1-Não há nada na legislação eleitoral que obrigue os concorrentes e candidatos a encontrarem-se no mesmo espaço mediático para debaterem em público os seus projectos de sociedade ou para trocarem uns rancores e umas acusações.
Como se sabe, há candidatos por este mundo afora, onde se realizam regularmente eleições, que não gostam sequer de participar em debates com os seus desafiadores, por se acharem superiores e por estarem convencidos que com tal contacto podem valorizar os adversários carentes de visibilidade.
Durante os cerca de trinta dias de campanha eleitoral, os partidos e coligações estão apenas obrigados a preencher os seus tempos de antena, disponibilizados por lei na rádio e na televisão estatais.
As rádios privadas se quisessem também poderiam transmitir os mesmos tempos de antena.
Tendo em conta a realidade concreta de Angola, onde apenas circula um diário que é detido exclusivamente por capitais públicos, os tempos de antena deviam ser igualmente extensivos ao Jornal de Angola.
No oficioso matutino apenas o MPLA tem garantido de forma indirecta o seu “cantinho das maldades” que tem vindo a ser produzido diariamente e de forma apócrifa sob o título “Tempo de Antena”.
Comentários ou textos de opinião não assinados são um atentado aos fundamentos da bíblia jornalística em qualquer parte do mundo onde o jornalismo já não faz parte de outras opções, como a propaganda, a manipulação e a desinformação.
Embora traiçoeiro pela forma como ataca, trata-se de um espaço muito bem elaborado, no estilo curto e grosso recheado de algum humor, com o desconhecido escriba de serviço a revelar performances que o identificam claramente como sendo alguém que já faz jornalismo (ou escreve para os jornais e revistas) há mais de trinta e cinco anos.
Na sistemática destruição que tem perseguido dos restantes tempos de antena dos outros partidos e coligações, o “Tempo de Antena” do Jornal de Angola tem tido uma grande eficácia. Tem sido contundente. Demolidor.
Com estes elogios todos, o seu autor vai ter provavelmente os reflexos das suas consequências num conhecido local da sua indumentária, que são os bolsos das calças se, entretanto, não usar casaco.
Este desiderato arrasador é conseguido, antes de mais, porque o referido “Tempo de Antena” tem conseguido passar na “confusão”.
O anonimato do seu autor, leva os leitores abaixo da média a pensarem que estão a consumir mais um texto informativo, como todos os outros disponíveis na página em que o corrosivo material está inserido.
A legislação eleitoral é absolutamente contrária ao estabelecimento de qualquer discriminação entre as diferentes candidaturas, quer quanto ao tratamento jornalístico, quer quanto ao volume dos espaços concedidos.
Atento à realidade angolana, o legislador criou uma norma de reforço para as publicações periódicas que sejam propriedade de entidades públicas, de modos a responsabilizá-las ainda mais, tendo em vista a observância de princípios como a equidistância, a isenção e a equidade.
Como é evidente o “Tempo de Antena” do JA está-se nas tintas, está-se marimbando para estas e outras exigências da lei, até porque em “Tempo de Guerra” não se limpam as armas.
2- Apesar dos candidatos não serem obrigados nem por lei, nem por nenhuma federação qualquer, a participarem em debates públicos contraditórios, a comunicação social tem, entretanto, o dever ético e mesmo deontológico, de convencê-los com os melhores argumentos a participar em tais encontros em nome do esclarecimento da opinião pública que se prepara para votar.
É o grande valor acrescentado que a comunicação social pode emprestar aos processos eleitorais, aliás, tem vindo a emprestar, recebendo em troca decisões muito mais equilibradas dos eleitores depois de saírem das urnas.
Na prossecução dos seus fins, a radiodifusão em Angola tem o dever de contribuir para o esclarecimento, a formação e participação cívica e política da população através de programas onde o comentário, a crítica e o debate contribuam para a formação de opiniões conscientes e esclarecidas.
Quem fala em radiodifusão, fala igualmente em radiotelevisão.
Ora, por razões demasiado óbvias, é exactamente em tempo de eleições, tendo em conta a sua importância para o futuro de qualquer país democrático, que mais precisamos de ter os cidadãos conscientes e devidamente esclarecidos das opções existentes.
Não é possível atingir-se este estado de “levitação” apenas com propaganda, com inaugurações, com carros de fumo e com megafones, com passeatas, com comícios e bebícios.
É preciso que a informação disponível deixe de lado, por alguns instantes, o espectáculo (que prossegue dentro de momentos) para ser um pouco mais séria, tentando conhecer os concorrentes e os candidatos para além das “banhas da cobra” típicas das fanfarras eleitorais.
Com o já falecido confrade francês Claude Julien, aprendemos que uma Nação “mal informada sobre si própria e sobre o seu lugar no mundo, caminhará sem inquietações para as piores desgraças. Não há democracia sem informação rigorosa e sem debate leal, incompatíveis com o espectáculo-rei que desnatura a informação e dissolve o Estado, a nação e a própria sociedade, tornada ignorante das solidariedades elementares, dos interesses mais essenciais, das aspirações mais legítimas”.
3-Em tempo de campanha que está já a viver os seus derradeiros dias, o balanço preliminar que já é possível fazer nesta altura, aponta claramente para a identificação do desempenho dos médias estatais, como tendo sido um dos principais focos de conflito e tensão desta campanha eleitoral, pela forma como fizeram todos os “trabalhos de casa” do MPLA.
O conteúdo dos tempos de antena dedicados pelos principais partidos da oposição ao comportamento dos órgãos estatais sustenta, por si só, esta conclusão.
Ninguém estava a espera do contrário, isto é, que os estatais alinhassem pelo diapasão de uma oposição dividida e pouco performante, salvo algumas excepções.
Agora, também ninguém estava a espera que os médias estatais ultrapassassem todos os limites do decoro que deve ser observado em
situações deste tipo.
Foi o verdadeiro sexo explícito.
Ganhe quem ganhar, o grande derrotado antecipado destas eleições já é a credibilidade da média estatal e o respeito dos seus profissionais.
Lamentavelmente, esta é a grande e dura verdade deste processo a marcar um desempenho que poderia ter sido muito menos controverso.
Aliás, parece-nos que o MPLA nem tinha necessidade de tantos e tão generosos tempos de atena não previstos na legislação eleitoral, o que de facto acabou por manchar a imagem da própria campanha, dando razão a todos os seus críticos.
Ainda estamos a digerir o argumento segundo o qual o MPLA esteve sozinho a batalhar contra os 13, durante os 29 dias de campanha, para justificar todos os "excessos" mediáticos cometidos, onde se destacam as toneladas de propaganda institucional do Governo, feita quer de forma directa, quer pela via da cobertura jornalística.
Em termos quantitativos o argumento não faz muito sentido, pois estamos diante de grandezas que se distanciam a olhos vistos, sobretudo ao nível da qualidade do produto mediático apresentado pelo MPLA e a Oposição.
Como comparar as pouco mais de três horas diárias, correspondentes ao conjunto dos "desgarrados" tempos de antena na rádio e na televisão dos 13 concorrentes da oposição, com toda a uma programação devidamente estruturada, no âmbito de uma mesma estratégia eleitoral?