segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Portugal mais democrático?

Os portugueses têm a partir de hoje uma nova realidade politico-partidária, sem dúvidas muito mais complexa que a anterior. Os Socialistas de Sócrates (SS) voltaram a vencer, mas desta vez não convenceram. Com menos de 37% dos votos, o PS vai precisar de negociar para poder governar. Negociar à direita ou à esquerda? Eis a questão! A esquerda no seu conjunto incluindo o PS tem mais de 54% dos votos expressos pelos portugueses. No day after deste pleito pode-se dizer que terminou o "socratismo" em Portugal após quatro anos de uma maioria absoluta que acabou por produzir uma intensa onda de contestação social e política a quase todos os níveis e que foi visível particularmente no confronto dos professores com a Ministra da Educação, que pode desde já dizer adeus ao cargo. Mas há mais, muito mais, em matéria de consequências políticas, como resultado destas eleições. Enquanto se aguarda pela nomeação do Primeiro-Ministro pelo Presidente da República, vamos certamente ver desfilar pela comunicação social local os mais diferentes cenários. Depois é que vão ser elas para José Sócrates que, tudo leva a crer, será o líder partidário a ser convidado por Cavaco Silva para constituir o próximo governo português.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Sócrates e Manuela em Santa Catarina aceleram o passo rumo a São Bento

Foi na principal artéria comercial da cidade do Porto, a via de Santa Catarina, que captámos ontem estas "borbulhantes" imagens referentes às campanhas do PS e do PSD. Hoje, segundo julgo saber, é o último dia da campanha, contando que amanhã sábado se observe o dia de reflexão.
A não ser que aconteça a maior surpresa de todos os tempos da vida política lusa, domingo os portugueses vão escolher ente José Sócrates e Manuela Ferreira Leite quem será o Chefe do Governo lisboeta para os próximos 4 anos.
Quanto a supresas, a esquerda (sem o PS) prepara-se para protagonizar uma delas que as sondagens já anunciam timidamente.
Definitivamente está garantido que não haverá maioria absoluta.
A responsabilidade desta previsão, que já é quase uma certeza, é da nossa exclusiva autoria, pelo que seremos um dos grandes derrotados deste pleito caso se venha a registar uma nova maioria absoluta, seja de quem for.
Sendo eu (até ver) um grande adversário em Angola da maioria absoluta, não poderia desejar uma sorte diferente aos meus amigos portugueses, embora saiba que as coisas por aqui se poderão complicar bastante, caso o PS venha a precisar dos votos mais à esquerda (PCP e BE) para poder formar um executivo com o mínimo de estabilidade.
Do outro lado, as coisas parecem ser mais facéis, caso o PSD venha a necessitar do apoio do CDS-PP para governar.
Neste contexto, Cavaco Silva terá, como é evidente, uma palavra importante a dizer, sendo (mais ou menos) certo que ele deverá viabilizar um governo de direita, caso se venha a registar o equilibrio previsto.
A ver vamos...

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Sócrates:Uma maioria absoluta a caminho do desconhecido

É já domingo que os portugueses vão escolher um novo Primeiro-Ministro, quatro anos depois de terem dado ao actual uma maioria absoluta para governar sem problemas de maior em matéria de estabilidade política.
Acontece que a dinâmica política portuguesa ultrapassou todas as expectativas, tendo rapidamente a anterior maioria conquistada nas urnas, sido substituída no quotidiano por uma contestação anti-governamental sem precedentes que se espalhou pela ruas e não só.
O "olímpico" Sócrates sai deste mandato com uma nova maioria popular recheada de muito descontentamento e bastante desemprego, enquanto aguarda com o coração nas mãos pelos resultados do próximo domingo, sem qualquer certeza, para quem há quatro anos havia cilindrado de forma tão convincente o seu principal adversário, o PSD do "trapalhão" Santana Lopes.
Portugal é hoje na visão de um dos mais influentes membros do mínusculo e conservador CDS-PP, um país europeu atípico, em virtude de, nas suas contas, mais de 20% do seu eleitorado se preparar para votar à esquerda.
Nas suas contas o PS não faz parte dessa esquerda que tanto o preocupa.
Tem toda a razão.
O PS é um caso de estudo a fazer lembrar-nos bastante o "nosso" MPLA.
Ele estava certamente a referir-se aos votos que serão destinados aos comunistas, aos bloquistas e tutiquanti se movimenta por aquelas bandas mais canhotas onde a identificação com a herança do velho Marx continua a ser o denominador comum.
PS- Tirei a fotografia do cartaz com a cara daquela que poderá vir a ser a nova Primeira Ministra de Portugal na cidade do Porto. O nariz de palhaço não faz parte da versão original do poster, tendo-lhe sido aplicado por algum brincalhão que anda por aí a fazer campanha paralela.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

