitas e ambiciosas, sobretudo por parte do partido que mais receia perder estas eleições, ou não ultrapassar a fasquia programada. É de facto o partido que tem mais medo de perder estas eleições, tendo esta sensação ficado bem explícita na forma frenética como o seu primeiro jogador que é igualmente o treinador da equipa (depois de ter deixado de ser arbitro) entrou em campo a partir da segunda semana do desafio que está quase a chegar ao fim. 2-A grande novidade destas eleições em Angola é que elas anunciam o inicio de uma nova época com a renovação regular dos mandatos pela via das urnas, tendo por isso, entre outras consequências mais imediatas, um impacto muito positivo no desempenho da governação e na distribuição do rendimento nacional. A partir de agora, caso a normalidade constitucional não venha a ser interrompida por mais nenhum “tsunami” parecido com o de 92, vamos ter uma governação, certamente, muito mais preocupada com os resultados imediatos das suas políticas para além dos discursos, das promessas e das propagandas. As eleições ganham-se com resultados concretos, sendo prova disso a programação que foi feita com os investimentos públicos de que resultaram todos os projectos que às catadupas foram inaugurados na última semana da campanha. Por si só e independentemente dos resultados, as eleições representam uma nova esperança dos angolanos verem os seus gravíssimos problemas sociais serem resolvidos a médio prazo. Representam por um outro lado um sério travão à voracidade com que as elites dirigentes deste país e as suas “entourages” familiares têm gerido os recursos do país através de complicados esquemas publico-privados, de tráfico de influencias e de abuso do poder, onde os beneficiados são sempre os mesmos, com a acumulação de colossais fortunas sem qualquer justificação nem mérito. Tudo a custa do “braga”. É de admitir que diante do grande receio que é a perda do poder no próximo pleito eleitoral, as elites governantes, se se mantiverem as actuais, tenham a partir de agora muito mais de cuidado e atenção na distribuição do rendimento nacional, colocando de lado um pouco do “trungungú” que tem vindo a caracterizar a sua gestão. O processo político angolano deverá evoluir assim, com o lastro das eleições pendurado nas anafadas fatiotas do poder (seja ele qual for) que desde logo vai emagrecer, começando por perder alguns quilos da sua arrogância petulante, para se tornar mais humilde, mais responsável e sobretudo mais próximo das desesperadas preces populares. De facto as eleições inauguram este ciclo virtuoso, que sem ter o condão de uma varinha mágica qualquer, vai pelo menos fazer os angolanos acreditar que é possível melhorar o país sem mendigar, nem esperar por envelopes e outras doações. Em pé de igualdade e sem mais pais, nem mães, nem tios da nação, os angolanos vão aprender a cobrar dos governantes as promessas não cumpridas com a sua consequente penalização política na hora do novo acerto de contas nas urnas. Passada a fase emocional que ainda marcou profundamente esta campanha, estamos certos que o voto, a curto prazo, passará a ser entendido como um cheque racional emitido por cada um de nós a ordem de um determinado concorrente e com um prazo limite para ser descontado, findo o qual um novo cheque terá de ser emitido. Deixará assim de haver cheques em branco como aconteceu até agora.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Credibilidade da média estatal é a grande derrotada antecipada

