Como é evidente, estamos longe de partilhar desta avaliação climática, embora reconheçamos alguns progressos no nosso boletim meteorológico que já não tem nada a ver com o passado. Lamentavelmente, ainda continuam a chover neste país demasiados canivetes e picaretas contra os direitos fundamentais da pessoa humana, o que já não deveria acontecer.
Lamentavelmente e o que é mais grave, a própria legislação quando não é omissa, acaba por estar em desacordo com a constituição em matéria de liberdades e direitos fundamentais.
É o caso da Lei das Associações, fortemente atacada pelo vírus da inconstitucionalidade. Enquanto ela não for revista, quem de direito pode ilegalizar quem quiser e quando bem lhe apetecer. É só a associação descontente abrir o bico para protestar que leva logo com um cartão vermelho, porque a norma diz que tais organizações podem ser livremente constituídas, mas não podem utilizar como seu instrumento de trabalho um direito fundamental que é a liberdade de expressão. Ponto final. Paragrafo.
Pela sua postura abertamente crítica em relação ao comportamento das autoridades na região de onde é originário, o Sr. Fufuta não é bem uma flor que os círculos oficiais deste país gostem de cheirar muitas vezes ao dia.
E quando tal acontece, o que se passa é que a tal flor deixa imediatamente de poder cheirar os microfones da comunicação social pública, melhor dizendo, da comunicação social governamental. Há muito que o Sr. Fufuta é persona non grata.
Toda a gente sabe disso, começando pelo próprio, que é certamente um angolano que aprendeu rapidamente a conferir todo o valor ao pluralismo informativo, como um dos pilares mais sólidos da liberdade de imprensa.
Graças ao pluralismo, este país já não tem só uma rádio, um jornal e uma televisão. Graças a ele, o Sr. Fufuta vai continuando a falar e a defender a sua causa, quer o governo goste dele, quer não.
Depois de ter ouvido o Conselho Nacional de Comunicação (CNCS) criticar a comunicação social pública em Fevereiro deste ano por estar a silenciar os partidos da oposição e as sensibilidades mais críticas da sociedade civil, o Sr. Fufuta decidiu testar o Conselho apresentando-lhe em Abril uma queixa contra a RNA e o Jornal de Angola por “fechamento deliberado”.
Por falta de provas o Sr. Fufuta perdeu a acção intentada contra a média estatal, mas conseguiu que o CNCS reafirmasse na sua deliberação o direito que os cidadãos têm de fazer ouvir a sua voz através da comunicação social.
“Sem entrarmos exactamente no mérito da queixa, afigura-se importante referir que à luz das obrigações legais que impendem sobre os meios de comunicação social públicos, constitui conduta reprovável o alegado “fechamento deliberado” como aponta a Associação de Apoio para o Desenvolvimento da Baixa de Cassange, ao comportamento da midia estatal.
Saliente-se que todos os órgãos de comunicação social têm a responsabilidade social de “informar o público com verdade, independência, objectividade e isenção, sobre todos os acontecimentos nacionais e internacionais, assegurando o direito dos cidadãos à informação correcta e imparcial”, (alínea b) do artigo 11º da Lei n. 7/06, de 15 de Maio). O mesmo artigo na sua alínea c) refere ainda que a imprensa deve “assegurar a livre expressão da opinião pública e da sociedade civil”.
Para além disso o Sr. Fufuta conseguiu ainda que o CNCS voltasse “a recomendar aos órgãos de comunicação social que tenham em devida conta, à luz das obrigações legais, o dever de ouvir todas as sensibilidades e sectores da nossa sociedade sempre que em causa estiver a salvaguarda do interesse público.”
O interesse público, é bom que fique claro, não é apenas assumido ou defendido pelo governo como à primeira vista se poderia supor.
A permanente lavagem cerebral por intermédio dos “choques mediáticos” a que estamos sujeitos reforça igualmente esta ideia de exclusividade.
Quantos e quantos governos já não foram pelo ralo abaixo exactamente por estarem contra o interesse público, fazendo prevalecer os interesses particulares da sua nomenklatura.
Salvaguardar o interesse público também é, por exemplo, “promover a boa governação e a administração correcta da coisa pública”.
É igualmente “assegurar a livre expressão da opinião pública e da sociedade civil”.
Aparentemente derrotado, apenas por razões técnicas, o Sr. Fufuta acaba por ser um exemplo que importa seguir e destacar.
Com o Sr. Fufuta aprendemos uma vez mais que neste país, calados, para além de não mamarmos também não vamos a sítio e muito menos contribuímos para que os poderes públicos se democratizem.
A democratização da média estatal continua a ser um grande objectivo em Angola que ainda está muito longe de ter sido alcançado e que às vezes, até parece que se está a distanciar a grande velocidade, quanto mais nos aproximamos dele.
Dá para entender?