terça-feira, 31 de março de 2009

Jornal de Angola poderia ter prestado um melhor serviço público

O Jornal de Angola publicou na sua edição de 28 de Março um suplemento com os três discursos que o Presidente José Eduardo dos Santos fez durante a visita do Papa a Angola. A iniciativa editorial do JA só seria louvável se o suplemento fosse abrangente, isto é, se desse à estampa o conjunto de todos os discursos proferidos no decorrer da memorável jornada. Como se sabe, o Papa Bento XVI proferiu em Luanda oito discursos, sete dos quais podem ser consultados no site da Rádio Vaticano: Discurso despedida de Angola Discurso aos movimentos para a promoção da mulher Alocução antecedente à oração mariana do Angelus Homilia da missa de domingo com bispos da IMBISA, em Luanda Discurso no encontro com os jovens, em Luanda, na tarde de sábado A homilia do papa na missa de sábado de manhã, em Luanda Discurso de boas-vindas a Angola O oitavo discurso, considerado o politicamente mais relevante, foi proferido no salão nobre do Palácio da Cidade Alta no dia da sua chegada. Como não sabemos quais são os planos do Jornal de Angola, aqui estamos nós a encorajar a sua direcção para nos brindar proximamente com um segundo suplemento que seria dedicado às intervenções do ilustre visitante, com as quais os angolanos de todas as latitudes e matizes têm certamente muito a aprender e a reflectir. Em nome da cortesia a iniciativa do Jornal de Angola, permitam-nos o reparo, deveria ter priorizado os discursos do Bispo de Roma. Como ainda nada está perdido, vamos aguardar, de preferência sentados, que o Director-Geral do diário governamental leia este apontamento e defira o nosso pedido em nome da mesma "Paixão pela imprensa" que é o lema das Edições Novembro, a empresa proprietária do Jornal de Angola.

domingo, 29 de março de 2009

Tentar entender o “anti-preservativismo” do “fundamentalista” Bento XVI

Sou das pessoas que apesar de não ter nada contra o uso do preservativo (antes pelo contrário), compreendo perfeitamente as preocupações de Bento XVI que nesta sua primeira deslocação ao continente africano limitou-se a reiterar a orientação católica segundo a qual a utilização da camisinha só agrava o problema da propagação da pandemia. Estamos, obviamente, a falar do SIDA e de todas as suas consequências trágicas que já se contabilizam na ordem dos milhões de mortos. O paradoxo desta concordância é aparente. Compreendo Bento XVI numa perspectiva de marketing, tendo por referência o caso de Angola, quando se começou a utilizar em força os médias como o principal instrumento da campanha preventiva que entre nós arrancou há já uns anos com o famoso e estrondoso “Curte Legal!”. De facto e durante bastante tempo, a campanha teve como único suporte a utilização do preservativo a qualquer hora do dia ou a qualquer momento da noite, o que quanto a nós não terá ajudado grandemente na inversão das preocupantes tendências de propagação da doença. Claramente a mensagem da campanha na mente dos jovens destacava (e continua a destacar) em primeiro lugar a banalização da apetecível actividade sexual que deixava de ter qualquer risco desde que fosse feita com a utilização da camisinha (marca Legal). Curtir não é exactamente namorar na base do beijinho e do farfalho por mais ousadas e profundas que as carícias possam ser. Curtir é um apelo directo. É ir para a cama com a parceira ou com o parceiro, se houver um leito por perto, porque também se pode curtir de pé, sentado, em cima da mota, dentro do carro ou na areia da praia. Num continente em que a prioridade continua a ser o controlo do avanço exponencial da epidemia, pior conselho aos jovens não poderia ser dado do que através deste afrodisíaco “Curte Legal!”, provado que está que é, sobretudo, pela via sexual que o vírus ganha todos os dias e todas as noites, novos militantes para a sua causa fatal. É nesta movimentação rumo ao abismo que entendemos todo o pragmatismo contido na condenação de Bento XVI, embora não tenha sido com esta intenção que ele voltou a excomungar a camisa. O Papa disse que o uso da camisa só agrava o problema do SIDA e de facto, temos de concordar que em termos de prevenção a solução (se é que existe alguma) tem de passar antes mais pelo dito sexo responsável o que choca abertamente com o provocante, mobilizador e rebarbativo “Curte Legal!”