Nos últimos dias passou por nós um “furacão” chamado Marcelo Rebelo de Sousa, com todas as credenciais académicas e políticas que fazem dele uma referência permanente em Portugal, particularmente nos últimos tempos, desde que passou a envergar a indumentária de comentarista residente da RTP aos domingos.
Em Luanda, Marcelo Rebelo de Sousa não deixou de fazer o seu habitual programa que é conduzido pela jornalista Inês Flor Pedrosa.
Depois de ter passado em revista os grandes temas da sempre agitada política portuguesa, agora com José Sócrates a ser acusado pelos ingleses de também partilhar as mesmas convicções dos angolanos em relação a grande utilidade particular da “lei da gasosa”, Marcelo falou de Angola. Não podia deixar de o fazer ou não se chamasse ele Marcelo Rebelo de Sousa.
Do que disse, com as suas atenções concentradas nas mediáticas movimentações de capitais angolanos pela praça portuguesa, chamou a nossa atenção as preocupações que manifestou em relação a sustentabilidade da actual estratégia que para ele, segundo deixou entender, tem muito pouco ou quase nada de empresarial.
É este contorno demasiado politizado do actual investimento angolano em Portugal, segundo Rebelo de Sousa, que mais tem irritado os portugueses que desconfiam das reais intenções de Luanda.
A grande preocupação de Marcelo tem a ver com a continuidade desta estratégia numa situação em que o Presidente José Eduardo dos Santos deixe de fazer parte da mobília, possibilidade que ele admitiu como sendo absolutamente normal e inevitável, tendo, naturalmente em conta, a nossa condição de passageiros desta vida por mais anos que nos consigamos manter de pé, a respirar e a trabalhar.
Claramente Marcelo disse no passado domingo à RTP que esta é a questão mais sensível que se coloca ao futuro do investimento angolano em Portugal, considerando que todas as actuais movimentações empresariais (publicas e privadas) se fazem debaixo do guarda-chuva presidencial.
A ter em conta os montantes envolvidos nas “passeatas financeiras” que vão acontecendo aqui e acolá, onde até já se fala da entrada no capital do semanário lisboeta “Sol”, está-se de facto diante de uma grande “umbrela”.
Marcelo não disse mas quase que dizia.
Marcelo não disse que todo o actual projecto em terras portuguesas deixará de existir subitamente numa situação em que JES desapareça de cena.
Marcelo de facto não disse isso, mas todos nós, que acompanhamos esta e outras andanças, sabemos que a música poderá mudar rapidamente numa situação em que o actual Maestro deixe ou entregue a batuta ao seu sucessor.
Chamou por isso (nesta sequência) a nossa atenção a recente preocupação de um outro analista, desta feita um conhecido observador local, que no seio da sua “grande e opaca família” tem brilhado pela frontalidade com que nos últimos tempos lida publicamente com alguns tabus do seu partido que acabam, entretanto, por afectar ou condicionar a vida de todo o país.
Estamos a falar de João Melo (JM) para quem tudo (o futuro) está excessivamente dependente da agenda pessoal do Presidente Eduardo dos Santos.
O analista acabou por desafiar publicamente a direcção do MPLA “a ter capacidade de abordar internamente essa questão, com toda a objectividade e responsabilidade histórica”.
Essa questão chama-se sucessão.
Para JM, “se o Presidente quiser voltar a candidatar-se, contará com todo o apoio do partido. Mas, se não quiser, precisa, desde logo, de discutir isso francamente com a direcção do MPLA, definindo um timing e uma metodologia que salvaguardem, acima de tudo, a estabilidade do país, tão árdua e dificilmente conquistada”.
Nos primeiros palpites que debitamos este ano por estas bandas, referimos que
o debate proposto por José Eduardo dos Santos sobre a eleição do Presidente da República veio introduzir no processo uma grande dose de incerteza, pois agora já ninguém sabe quais são os planos da principal força política deste país e muito menos do seu líder, que parece ter uma agenda muito própria no âmbito da estratégia mais geral do maioritário.
Por exemplo, os potenciais candidatos às presidenciais estão sem saber o que fazer, enquanto não for aprovada a nova Constituição, onde será definida a modalidade da eleição, que pode ser por via parlamentar ou por sufrágio directo e universal, de acordo com a sugestão implícita na proposta de debate.
Tudo agora está dependente das novas ideias que o MPLA vai introduzir no texto fundamental. Ao que parece, já não são as mesmas que defendia durante o anterior processo constituinte.
Com este debate, o futuro do próprio Presidente José Eduardo dos Santos voltou a ser tema para as mais diferentes especulações, embora os seus correligionários continuem a matraquear na tecla do candidato natural.
Dino Matrosse, o Secretário-Geral do MPLA disse que esta semana que seu partido vai realizar este ano o seu Congresso ordinário, que deveria ter acontecido o ano passado.
Talvez todas as preocupações aqui manifestadas e outras que circulam por aí venham a ser respondidas neste Congresso.
O mais certo, porém, é que fiquemos esclarecidos muito antes do conclave do maioritário, pois em nosso entender tudo, em princípio (as grandes incógnitas), deverá ficar resolvido com a adopção da nova constituição.
2009 será assim o ano em que, definitivamente, o país ficará a saber se vai ou não contar com José Eduardo dos Santos para os próximos tempos.
Não é, contudo, de excluir, na eventualidade do próximo candidato presidencial do MPLA não se chamar JES, que o próprio não encontre uma outra solução para dirigir a sua própria sucessão, no âmbito de um processo de transição absolutamente controlado por ele.