JES-30 anos depois sem ainda ter enfrentado o seu maior desafio

Antes de qualquer outra consideração sobre a abordagem que me foi solicitada pela “A Capital” relativa ao já longevo consulado do Presidente José Eduardo dos Santos que este ano assinala o seu 30º aniversário, devo dizer que sou das pessoas que deixou de acreditar há muito tempo nas virtualidades de prolongadas permanências no poder seja de quem for, não importa o nível da hierarquia que esteja em apreciação, o regime político e muito menos o país ou a região. A bitola de avaliação é a mesma: O tempo desgasta. Mais concretamente, o meu (não) acreditar aqui tem a ver com a existência de vantagens para a colectividade que resultem de tais permanências, por mais que os aparelhos propagandísticos de serviço se esforcem de nos convencer do contrário, com mais diferentes e criativas analogias, como aquela que compara os políticos com o whsiky. Devo confessar que ideologicamente fui educado nas teses leninistas do partido único, onde o papel clarividente da vanguarda e do seu líder era inquestionável, era o núcleo duro da doutrina, o que abriu caminho para o tão famoso, quanto famigerado culto da personalidade. Não me esqueço do meu passado e das minhas convicções juvenis, mas como nunca tive qualquer capacidade de influenciar directamente os desastrosos rumos que este país seguiu, sinto-me, de algum modo, um elemento neutro em todas as makas que foram acontecendo por estas bandas e que bem poderiam ser evitadas se houvesse maior capacidade de prever o futuro, o que também deve ser um apanágio de quem está na política. Em Angola não foi. Depois de tudo quanto testemunhei e vivi, estou hoje mais convencido do que nunca que, na política (serviço público), o passar dos anos, a partir de certa altura, para além de outros inconvenientes que sobram para todos nós, começa a ser o maior adversário do titular que deseja eternizar-se no cargo que ocupa. Quanto mais anos se fica no poder, pior será o desempenho do titular em termos qualitativos, de aceitação e de lucidez. A lei do desgaste é inexorável, devendo ser ela a melhor conselheira de todos os políticos do país e do mundo. É preciso pois, mesmo quando não haja qualquer limitação legal do mandato, saber sair na melhor altura. No futebol, o Rei Pelé ensinou-nos a todos a saber sair por cima, mas nem todos, lamentavelmente, sobretudo nos campos da política, quiseram aprender com ele. Os resultados estão à vista de todos nos países onde o apego ao poder por parte dos titulares ultrapassou alguns limites aceitáveis. É bom notar que nos Estados Unidos só em 1951 é que foi aprovada a emenda constitucional que passou a limitar os mandatos do seu Presidente a duas candidaturas, o que quer dizer que o suposto homem mais poderoso do mundo, desde então, só pode ficar no “poleiro” oito anos. Nem mais um. Dito isto e olhando seguidamente para o consulado do Presidente José Eduardo dos Santos, trinta anos depois dele ter sido indicado pelo BP do MPLA-PT para substituir Agostinho Neto, fica implícito pelas nossas considerações iniciais, que o seu desempenho, ao fim de tantos anos de poder só pode, naturalmente, ter sido afectado pelo “vírus da longevidade política”, com todas as suas consequências que cada um de nós saberá identificar, sem termos necessidade de as estar aqui a identificar uma por uma. Está-se de facto diante de um “vírus” que ataca os seus portadores em função dos contextos políticos em que se movimentam, com resultados nem sempre iguais, embora na essência eles não se diferenciem muito nos seus aspectos menos positivos ou mais problemáticos. Trinta anos, é muito tempo de poder para a nossa concepção deste exercício político, com a agravante de estarmos a viver num país que não criou alternativas, começando pelo próprio MPLA que até agora não tem claramente definido aquele que será o sucessor de JES depois das várias experiências “delfinescas” mal sucedidas. Em termos mais concretos não é fácil olhar com olhos de ver para os últimos 30 anos de poder de José Eduardo dos Santos e muito menos tirar outras conclusões mais definitivas, para além daquelas que são evidentes e que têm a ver com o estado em que se encontra a nossa Angola de hoje. São estas evidências que, feitas algumas contas pouco consensuais, os seus mais entusiastas seguidores fazem questão de destacar no âmbito da campanha em prol da sua eternização no poder, que um polémico acórdão do Tribunal Supremo já fez questão de “legitimar”, concedendo a JES o direito de desfrutar mais três mandatos constitucionais ao abrigo do texto fundamental em vigor. Pela positiva, primeiro diríamos que JES teve o mérito de ser dos poucos líderes africanos, senão mesmo o único, que, apesar de ter chegado ao poder sem ter sido democraticamente eleito, não fez qualquer assalto