(...)
2-"Mantida em relativo silêncio, a ganância no entanto pauta cada vez
mais as nossas vidas. Há pessoas que são tão viciadas nela como outros são
na heroína ou na liamba. Quanto mais riqueza têm mais querem ter,
açambarcando verdadeiros latifúndios agrários ou amamentando grupos
económicos tentaculares, os chamados polvos da nossa economia. As
notícias publicadas sobre o assunto pecam por defeito, mas o que vai
aparecendo é suficiente para se detectarem as ramificações e associações
entre os diferentes centros desses poderosos predadores que um dia saíram
do nada para a fortuna, abocanhando tudo o que seja tragável, isto é, que dê
lucros, de preferência imediatos. Porque a ganância torna o indivíduo
sôfrego e apressado, treinado na arte de somar mentalmente com rapidez,
deixando poucos traços ou pistas evidentes no terreno. Se a ganância se
tornou num traço característico da humanidade, o que receio acontecer,
então não há alternativa e estamos votados à catástrofe, terminando por darcabo do planeta Terra e de toda a vida no seu interior."
(...)
3-"Um marcador que serve para comparar os países em função das diferenças entre as partes do sistema social é o chamado índice de Gini, que em Angola, segundo um estudo, atingiu em 2005 a taxa de 0,62. Este número revela uma das mais fortes diferenciações sociais do mundo. Quer dizer, os ricos são muito ricos e os pobres muitíssimo pobres. É resultado da tal ganância que leva alguns a
enriquecerem a qualquer custo. Para esses, a ética é o mesmo que moldar
estrelas em galáxias distantes, algo de absolutamente estranho e absurdo.
Quer dizer, precisamos de imprimir ética no mercado e nos mercadores. O
estado e todas as instituições criadas para o efeito têm de se preocupar com
a necessidade de os processos sociais seguirem normas, expressas por leis,
de alto rigor. E que os cidadãos, quaisquer que sejam, não só cumpram asleis mas se sintam honrados por as cumprir. Isso é ética."
[Extractos da Oração de Sapiência proferida na Universidade Agostinho Neto por Artur Pestana (Pepetela) na abertura do novo ano académico do ensino superior (13/03/09)]