. Há de facto bastante pragmatismo nas palavras de Bento XVI que deveriam ser aproveitadas para se corrigirem as campanhas de prevenção que ainda insistem na camisinha como sendo o único instrumento de protecção. Felizmente que em Angola os “comunicólogos” já começaram a introduzir o conceito do sexo responsável e mesmo da abstinência nas campanhas, mas ainda sem a avassaladora força mediática da camisinha que continua a dominar a mensagem preventiva que chega até aos jovens e em relação a qual eles observam uma maior receptividade, pelo menos aparentemente. Em termos de orientação o grande desafio estratégico das campanhas de prevenção está agora em tornar a ideia do sexo responsável tão atractiva quanto a que foi a do uso da camisinha. É um desafio difícil (missão impossível III) que deve contudo ser colocado bem em cima da mesa de que tem a responsabilidade de orientar a sociedade nesta luta de vida ou de morte. O seu resultado tem que ser, contudo, bem visível nos out-doors e nos spots de rádio e televisão. As misses têm de deixar de andar por aí a abanar as camisinhas em tudo quanto é canto (a fazer lembrar-nos as kinguílas com o seus maços de notas) para passarem a mexer com outros valores, com outros conceitos. De facto não é muito fácil representar a ideia do sexo responsável, mas os criativos em marketing existem para alguma coisa. Por isso e por muito mais não me junto desta vez aos coros de protesto que se ouviram em todo o mundo em relação à mais recente declaração de Bento XVI sobre o (não) uso da camisinha. A minha “benevolência” não é, obviamente, extensiva à postura assumida pelo Arcebispo do Recife e de Olinda de condenação do aborto que a menina de 13 anos teve de fazer no Brasil para evitar a sua provável morte, após ter ficado grávida de gémeos do seu padrasto que a violentava praticamente desde a nascença. Fiquei sem perceber muito bem qual foi a posição de Bento XVI em relação a este caso específico. A confirmar-se que ele, lá da sua Santa Sé, caucionou a referida excomunhão no longínquo sertão brasileiro, só posso convidá-lo a olhar com mais atenção para as causas das coisas e depois para dentro da própria Igreja Católica onde os escândalos sexuais prosseguem dentro de momentos… -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 2 comentários: Anónimo disse... Caro Wilson Dadá, adorei o seu artigo. Estou de acordo com a sua postura em relação á camisinha embora não tenha sido essa a intenção nem a posição do Papa. Quanto á menina do Brasil aqui vai a rectificação: A menina tem 9 (nove) anos, 13 anos tem a irmã, mais velha que também foi violentada pelo mesmo monstro. Quanto ao Vaticano, sancionou sim a excomunhão da menina e médicos, tendo sido completamente omisso em relação ao monstro (padrasto), que deve continuar na santa paz a ir á missa e a comungar todos os domingos, depois de ter confessado é claro (será que fala das violações?). 29 de Março de 2009 5:07 Assídua disse... O WD fala muito em "campanhas dirigidas aos jovens", penso que elas devem ser derigidas para a sociedade em geral(isto para os "marketistas")visto que hoje o sexo é practicado muito mais cedo, e os nossos "kotas", não ficam atrás no que toca ao não quererem usar o preservativo. Mas são eles os maiores colecionadores de "troféus femeninos", vulgo "Luanda1,2,3...". Entendo que ser jovem é um estado de espírito, mas é necessário incluir na msg cabelos grisalhos, já que abstinência ou um(a)parceiro(a) não teremos nunca mais na actual sociedade angolana...E quanto aos católicos espero que usem o seu próprio "Judment" para isso é que somos seres pensantes(ou deviamos ser). 29 de Março de 2009 8:42