ao mesmo, tendo a sua entronização resultado de um consenso dos seus companheiros de percurso. Por outras palavras, não houve qualquer golpe de estado na génese, algo suis generis do seu consulado, o que em África é, efectivamente, uma nota positiva que a história não deve ignorar. O mais interessante neste render da guarda é que ela terá sido mesmo feita contra a própria vontade pessoal de um JES com 37 anos de idade, facto que ele, por vezes, faz questão de recordar aos seus correligionários, quando se trata de serem chamados a assumirem responsabilidades que não desejam. Foi de facto e de jure uma transição absolutamente pacífica, numa altura em que, entretanto, o país já estava a ferro e fogo com uma devastadora guerra civil, com o envolvimento de poderosas componentes externas de ambos os lados da barricada da tragédia nacional. Na sequência dos contactos diplomáticos que Agostinho Neto já teria iniciado com a África do Sul, JES, segundo algumas avaliações, poderia ter encurtado drasticamente os dias do conflito, numa altura em que o Galo Negro ainda era um “pintinho”, o que certamente teria facilitado as negociações e poupado o país a tamanha devastação material e humana, caso o processo de paz tivesse arrancado na altura. JES nesta avaliação retrospectiva, quanto a nós, tem a seu favor, o facto relevante de não ter o seu nome ligado a monumental e sanguinária repressão que se seguiu aos acontecimentos do 27 de Maio de 1977, sem dúvida a mancha mais negativa que marcou a primeira República que ele herdou do “pai” Agostinho Neto. Ao que consta JES terá sido mesmo investigado pelos torcionários da época, um dos quais, que continua bem “vivinho da silva”, se referiu a ele nos últimos anos como sendo um “presidente frouxo”. JES teve a primeira etapa do seu consulado dominada pelo regime de partido único, pelo que não se lhe pode assacar directamente a responsabilidade de não ter democratizado o sistema, embora também não possa ser elogiado por, de algum modo, ter antecipado ou admitido esta possibilidade. Antes pelo contrário. JES, numa das suas declarações mais complicadas para a sua imagem, feita na primeira República, chegou a afirmar que os africanos não estavam preparados para viver em democracia. Alguns anos depois e já com o país a viver uma outra realidade política, JES viria a fazer um pronunciamento semelhante, salvaguardadas as devidas distâncias, quando declarou que a democracia e os direitos humanos não enchem a barriga de ninguém. Este “défice democrático estrutural” de JES é-lhe apontado permanentemente pelos seus críticos e adversários. Em 2003 numa das suas intervenções políticas mais bem estruturadas do ponto de vista da sua adesão aos princípios democráticos, JES apontou cinco desafios a vencer pelo MPLA que mantêm toda a pertinência e actualidade nos dias de hoje, particularmente pelo muito que ainda há por fazer rumo à efectiva democratização do país. “1. A consolidação da Paz, que engloba a promoção da reconciliação nacional e a reconstrução do país; 2. A consolidação da Democracia e do Estado de Direito e o respeito pelos Direitos Humanos; 3. A boa governação, que se traduza numa gestão eficiente e transparente da despesa pública e na utilização racional e sustentável dos recursos humanos, tendo no seu epicentro o cidadão angolano, as suas aspirações individuais e colectivas; 4. A redução da intervenção directa do Estado na economia, em troca do reforço do seu papel regulador, propiciando o crescimento económico sustentável, o aumento da riqueza nacional e o combate ao desemprego e à fome; 5. As relações políticas e económicas regionais e internacionais que lhe garantam estabilidade e desenvolvimento.” JES acrescentou que “a consolidação da paz e da democracia traz implícita a legitimação periódica dos órgãos de soberania, o que nos leva a reconhecer como justa e a subscrever a inquietação que sido expressa quanto ao futuro das eleições gerais no país”. É fácil identificar no percurso discursivo de JES uma trajectória não muito linear e coerente, havendo mesmo a registar algumas contradições gritantes no seu discurso. É o que dá discursar durante 30 anos. É de facto um grande risco político. Com todas as críticas que se possam fazer ao seu percurso e que são mais do que muitas e depois de ter vencido e derrotado todos seus adversários e inimigos, o “campeão” JES enfrenta agora o seu maior desafio de sempre nas pistas conflituosas de um país que ainda não se reencontrou. Sair agora e bem por cima ou continuar no poder por mais 15 anos, isto é, até aos 82 anos, sem saber muito bem como vai lá chegar e como depois deverá sair e ser recordado. Receamos que JES venha a escolher a segunda opção. (Com a assinatura de Reginaldo Silva este texto foi solicitado e publicado pelo semanário "A Capital")