1-Não há nada na legislação eleitoral que obrigue os concorrentes e candidatos a encontrarem-se no mesmo espaço mediático para debaterem em público os seus projectos de sociedade ou para trocarem uns rancores e umas acusações. Como se sabe, há candidatos por este mundo afora, onde se realizam regularmente eleições, que não gostam sequer de participar em debates com os seus desafiadores, por se acharem superiores e por estarem convencidos que com tal contacto podem valorizar os adversários carentes de visibilidade. Durante os cerca de trinta dias de campanha eleitoral, os partidos e coligações estão apenas obrigados a preencher os seus tempos de antena, disponibilizados por lei na rádio e na televisão estatais. As rádios privadas se quisessem também poderiam transmitir os mesmos tempos de antena. Tendo em conta a realidade concreta de Angola, onde apenas circula um diário que é detido exclusivamente por capitais públicos, os tempos de antena deviam ser igualmente extensivos ao Jornal de Angola. No oficioso matutino apenas o MPLA tem garantido de forma indirecta o seu “cantinho das maldades” que tem vindo a ser produzido diariamente e de forma apócrifa sob o título “Tempo de Antena”. Comentários ou textos de opinião não assinados são um atentado aos fundamentos da bíblia jornalística em qualquer parte do mundo onde o jornalismo já não faz parte de outras opções, como a propaganda, a manipulação e a desinformação. Embora traiçoeiro pela forma como ataca, trata-se de um espaço muito bem elaborado, no estilo curto e grosso recheado de algum humor, com o desconhecido escriba de serviço a revelar performances que o identificam claramente como sendo alguém que já faz jornalismo (ou escreve para os jornais e revistas) há mais de trinta e cinco anos. Na sistemática destruição que tem perseguido dos restantes tempos de antena dos outros partidos e coligações, o “Tempo de Antena” do Jornal de Angola tem tido uma grande eficácia. Tem sido contundente. Demolidor. Com estes elogios todos, o seu autor vai ter provavelmente os reflexos das suas consequências num conhecido local da sua indumentária, que são os bolsos das calças se, entretanto, não usar casaco. Este desiderato arrasador é conseguido, antes de mais, porque o referido “Tempo de Antena” tem conseguido passar na “confusão”. O anonimato do seu autor, leva os leitores abaixo da média a pensarem que estão a consumir mais um texto informativo, como todos os outros disponíveis na página em que o corrosivo material está inserido. A legislação eleitoral é absolutamente contrária ao estabelecimento de qualquer discriminação entre as diferentes candidaturas, quer quanto ao tratamento jornalístico, quer quanto ao volume dos espaços concedidos. Atento à realidade angolana, o legislador criou uma norma de reforço para as publicações periódicas que sejam propriedade de entidades públicas, de modos a responsabilizá-las ainda mais, tendo em vista a observância de princípios como a equidistância, a isenção e a equidade. Como é evidente o “Tempo de Antena” do JA está-se nas tintas, está-se marimbando para estas e outras exigências da lei, até porque em “Tempo de Guerra” não se limpam as armas. 2- Apesar dos candidatos não serem obrigados nem por lei, nem por nenhuma federação qualquer, a participarem em debates públicos contraditórios, a comunicação social tem, entretanto, o dever ético e mesmo deontológico, de convencê-los com os melhores argumentos a participar em tais encontros em nome do esclarecimento da opinião pública que se prepara para votar. É o grande valor acrescentado que a comunicação social pode emprestar aos processos eleitorais, aliás, tem vindo a emprestar, recebendo em troca decisões muito mais equilibradas dos eleitores depois de saírem das urnas. Na prossecução dos seus fins, a radiodifusão em Angola tem o dever de contribuir para o esclarecimento, a formação e participação cívica e política da população através de programas onde o comentário, a crítica e o debate contribuam para a formação de opiniões conscientes e esclarecidas. Quem fala em radiodifusão, fala igualmente em radiotelevisão. Ora, por razões demasiado óbvias, é exactamente em tempo de eleições, tendo em conta a sua importância para o futuro de qualquer país democrático, que mais precisamos de ter os cidadãos conscientes e devidamente esclarecidos das opções existentes. Não é possível atingir-se este estado de “levitação” apenas com propaganda, com inaugurações, com carros de fumo e com megafones, com passeatas, com comícios e bebícios. É preciso que a informação disponível deixe de lado, por alguns instantes, o espectáculo (que prossegue dentro de momentos) para ser um pouco mais séria, tentando conhecer os concorrentes e os candidatos para além das “banhas da cobra” típicas das fanfarras eleitorais. Com o já falecido confrade francês Claude Julien, aprendemos que uma Nação “mal informada sobre si própria e sobre o seu lugar no mundo, caminhará sem inquietações para as piores desgraças. Não há democracia sem informação rigorosa e sem debate leal, incompatíveis com o espectáculo-rei que desnatura a informação e dissolve o Estado, a nação e a própria sociedade, tornada ignorante das solidariedades elementares, dos interesses mais essenciais, das aspirações mais legítimas”. 3-Em tempo de campanha que está já a viver os seus derradeiros dias, o balanço preliminar que já é possível fazer nesta altura, aponta claramente para a identificação do desempenho dos médias estatais, como tendo sido um dos principais focos de conflito e tensão desta campanha eleitoral, pela forma como fizeram todos os “trabalhos de casa” do MPLA. O conteúdo dos tempos de antena dedicados pelos principais partidos da oposição ao comportamento dos órgãos estatais sustenta, por si só, esta conclusão. Ninguém estava a espera do contrário, isto é, que os estatais alinhassem pelo diapasão de uma oposição dividida e pouco performante, salvo algumas excepções. Agora, também ninguém estava a espera que os médias estatais ultrapassassem todos os limites do decoro que deve ser observado em situações deste tipo. Foi o verdadeiro sexo explícito. Ganhe quem ganhar, o grande derrotado antecipado destas eleições já é a credibilidade da média estatal e o respeito dos seus profissionais.
Lamentavelmente, esta é a grande e dura verdade deste processo a marcar um desempenho que poderia ter sido muito menos controverso.
Aliás, parece-nos que o MPLA nem tinha necessidade de tantos e tão generosos tempos de atena não previstos na legislação eleitoral, o que de facto acabou por manchar a imagem da própria campanha, dando razão a todos os seus críticos.
Ainda estamos a digerir o argumento segundo o qual o MPLA esteve sozinho a batalhar contra os 13, durante os 29 dias de campanha, para justificar todos os "excessos" mediáticos cometidos, onde se destacam as toneladas de propaganda institucional do Governo, feita quer de forma directa, quer pela via da cobertura jornalística.
Em termos quantitativos o argumento não faz muito sentido, pois estamos diante de grandezas que se distanciam a olhos vistos, sobretudo ao nível da qualidade do produto mediático apresentado pelo MPLA e a Oposição.
Como comparar as pouco mais de três horas diárias, correspondentes ao conjunto dos "desgarrados" tempos de antena na rádio e na televisão dos 13 concorrentes da oposição, com toda a uma programação devidamente estruturada, no âmbito de uma mesma estratégia eleitoral?

A frase mais diplomática da campanha

"Nós não vamos ganhar, nós vamos esmagar os adversários"- Hermínio Escórcio, embaixador angolano algures no planeta terra.