segunda-feira, 6 de abril de 2009
TPA em directo em nome do rigor, da objectividade e do pluralismo
1-Como é evidente, só podemos estar de acordo (e bastante entusiasmados) com a possibilidade de termos a partir de agora a TPA e a sua concorrente, a TV/Zimbo, a transmitirem em directo os grandes acontecimentos nacionais, numa perspectiva editorial que seja suficientemente inclusiva do ponto de vista político.
Isto, para não termos os dois canais apenas preocupados com as reuniões do partido no poder ou do governo.
Se for por aí, de muito pouco ou quase nada adiantará, porque em abono da verdade até já vamos tendo alguns directos a partir daqueles dois (eternos) centros de poder.
O que todos desejamos, pelo menos nós os que achamos que a independência da imprensa é fundamental como garante da sua própria liberdade, é que a partir de agora e depois do show do Papa, as nossas televisões decidam as transmissões em directo apenas em função da importância jornalística dos factos/acontecimentos e da sua capacidade técnica de os realizar.
Com o show que foi a cobertura televisiva da visita do Papa a Angola, a TPA mostrou que de facto já tem capacidade técnica para utilizar o directo à semelhança do que há muito já o fazem as rádios.
Abrimos aqui um parêntese para referir que só agora tivemos conhecimento de uma informação sobre a preparação da visita do Papa que nos deixou algo perplexos em relação às motivações da cobertura televisiva.
É que, de acordo com a tal informação, a transmissão em directo de todos os grandes momentos da visita papal pode ter sido uma exigência do Vaticano para se evitarem eventuais deturpações da mensagem do Papa Bento XVI.
A notícia que é da Angop, tem a ver com o conteúdo de um encontro realizado no CIAM, alguns dias antes da chegada do Papa, entre o Padre Moisés Malumbu e os jornalistas.
Nesse encontro foi dado a conhecer pelo sacerdote que a Televisão Pública de Angola (TPA) iria assegurar a transmissão em directo dos encontros do Papa para todo Mundo.
“Durante o encontro realçou a importância da Comunicação Social na difusão da mensagem do Papa Bento XVI. Chamou atenção para o uso da palavra, enquanto instrumento fundamental da actividade jornalística, uma vez que a simples alteração ou utilização da palavra errada poderá alterar o conteúdo da mensagem. Na sua abordagem referiu-se ao facto da extensão do conceito de neutralidade jornalística, enquanto alguém que vive um facto ou entra em contacto com algumas informações. Isto, apesar da chamada agressividade positiva, aspecto que leva o jornalista a busca de elementos novos, características deste enquanto comunicador”.
Estas considerações atribuídas pela Angop ao Padre Moisés Malumbu encerram uma mensagem que tem uma crítica profunda a actividade jornalística que gostaríamos de procurar entender melhor.
Nesta altura já não é possível este entendimento porque para além de não termos ouvido a versão original das declarações de Moisés Malumbu (em directo), a sua transmissão (em deferido) pecou gravemente por defeito e por falta de rigor.
Com efeito, o jornalista não teve o cuidado de reproduzir as palavras (fazendo as devidas citações) do Padre, conforme recomendam as melhores regras da escrita jornalística.
É aconselhável nestes casos que as declarações sejam colocadas entre aspas para se saber exactamente o que é que foi dito pelo nosso interlocutor e o que é que saiu da lavra do jornalista para compor o texto final.
Só por este exemplo vê-se claramente a importância da transmissão em directo dos factos quando em causa está a actividade jornalística, particularmente no contexto angolano.
Pelo conteúdo das preocupações manifestadas pelo Padre Malumbu ficou suficientemente claro que o Vaticano não tinha muita confiança no tratamento que viesse a ser dispensado à mensagem do Papa pela TPA, caso ele não fosse feito em directo.
Foi o que aconteceu com todos os elogios (merecidos) que hoje se fazem ao desempenho do canal público.
2-Depois da visita do Papa Bento XVI, gostaríamos de poder afirmar que o directo passará a ser um recurso normal como meio de cobertura noticiosa ao serviço de um jornalismo televisivo mais rigoroso, objectivo e plural que é o que todos defendemos, embora nem sempre estejamos de acordo em relação, sobretudo, a questões como o equilíbrio, nomeadamente no que toca à selecção das matérias mais politico-partidárias que vão preenchendo os telejornais.
Por vezes chega a ser escandaloso o excesso da atenção dispensada a tudo quanto diga a respeito ao MPLA, ao seu Governo e a todos seus "satélites" a fazer lembrar-nos mais tempo do monopartidarismo, do que a nova realidade multipartidária que se vive de facto e de jure em Angola.
O que nos entusiasma, por exemplo, é termos a partir de agora a TPA a transmitir em directo a sessão de abertura de um congresso da oposição ou de uma demolição de casas da população alegadamente construídas sem autorização da administração.
Entusiasma-nos igualmente a possibilidade de voltarmos a ter o parlamento em directo, pelo menos com a transmissão dos seus debates mais importantes que seriam comentados na hora por um painel de analistas e especialistas de origens diversas, para termos o principio do contraditório sempre bem presente e como auxiliar fundamental no esclarecimento da opinião pública.
Desde logo e em primeiro lugar debate sobre o OGE, mas haverá certamente vários outros temas igualmente relevantes que seriam identificados em função da agenda parlamentar.
Sinceramente, não percebemos qual é a dificuldade de enveredarmos por esta via num regime democrático que tem a estabilidade política do nosso, com a esmagadora maioria do partido governante que se conhece.
Sinceramente, não entendemos que a TPA tenha ignorado o recente apelo do Conselho Nacional de Comunicação Social nesse sentido ao optar por não fazer a mínima referência à parte da sua deliberação onde esse aspecto era posto em evidência.
Depois de ter entrevistado o musico Yanick Gombo, também não entendemos que a TPA tenha passado ao largo da referência feita na mesma deliberação à necessidade de espaços de diálogo idênticos serem desenvolvidos na comunicação social com outros representantes da jovem música urbana de protesto que tem no rap e no kuduru as suas principais expressões.
De facto até entendemos, só que…