domingo, 20 de setembro de 2009

(Flashback/Setembro 2007) Grupo de Trabalho da ONU sobre detenções arbitrárias visita Angola

Seja o que for que terá motivado a visita deste grupo de trabalho internacional, desde logo a sua presença em Angola não é, de todo, uma boa notícia para a imagem do Governo em particular e do Estado angolano de uma forma mais geral. Seria sem dúvida uma notícia ainda mais desastrosa para esta imagem, no ano em que o Governo se “matriculou” pela primeira vez no novo Conselho dos Direitos Humanos da ONU, se o Executivo de Sua Excelência não emitisse os competentes vistos de entrada para os cinco membros independentes deste grupo. Uma tal recusa disfarçada com outros condimentos mais diplomáticos já havia acontecido num passado recente com o Relator Especial da ONU para as questões da habitação condigna, de acordo com uma denúncia feita na altura pela combativa ong SOS-Habitat. Abrimos aqui um parêntese para dar a conhecer a quem ainda não sabe, que o responsável da SOS-Habitat, o Luís Araújo, terá sido, segundo as nossas fontes, aconselhado a gozar umas merecidas férias além fronteiras. Isto, para evitar que algo de mais grave lhe possa acontecer ao esqueleto, do tipo esgotamento físico-mental, como resultado da sua actividade ao serviço dos direitos humanos. Esta profissão (activista cívico) voltou a ser de alto risco entre nós, sobretudo agora com a nova “guerra” das terras urbanas e rurais que já é um facto, enquanto se aguarda pela autorização do Parlamento para que a mesma possa ser oficialmente declarada. Nesta “guerra” que ainda esta semana nos trouxe notícias dramáticas de uma batalha realizada no Quifica, lá para as bandas do Benfica, de um lado estão os pobres que, desesperadamente, se querem urbanizar nas fronteiras das grandes cidades com destaque para Luanda. A tendência para a urbanização, com a consequente desertificação das zonas rurais é mundial e já há muito pouco a fazer para a contrariar. A Cidade do México fala bem deste êxodo. Na outra trincheira, está a classe média alta e os ricos que têm do seu lado o camartelo do Governo e das administrações locais por força dos interesses convergentes dos seus dignitários e respectivas famílias preocupados em não permitir que a mancha ameaçadora da pobreza e da exclusão social se aproxime muito das suas habitações e dos seus luxuosos condomínios que estão a ser erguidos a todo o vapor na cintura peri-urbana da capital. Nas zonas rurais a situação é igualmente complicada com o “assalto” às terras ancestrais dos indígenas, sendo nesta altura o município do Waku Kungo um dos principais palcos desta movimentação “bélica”. Em Angola, o conceito marxista-leninista da luta de classes volta assim a fazer todo o sentido, cerca de 20 anos depois do PT ter sido “substituído” por um EME- social-democrata, entenda-se, completamente aburguesado. É por estas e por outras, que os mais ácidos detractores da estratégia governamental, estão cada vez mais convencidos que o Executivo em vez de eliminar a pobreza conforme se tinha comprometido, achou que era mais eficaz e prático combater directamente os pobres para acabar rapidamente com aquele flagelo social que não dignifica em nada o novo membro da OPEP, que se prepara para fixar a sua quota em dois milhões de barris por dia. A confirmar-se a existência esta estratégia é evidente que ela, para além de não resolver rigorosamente nada, só vai complicar ainda mais a já de si precária estabilidade que se vive em Angola, a antecipar cenários de violentos confrontos sociais, conforme tem vindo a alertar o Frei João Domingos nos seus sermões dominicais dirigidos especialmente aos nossos “peixes trungungeiros”. É