terça-feira, 2 de agosto de 2011

A maka das escutas telefónicas

Luanda – O recente caso das escutas telefónicas ilegais na Grã-Bretanha e que levou ao encerramento do secular tablóide “News of the World (NW)”, do império jornalístico de Rupert Murdoch, reabre o debate sobre as limitações que a lei e ética impõem ao jornalismo.

A opinião foi emitida hoje (terça-feira), em Luanda, pelo jornalista Reginaldo Silva, em entrevista à Angop que visou abordar o escândalo de escutas telefónicas ilegais que para além de encerrar o jornal, levou a morte do jornalista que denunciou o facto.
O escândalo também provocou as demissões do chefe da Scotland Yard (polícia judiciaria) Londres e a de Andy Coulson, um assessor do primeiro-ministro britânico, David Cameron.
Para Reginaldo Silva, “sendo já ponto assente que a utilização das escutas telefónicas por parte dos jornalistas é formalmente proibida por lei e pela ética, tal barreira não pode impedir-nos de questionar o impacto desta limitação, diante de algumas situações, como aquelas que atentam gravemente o interesse público”.
Membro do Conselho Deontológico do Sindicato de Jornalistas Angolanos (SJA), o jornalista admite não conhecer, “por razões ligadas às limitações deontológicas da profissão, nenhum código que permita expressamente que os jornalistas façam recurso a escutas para obterem informação”.
Porém, questiona a fonte, “no conflito entre a busca da verdade e a ética, qual seria a atitude mais correcta do ponto de vista jornalístico se, numa dessas escutas, o jornal tivesse conhecimento que estava em marcha um plano que colocava em risco a vida da Rainha da Inglaterra”.
Por outro lado, Reginaldo Silva chama a atenção para o facto da lei que proíbe as escutas telefónicas sem mandato judicial, “ser sistematicamente violada pelos próprios governos”.
Por isso, prosseguiu o entrevistado, muitos escândalos políticos tiveram origem na “intromissão abusivas de governos e autoridades policiais na esfera privada da vida dos cidadãos”.
O jornal “News of the World” foi publicado pela última vez em 3 de Julho, na sequência do escandalo das escutas telefónicas ilegais, em que quatro mil pessoas foram vítimas do procedimento do tablóide.
O escândalo iniciou em 2006, quando uma fuga de informação permitiu saber que alguns jornalistas do News of the World recorriam às escutas para interceptar comunicações de famosos, como mensagens nas caixas de entrada de celulares, para conseguir assim exclusivas, e desde então começou a ser investigado pela Polícia.
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Para mais pormenores sobre o que penso deste caso, leia a seguir o texto que elaborei sobre o assunto e que serviu de base ao despacho da Angop.
Os métodos em causa podem não ter ferido e, antes pelo contrário, terão mesmo ajudado bastante a apurar a verdade dos factos reportados pelo NW. Imaginemos que numa dessas escutas o NW tivesse conhecimento que estava em marcha um plano qualquer para matar a Rainha da Inglaterra. Qual seria a atitude mais correcta do ponto de vista jornalístico?

Como resultado de tais escutas, os jornalistas normalmente ficam na posse de importantes pistas que lhes permitem desencadear uma investigação mais exaustiva sobre um determinado assunto.
Eu não conheço as matérias publicadas pelo NW, pelo que fica difícil avaliar qual foi o tratamento dispensado pelo tablóide às informações que obteve com tal recurso menos convencional/ilegal.
Definitivamente, tais recursos não são os mais recomendáveis, pelo que não é por aí que o jornalismo de investigação deve seguir o seu rumo independente, embora hoje já se aceite que, por exemplo, os jornalistas utilizem câmaras ocultas para produzirem reportagens em meios mais hostis/criminosos.
Em nome da salvaguarda e defesa do interesse público esta e outras situações não são tão pacíficas como aparentam ser, pois cada vez mais o jornalismo tem contribuído para a moralização da sociedade e para a denúncia de situações gravemente lesivas do interesse nacional.
Primeiro, as escutas sem mandato judicial não são permitidas por causa das limitações impostas pela própria lei num Estado de Direito. Por razões ligadas às limitações deontológicas da profissão, não conheço nenhum código que permita expressamente que os jornalistas façam recurso a escutas para obterem informação necessária ao seu trabalho.
É bom que se faça aqui notar, a lei em causa que proíbe as escutas telefónicas sem mandato judicial, é sistematicamente violada pelos próprios governos.
Angola não foge a este universo, pelo que é conversa corrente, embora as autoridades façam questão de desmentir tais rumores, sempre que eles surjam.
Quantos escândalos políticos por mundo fora, não tiveram na sua origem esta intromissão abusiva dos governos/policias na esfera privada da vida dos cidadãos?
Acho que há aqui um espaço muito interessante de debate.
Sendo para já ponto assente que a utilização das escutas telefónicas por parte dos jornalistas é formalmente proibida por lei e pela ética, tal barreira não pode impedir-nos de questionar o impacto desta limitação diante de algumas situações mais concretas, com destaque para aquelas que envolvem atentados graves do interesse público.
O grande problema tem a ver com a gestão desse tipo de informação quando chega ao conhecimento dos jornalistas.