1-Em Angola copiamos muita coisa que vem do Brasil, incluindo o sotaque e o“português mal falado” dos seus mais de 100 milhões de habitantes, sendo neste último e linguístico caso, os seus mais fiéis seguidores, os prosélitos locais da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD).
Saravá!
O que não copiamos, sobretudo ao nível das instituições que integram o aparelho governativo angolano, são as boas práticas de gestão da coisa pública que já vão fazendo escola no Brasil de Lula, a marcar uma diferença substancial com o passado recente daquele gigante latino-americano.
Como estamos em tempo de eleições e por que, de facto, são mais do que muitos os reparos que estão a ser feitos ao desempenho das entidades que exercem o poder público em Angola no seu relacionamento com os partidos políticos concorrentes, gostaríamos de salientar que a legislação eleitoral brasileira não permite a nossa “confusão”, que é total e absoluta.
As normas de conduta brasileiras são completamente alérgicas à forma como está a ser praticado entre nós o “desporto” eleitoral.
Os brasileiros sabem, por exemplo, que “durante a campanha, está proibida a propaganda institucional ou oficial. Entende-se que nem a autorização, nem a própria propaganda podem ocorrer nesse período”.
Os brasileiros sabem ainda que está igualmente proibida “a distribuição gratuita de bens e serviços públicos em beneficio de candidato em ano de eleição; não se proíbe a distribuição regular de bens e serviços (merenda escolar, livros didácticos, campanha do leite, vacinações, assistência judiciária gratuita, etc), mas sim o uso promocional e político.
Os brasileiros sabem tudo isto e muito mais em nome de um bem jurídico-constitucional altamente protegido que é “a igualdade na eleição” e que teve como consequência a definição de um conjunto de condutas vedadas aos agentes públicos em campanha eleitoral.
O primeiro destes agentes é o Presidente da República, é aquele que deve dar o exemplo.
Tais condutas são actos bem definidos na lei e que se caracterizam pelo abuso do poder político, pela exploração da máquina administrativa ou de recursos estatais em proveito de uma candidatura.
2-Importa referir que o nosso Código de Conduta Eleitoral também tem disposições suficientes (embora muito genéricas) para fazer face ao “caos” que se instalou por estas bandas, ao ponto de alguém já ter afirmado que houve mais concorrentes do que aqueles que foram licenciados pelo Tribunal Constitucional (TC).
Em causa está, em primeiro lugar, o activo e decisivo papel desempenhado na campanha eleitoral pelo Presidente da República a favor do partido que tem na liderança e no coração, seguido das mega-toneladas de propaganda institucional do governo e complementado pela “cobertura jornalística” dos médias estatais, num verdadeiro golpe de misericórdia contra a oposição. Uma oposição que não esteve bem nesta estreia, mas que, por melhor que estivesse, dificilmente poderia fazer face a uma ofensiva tão poderosa e tão bem combinada e articulada por parte do partido governante.
Com estas observações que são objectivas, não se pretende diminuir, de forma alguma, o valor e a abrangência nacional da campanha eleitoral que o MPLA levou a cabo no terreno dos comícios e bebícios, das passeatas, das farras, das maratonas, dos contactos porta-a-porta, corpo-a-corpo e mesmo boca-a-boca, como alguém, possivelmente, equivocado já se referiu.
Seja como for o contacto boca-a-boca pode ser até recomendável para quem de facto queira aprofundar um pouco mais a intimidade com os eleitores, que de facto precisam de sentir mais de perto o bom ou mau hálito dos concorrentes e das suas promessas após tantos anos de ausência.
Algumas delas, cheiram claramente a esturro, não sendo sequer necessário o contacto boca-a-boca com o proponente para identificar a sua halitose, o que, entretanto, não é entendido da mesma forma pelos eleitores mais permeáveis à propaganda e aos apelos emocionais, que acabam por ser a maioria.
Isto mesmo diante de algumas evidências que ultrapassam qualquer capacidade técnica, humana e política disponível de as concretizar pelo menos em Angola, a não ser que haja eleições todos os anos. Aí sim, talvez fosse possível. Talvez…
É aí que, para efeitos de esclarecimento dos eleitores, devia entrar um outro candidato não licenciado pelo TC chamado debate publico contraditório, que acabou por ser o grande ausente desta campanha.
3-Excluído o grande empurrão dado pelo seu líder nas vestes de Presidente da República e de Chefe de Governo, com a sua impressionante maratona de inaugurações e comícios um pouco por todo o país, a campanha do MPLA em termos mobilizativos, foi de longe, mas mesmo muito de longe, superior a de todos os restantes concorrentes juntos, incluindo a UNITA.
Para esta diferença abissal terá certamente contribuído, para além naturalmente do vigor da sua mensagem, o imenso poderio financeiro do partido da situação, que não tem qualquer comparação possível com a pequenez e mesmo insignificância dos restantes concorrentes, incluindo a UNITA.
Como se sabe a actividade política em tempo de campanha eleitoral é particularmente exigente em matéria de recursos financeiros.
Não é de todo despiciendo afirmar que sem dinheiro não há qualquer possibilidade de se ganhar uma eleição, por mais justas e pertinentes que sejam as nossas ideias e as nossas críticas ou por mais desastroso que tenha sido o desempenho do partido no poder.
Talvez também por aí se perceba melhor o apelo algo paternalista de JES feito no Huambo, para que os restantes partidos tenham paciência, no sentido de entenderem que estas eleições ainda não são para eles. Talvez as próximas, admitiu.
O problema central de qualquer campanha eleitoral não são as ideias e os projectos. A questão fundamental acaba por ser técnico-material; é como fazer chegar a nossa mensagem a milhões de pessoas em muito pouco tempo. Só com meios poderosos, muitos meios e muitos recursos se pode chegar lá.