pena que ninguém lá de cima ouça, com olhos nos ouvidos, este pregador a clamar no deserto de um país que se está a desumanizar a cada dia que passa, por força da ganância e da avidez, que se vão certamente reforçar com o aproximar das eleições, como sendo os dois principais valores da actual nomenklatura. É lamentável que os (nada) católicos membros do Governo se estejam a marimbar para tantos e tão sérios avisos à sua navegação. Aqui fica mais um deste vosso pregador… Mas voltemos à notícia da visita do Grupo de Trabalho da ONU sobre Detenções Arbitrárias que, segundo a nota de imprensa que nos foi enviada pela Celeste, terá tido início na passa terça-feira com uma duração prevista de 10 dias. Considerando que este Grupo desde a sua criação em 1991 só visitou dois países africanos (Africa do Sul e Guiné-Equatorial) sendo Angola o terceiro, é de admitir que o mesmo esteja na posse de informações muito preocupantes sobre a situação da privação da liberdade em Angola. Sintomáticas destas preocupações, estão as deslocações do Grupo às províncias de Cabinda e da Lunda-Norte (Dundo), duas regiões do país de onde, para além de Luanda, nos têm chegado mais (e más) notícias sobre violações dos direitos humanos. É de admitir igualmente que o mediático caso Miala tenha sido a gota de água que fez transbordar o copo do Grupo aconselhando-a a deslocar-se o mais rapidamente possível a Angola. No meio de todas estas preocupações ressalta como nota menos negativa, a aparente disponibilidade das autoridades, patente no programa da visita do GT, em dialogar com os especialistas das Nações Unidas, o que não poderia ser de outra forma, depois das novas responsabilidades internacionais que o Governo assumiu este ano. É evidente que só no final desta pouco confortável visita será possível, com base nas constatações dos cinco “turistas”, ter uma ideia mais exacta de como decorreu a sua missão em terras angolanas que tem na agenda um leque bastante variado de contactos, onde se incluem visitas a prisões, centros de detenção para estrangeiros e hospitais psiquiátricos. Como membro do Conselho da ONU para os Direitos Humanos, o espaço de manobra do Governo nesta matéria está agora muito mais apertado. Depois dos louros diplomáticos colhidos com a eleição para aquele organismo internacional, o Governo só agora se terá apercebido que o conteúdo da carta de compromisso voluntário que subscreveu, como condição de entrada, é mesmo para cumprir.

Morreu o Ndunduma!

Todos quantos me conhecem e conheceram o Ndunduma, sabem que a minha relação com o defunto era péssima, resultado de uma história complicada que já tem mais de 30 anos e que teve inicio na redacção do Jornal de Angola, nos idos de 1977, quando eu dava os primeiros passos na profissão e ele era o todo poderoso Director do "nosso Pravda".
Não vou aqui recordar esta história, nem a ocasião é propícia para um tal exercício de memória, que já tive a oportunidade de fazer noutras ocasiões, tendo o mesmo acontecido com ele.
As versões das duas histórias sempre foram muito pouco convergentes e pelos vistos vão continuar a ser.
Quis a mesma história dos nossos desencontros e confrontos que me encontrasse nesta altura em Portugal, onde Ndunduma veio a falecer.
Se acreditasse noutros valores, talvez ficasse por aqui a falar um pouco sobre o significado desta coincidência.
Como não acredito, pouco mais tenho a acrescentar a esta nota fúnebre, escrita num domingo de manhã a olhar de uma janela da casa onde me encontro para a nebelina que envolve a cidade do Porto, depois de ter sabido da notícia da sua morte.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Mais de uma semana sem poder blogar

