domingo, 15 de março de 2009
Os engarrafamentos, a saúde pública e o canteiro de obras
1-A semana passada um dos ouvintes que participou no debate de quarta-feira promovido pela LAC disse algo com o qual eu estou inteiramente de acordo.
O cidadão em causa afirmou que os engarrafamentos que se processam em Luanda já são um problema de saúde pública.
Um grave problema de saúde pública acrescentaria eu, algo surpreendido com a perspicácia deste analista do nosso quotidiano.
Adiantou o mesmo ouvinte que diante da nova epidemia, é necessário adoptarem-se medidas que tenham em conta a gravidade da situação sanitária criada com os engarrafamentos.
Que medidas serão essas, se é que ainda existe alguma possibilidade técnica de fazer frente ao flagelo que todos os dias ameaça a nossa estabilidade e nos retira paulatinamente o mínimo de qualidade de vida a que temos direito.
De facto já não se trata de uma simples analogia este casamento dos engarrafamentos com a degradação da saúde das pessoas. É real.
Pelas suas consequências é mais do que evidente que os engarrafamentos já estão a afectar de forma particularmente grave a saúde de uma parte muito considerável dos largos milhões de luandenses (quantos seremos nesta altura?) que por aqui sobrevivem, com a nossa atenção dirigida particularmente aos mais novos, às crianças.
Restará agora os especialistas apurarem até que ponto o “stress” produzido pelas intermináveis horas no trânsito para percorrer meia dúzia de quilómetros todos os dias, está a atacar (e de que forma) o estado de saúde dos infelizes habitantes desta desgarrada metrópole.Antes de mais e para os efeitos que estamos aqui a discutir é importante referir que na definição da OMS saúde é muito mais do que a ausência de dor ou mal-estar físico.
Saúde para OMS “é o estado de completo bem-estar físico, mental e social, não consistindo somente da ausência de uma doença ou enfermidade.”
Com base nesta definição não parece haver qualquer dúvida quanto ao facto dos engarrafamentos estarem a prejudicar gravemente a saúde dos luandenses, sendo para já difícil determinar a extensão e a profundidade dos estragos.
Depois da cólera e da raiva, temos agora os engarrafamentos numa devastadora linha de ataque que está a levar-nos ao desespero completo.
Como se sabe, os engarrafamentos trazem consigo um aumento acentuado da criminalidade o que significa dizer perigo de morte para qualquer um de nós e a qualquer altura, como resultado dos repetidos ataques dos “nossos” predadores que estão cada vez mais violentos e cruéis, como se estivessem a celebrar a conquista de uma cidade que os hostiliza, que não lhes dá emprego, que não lhes dá futuro.
Não será exactamente este o caso de Luanda?
As violações das virgens do Cassequel do Buraco e os constantes assaltos que as casas de algumas ruas daquela comunidade são alvo por parte de conhecidos meliantes (vizinhos) falam bem desta fúria destruidora que não encontra adversários a altura, embora as prisões estejam a abarrotar e todas as semanas a policia nos apresente mais umas dezenas de delinquentes.
Cadeias super-lotadas e criminalidade em flecha, é uma realidade que nos deixa ainda mais preocupados, por mais que a polícia nos queira sossegar com as suas estatísticas positivas que falam de um recuo das acções delituosas e de um aumento dos casos esclarecidos.
No nosso modesto entender, isto quer dizer que os “soldados do crime” têm mais substitutos do que se poderia imaginar, muitos mais mesmo, que até causa arrepios fazer projecções.
2-Não aceitar o relacionamento da saúde pública com os engarrafamentos e passar a vida a dizer, como tristes e irritantes papagaios, que o governo está a trabalhar para melhorar a vida das pessoas, é fazer tudo menos jornalismo.
Já aqui o dissémos há umas semanas na crítica que fizémos ao “jornalismo de ressonância”. Voltamos a dizê-lo hoje para destacar que o balanço das obras públicas em Luanda em termos de impacto na solução dos problemas das populações é negativo, é decepcionante, é preocupante.
É um balanço que não nos pode deixar contentes o que seria o nosso grande desejo, embora, também já aqui o dissémos, não sejamos daqueles que fazem festas ou passam a vida a agradecer o governo por estar apenas a cumprir com as suas obrigações, com a utilização de recursos que a todos pertencem.
Os monumentais engarrafamentos deste ano (ainda só com meia dúzia de chuvas) estão a ser muito mais violentos e sufocantes do que os do ano passado, o que quer dizer que as tais obras e os tais canteiros não estão a resultar, como era suposto.
Quanto mais tempo, vamos ter de esperar?
Depois de já se terem passado alguns anos desde que as primeiras intervenções começaram a ser feitas nas estradas principais, secundárias e terciárias da província de Luanda, a capital deveria apresentar este ano um outro aspecto em matéria de circulação rodoviária que é fundamental, que é estratégica para a vida de qualquer metrópole.
O que assistimos nos dias que passam é que tudo se está a agravar em matéria de circulação de pessoas e bens, como se tivéssemos voltado aos tempos da guerra transportada agora apenas para Luanda.
Tudo e mais alguma coisa, ao ponto de termos a cidade paralisada várias vezes nos últimos tempos, o que nos anos anteriores não acontecia com tanta frequência.
Diante deste quadro e perante tendências que não são nada animadoras neste e noutros domínios da vida dos luandenses, só resta preparar para o pior, ir buscar as últimas resistências ao baú das nossas esperanças e perguntar até quando vamos continuar nesta passada.
Alguém disse que as chuvas são o único fiscal que os empreiteiros não conseguem enganar.
Acrescentaria eu que os engarrafamentos são, nesta altura, o único partido da oposição que o Governo teme realmente, contra o qual os seus cerca de 82% do eleitorado conquistado em Setembro do ano passado, pouco ou nada valem.
E não valem, porque estão quase todos bloqueados pelos mesmos engarrafamentos.