segunda-feira, 30 de julho de 2012

Na expectativa (ainda) do debate entre JES e os seus desafiadores*



Das duas vezes que os angolanos foram chamados às urnas, em 1992 e 2008, não houve qualquer debate directo/televisivo entre os concorrentes, tendo as campanhas eleitorais sido marcadas por esta ausência que foi para mim o elemento que mais me chamou a atenção. Obviamente, pela negativa.
Acho que o debate entre os candidatos é fundamental para o esclarecimento dos eleitores e para a sua própria mobilização a fim de se evitarem as taxas elevadas de abstenção, embora este mérito da mediatização não seja tão líquido assim. Acredito, contudo, que nas condições de Angola uma campanha eleitoral com debates directos entre os seus protagonistas é sem dúvidas muito mais mobilizadora que uma outra onde esta componente esteja ausente.
Por via desta omissão, em 1992 o país perdeu a grande oportunidade de ser testemunha do primeiro grande debate político entre José Eduardo dos Santos (JES) e Jonas Malheiro Savimbi, numa altura em que de facto era da maior importância fazer o levantamento das causas do desastre que Angola tinha conhecido desde a sua ascensão à independência.
Causas e consequências, sem os angolanos imaginarem que o pior ainda estava para vir.
Este debate acabou por nunca acontecer na sequência de todas as atribulações que o processo político então conheceu, com o regresso de uma guerra ainda mais devastadora ao quotidiano dos angolanos e que culminou com o próprio desaparecimento físico de Savimbi em 2002.
Dezasseis anos depois da realização das primeiras eleições, em 2008 o país foi novamente convocado para acertar as suas diferenças com recurso às urnas e aos votos, mas o debate entre os candidatos voltou a não acontecer.
Já havia certamente outras condições, muito melhores quem 1992 do ponto de vista da coabitação política entre os inimigos que, entretanto, já tinha sido “promovidos” a adversários, mas todo este ambiente mais favorável não foi suficiente para reuni-los à mesma mesa do debate.
Aproximam-se agora a passos cada vez mais rápidos as terceiras eleições, pois é já na próxima semana que a campanha eleitoral propriamente dita tem início com a duração de um período de 30 dias.
Apenas para alimentar alguma expectativa, diremos que (ainda) é possível que desta vez JES desça do seu cadeirão para aceitar o debate que lhe é proposto e que certamente todos os outros oito candidatos estão interessados e de que maneira.
Em abono da verdade poucos acreditam nesta possibilidade, onde não estamos incluídos.
Poucos imaginam ver JES a ser confrontado pelos seus desafiadores em pé de igualdade e sem nenhum limite para além daqueles que decorrem dos princípios da boa educação e do respeito pelo próximo.
Para sermos mais directos nesta abordagem, diríamos que muito dificilmente JES aceitaria um debate político, por exemplo com Isaías Samakuva, apesar de todos os trunfos que possui para atacar ou contra-atacar o seu principal adversário.
A ideia dos estrategos dos candidatos aparentemente mais fortes é que a sua presença num debate em pé de igualdade, tendo em conta a sua grande visibilidade, beneficia sempre os aparentemente mais fracos.
Acho que é esta a razão, entre várias outras onde se incluem as de caracter mais pessoal, que irá uma vez mais desaconselhar JES a participar em qualquer confronto mediático com os seus adversários.
Desde logo está projectada uma campanha eleitoral sem grande substancia, com base na propaganda e em acusações e contra-acusações e sem grandes possibilidades do eleitorado ser convencido com os necessários e mais esclarecedores argumentos de razão, sobre a bondade ou a clarividência de cada um dos nove candidatos e respectivos partidos.
Em nosso entender não deveria haver resistências da parte de ninguém à organização deste tipo de encontro que é sempre uma iniciativa concertada dos médias, pelo conhecimento que tenho de outras realidades democráticas mais consolidadas e mais transparentes.
Uma iniciativa que só pode ir para frente se os concorrentes/candidatos estiverem interessados pois a lei (pelo menos a angolana) não os obriga a participarem em debates televisivos.
No caso de Angola sou das pessoas que defende, um pouco inspirado pelo que se passa no futebol, que a lei devia ser mais exigente, isto é, que os participantes nas eleições deveriam ser obrigados a participar num debate televisivo do tipo todos contra todos em modalidades a definir.
Como o xadrez partidário angolano tem estado a evidenciar uma tendência para a sua redução até nem haveria muitos problemas práticos com a organização deste tipo de confronto político-mediático.
Angola, lamentavelmente, ainda não faz parte deste outro mundo onde eu vou buscar os exemplos mais positivos, o que de algum modo se entende por todas as contingências que o país tem vivido nestas últimas três décadas e meia.
Entende-se, com algumas dificuldades, pois às vezes fica-se com a impressão que as pessoas que se refugiam no tempo para justificar alguma lentidão/marasmo do processo, nos querem dizer que o país precisa de ter os mesmos anos de paz que teve de guerra, até conseguir acertar o passo com uma dinâmica mais consentânea com a urgência do momento, a evidência de algumas situações e as boas práticas internacionais.
* Este texto foi publicado sexta-feira última, na edição para Angola do semanário "O Sol"