Nos últimos dias não consegui blogar, porque as autoridades chinesas não permitem que a facilidade da Google disponibilizada para os devidos e superiores efeitos possa ser utilizada no seu imenso e superpopuloso território. Por outras palvras, todas as tentativas (e foram mais do que muitas) que fiz para aceder a este blog a partir da China Popular foram pura e simplesmente anuladas pela poderosa "grande muralha" tecnológica que Beijing montou à volta da liberdade de expressão. Viva o Camarada Mao! (No ano do 60º aniversário da Revolução que se assinala no próximo dia 1 de Outubro) PS- Já tinha lido algures que era assim que as coisas (não) funcionavam na República Popular da China (RPC), mas não há nada melhor (para quem ainda acredita no jornalismo) do que confirmar as informações no terreno dos factos. Como devem imaginar não foi exactamente para isso que fiz uma viagem de cerca de 16 horas, com uma paragem no Dubai. De notar que Youtube também "não funciona" na RPC, estando a acontecer o mesmo com o Facebook. (Aeroporto de Istanbul (Turkia) a caminho de Lisboa)

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

(Flashback-Setembro 2007) Um país (ou um governo?) especializado em "fritar" os seus bófias

O actual e super-mediático “caso Miala” que ainda está longe de ter chegado ao fim (apesar da condenação já decidida pelo marcial tribunal do Juiz Patónio) é apenas a comprovação de uma tendência que também tem marcado a vida deste país, desde que Angola deixou de ser portuguesa, já lá vão mais de 30 anos. Ao abrigo desta tendência dificilmente os homens da bófia têm conseguido sobreviver às crises conjunturais que o país vem conhecendo, onde eles inicialmente têm um papel determinante, com um aparente e total controlo da situação. Foi certamente o caso emblemático do 27 de Maio de 1977, uma altura em que o país esteve durante cerca de três anos sob controlo quase directo do poder absolutamente discricionário da DISA. As consequências desastrosas e sangrentas desta intervenção draconiana dentro da ditadura mais geral que o país vivia na altura são sobejamente conhecidas. Os principais responsáveis da secreta da época foram afastados dos seus cargos, após a extinção daquele repressivo organismo. Nenhum deles, entretanto, foi julgado ou condenado, apesar de todos os abusos e excessos que são acusados de terem cometido contra cidadãos a quem nunca foi dado o mínimo direito à defesa. Seja como for, todos eles perderam o imenso e incontrolável poder de vida ou de morte que então possuíam. Tendo igualmente por pano de fundo excessos e abusos, anos depois no processo 105 relacionado com tráfico de diamantes, a sorte dos bófias que conduziram esta “ofensiva” já foi diferente para pior. Os mais importantes foram julgados e condenados a “pesadas” penas de prisão que terão cumprido no Bentiaba. Há certamente vários outros casos que ao longo da nossa trajectória atribulada tiveram por protagonistas poderosos chefões da bófia que depois provaram do seu próprio veneno, na sequência dos excessos praticados. Claramente esta tendência que se mantém até aos dias de hoje, aponta para a sucessiva queda em desgraça dos “nossos” bófias, entenda-se no caso vertente, agentes que trabalham para a polícia política do regime, entre chefes e kabolas, por sinal todos eles muito parecidos uns com os outros na truculência dos métodos utilizados ao longo das últimas três décadas, onde se inclui o recurso sistemático à tortura. Actualmente, é bom notar, já se sente um esforço, ainda que muito tímido, orientado para a despartidarização da segurança de estado em Angola. Uma despartidarização que só será sustentável, se for acompanhada pela consequente e imprescindível democratização de todo o sistema, que agora tem a pomposa e inofensiva designação legal de “comunidade de inteligência angolana”, curiosamente, desde que Fernando Garcia Miala assumiu a liderança do sistema em 2002. Uma liderança que chega ao fim num banco dos réus e com a perspectiva nada simpática do mesmo vir a passar os próximos quatros anos na cadeia, na sequência da anunciada condenação. A esperança de ver esta pena reduzida ou mesmo anulada está agora num recurso que deverá ser decidido pelo mais alto magistrado da nação, no âmbito da sua competência constitucional de indultar e comutar penas. Já imaginaram o Presidente JES a exercer este poder, mandando FGM e os seus pares em paz para casa depois de toda esta “insubordinação”? É bom que comecem a pensar nesta hipótese, pois a lei assim o permite, considerando que indulto também significa perdão. Para quem conheceu de perto a famigerada e já extinta DISA, como nós, de facto não poderia ser mais “pacifica” a denominação encontrada (comunidade de inteligência) para fazer esquecer o tenebroso passado de uma intervenção cuja trajectória real, possivelmente, nunca será contada e muito menos documentada, por mais comissões internacionais que se criem para elaborar a história de Angola. A mais recente reuniu-se esta semana em Luanda. Esta democratização passa, nomeadamente, pela fiscalização política de todo o sistema, uma competência que a lei atribui a Assembleia Nacional através de um Conselho de Fiscalização integrado por cinco deputados eleitos de acordo com o princípio da proporcionalidade, por maioria absoluta dos Deputados presentes e no âmbito funcional da Comissão competente da Assembleia Nacional. Pelo que julgamos saber este Conselho nunca foi eleito, estando a lei que o criou em vigor já lá vão mais de cinco anos. Sem pretendermos aqui entrar no âmago do processo que conduziu Miala e os seus pares à desgraça no seio do regime que serviram, numa altura em que novas “teses” explicativas (de proveniência oriental) têm sido postas a circular pela imprensa, estamos certos que todos os famosos bófias que passaram pela história deste país acabaram por ser vítimas do excesso de poder que a dada altura lhes foi conferido. De uma outra coisa estamos igualmente certos: esse excesso de poder não lhes foi conferido nem pelos eleitores, nem por nenhum consenso nacional mais abrangente. Tudo se passou, tudo foi cozinhado, nos corredores mais chegados à principal fonte do poder em Angola, onde as coisas normalmente começam bem (no beijinho-beijinho), mas nem sempre terminam da mesma forma, aliás, quase nunca terminam, para não variar. Com as suas particularidades próprias, Angola é sem dúvida mais um país onde os seus bófias mais emblemáticos têm acabado na frigideira do próprio regime. Em termos históricos mais contemporâneos, a desgraça dos bófias parece ter começado com um tal de Béria na antiga União Soviética. Laverenty Béria foi o homem mais poderoso a seguir ao sanguinário Joseph Stalin. Reza a história que em Julho de 1953, já no regime de Nikita Krutchev, Béria foi detido e processado por "actividades criminosas contra o partido e o Estado". Condenado, Beria seria executado em Dezembro do mesmo ano. É acusado de perseguir e violentar mulheres. O seu nome causava terror às pessoas. Era responsável por um laboratório onde eram produzidos venenos para ser usados contra seus inimigos. Alguns historiadores acusam-no de ter assassinado o próprio Stalin. Nos Estados Unidos o patrão do FBI durante cerca de 50 anos (1924-1972), John Edgar Hoover, veio-se a revelar uma verdadeira fraude, após ter servido oito presidentes. Praticamente intocável durante sua longa carreira, no final de sua vida passou a ser alvo de duras críticas por parte de vários sectores da sociedade norte-americana. Na década de 60 passou mais tempo a vigiar os telefones de congressistas e a perseguir líderes do movimento negro e comunista do que a combater criminosos de delito comum. Chegou-se mesmo a conclusão que Hoover terá sido um dos grandes aliados da Máfia. Por tudo quanto fica aqui dito e pelo muito mais que haveria para dizer sobre esta problemática, estamos convencidos que crises do género vão continuar a verificar-se entre nós, enquanto o “sub-sistema da bófia” não prestar contas ao país, de acordo com as exigências da própria lei. Aos “nossos” bófias queremos desejar-lhes mais sorte no futuro e mais calma com a bola, sobretudo quando pensarem que já dominam completamente o jogo.