sábado, 28 de março de 2009

Promovam e respeitem os direitos humanos fundamentais!

1-Quantas e quantas vezes este apelo já não foi feito em Angola por angolanos e para angolanos. Dizer (denunciar) que em Angola ainda há graves problemas com a promoção e o respeito dos direitos humanos é normalmente entendido pelos representantes do poder como sendo apenas um ataque político com propósitos desestabilizadores. As reacções já foram mais violentas, mas continuam ser bastante enérgicas e furiosas como se tivesse havido algum súbito cataclismo, sempre que alguém de dentro ou de fora das nossas fronteiras coloca Angola na lista dos países que menos respeitam os direitos humanos A maior parte dos “autarcas” deste país, estamos em crer, nunca leu na íntegra e com a devida atenção os trinta artigos que povoam a incontornável Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) com base nos quais se fazem as avaliações regulares da realidade de cada um dos signatários. Angola é um destes signatários à semelhança do que acontece com a totalidade dos países membros das Nações Unidas. 2-Se os nossos próceres tivessem procedido à mencionada e recomendada leitura, chegariam fácil e rapidamente à conclusão que Angola (ainda) continua de costas voltada para a mais famosa declaração já produzida pela humanidade na sua história milenar. Trata-se de uma constatação de factos preocupantes e dramáticos que fazem parte da desequilibrada e explosiva geografia humana deste país. Não tem nada a ver com juízos de valor. Não tem nada a ver com jogadas políticas. Não tem nada a ver com ser da oposição ou estar no poder. É muito mais importante do que tudo isso, porque tem a ver com a sobrevivência de milhões de angolanos que, no limiar da pobreza, continuam a tentar aceder, sem grande sucesso, à distribuição do rendimento nacional, cuja parte de leão continua a ser sofregamente comida por uma ínfima percentagem da população. Uma distribuição que todos acham ser injusta, mas que pouco fazem para no imediato tentar aliviar o sofrimento que vai por aí em matéria de privações. Chamar a atenção para esta dura realidade foi o que Papa fez ao longo dos três dias que esteve entre nós ao matraquear constantemente na tecla dos direitos humanos com vários enfoques. Por esse facto o próprio Papa chamou a atenção de todos, embora mesmo assim tenhamos registado opiniões segundo as quais ele foi muito superficial nos recados que enviou à governação angolana. Ao que sabemos, aparentemente, o Governo recebeu bastante bem a sua mensagem humanitária, tendo o próprio Presidente José Eduardo dos Santos (JES) considerado que a visita tinha ultrapassado todas as expectativas. Mais do que isso JES assumiu na hora da partida (mais) um solene compromisso. “Isso incentiva-nos a prosseguir na senda da consolidação da paz e reconciliação nacional e na construção de um projecto de sociedade assente no respeito pelos direitos humanos, na democracia e na justiça social”- prometeu JES. A ver vamos... 3-Em 1992 o Papa que nos visitou não conseguiu, com todas as suas bênçãos, travar os fortes ventos de guerra que então sopravam por entre as promessas de que não haveria mais fratricídio em território nacional. As suas bênçãos “trouxeram” uma guerra ainda mais devastadora que a anterior. O “milagre” da paz foi adiado. Que país teremos agora com a novas bênçãos do sucessor de João Paulo II? Estamos certos que guerra convencional ou de guerrilha não teremos mais, mas já não estamos tão seguros de que, a manterem-se as actuais e gritantes desigualdades, não venhamos a ter que lidar com fenómenos violentos tão ou mais preocupantes do que os anteriores. O “milagre” já não passará pelo calar das armas de dois ou três beligerantes que, entretanto, passaram todos eles à reforma. O combate será muito mais difícil se é que depois haverá alguma vontade política para o travar, uma vez que o cenário que temos no bolso aponta para a mais completa promiscuidade entre negócios públicos e privados, que irá dar corpo a mais uma babilónia. A nova “guerra” que se anuncia e que já é um facto em progressão na criminalidade violenta e aberta que todos os dias faz vitimas e na actuação (ainda) silenciosa das máfias para todos os gostos e feitios, só poderá ser travada se os nossos trungungueiros do topo e da estrutura intermédia ouvirem mais atentamente a mensagem do Papa e agirem em conformidade com a mesma. Caso contrário… 4-Para se ter uma ideia mais concreta do quanto Angola e a DUDH ainda estão profundamente zangadas, citaremos aqui apenas o conteúdo do artigo 25° da referida Declaração. “1-Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. 2. A maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimónio, gozam da mesma protecção social.” Qualquer relacionamento (coincidência) do conteúdo deste artigo com a realidade angolana dos nossos dias só poderá ser a mais pura e retumbante galhofa. Se alguém achar que não, apesar de estar no seu direito de discordar, só pode estar a brincar com coisas sérias. Este não foi certamente o caso de Bento XVI que, com a bandeira dos direitos humanos, entrou a “matar” e saiu a “esganar”. 5-A entrar foi assim: “Não vos rendais à lei do mais forte! Porque Deus concedeu aos seres humanos voar, sobre as suas tendências naturais, com as asas da razão e da fé. Se vos deixardes levar por elas, não será difícil reconhecer no outro um irmão que nasceu com os mesmos direitos humanos fundamentais. Infelizmente, dentro das vossas fronteiras angolanas, há ainda tantos pobres que reclamam o respeito dos seus direitos. Não se pode esquecer a multidão de angolanos que vive abaixo da linha de pobreza absoluta. Não desiludam as suas expectativas! Trata-se de uma obra imensa, que requer uma maior participação cívica de todos. É necessário envolver nela a sociedade civil angolana inteira, mas esta precisa de apresentar-se mais forte e articulada tanto entre as forças que a compõem como também no diálogo com o Governo. 6-Horas depois já no Palácio do seu homólogo, para não deixar arrefecer o prato servido no aeroporto, acrescentou mais algum sal e pimenta ao cardápio: "Meus amigos, armados de um coração íntegro, magnânimo e compassivo, podereis transformar este continente, libertando o vosso povo do flagelo da avidez, da violência e da desordem e guiando-o pela senda daqueles princípios que são indispensáveis em qualquer democracia civil moderna: o respeito e promoção dos direitos humanos, um governo transparente, uma magistratura independente, uma comunicação social livre, uma administração pública honesta, uma rede de escolas e de hospitais que funcionem de modo adequado, e a firme determinação, radicada na conversão dos corações, de acabar de uma vez por todas com a corrupção". 7-A sair a dose repetiu-se: “Se me permitissem um apelo final, seria para pedir que a justa realização das aspirações fundamentais das populações mais necessitadas constitua a preocupação principal de quantos ocupam cargos públicos, visto que a sua intenção – estou certo – é desempenhar a missão recebida, não para si mesmos, mas em vista do bem comum. O nosso coração não pode estar em paz, enquanto virmos irmãos sofrerem por falta de alimento, de trabalho, de um tecto ou de outros bens fundamentais. Entretanto para se oferecer uma resposta concreta a estes nossos irmãos em humanidade, o primeiro desafio a vencer é o da solidariedade: solidariedade entre as gerações, solidariedade entre países e entre continentes que dê origem a uma partilha cada vez mais equitativa das riquezas da terra entre todos os homens.” Claro que permitimos, Excelência.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Crónica de uma crise anunciada há mais de 200 anos

"Os donos do capital vão estimular a classe trabalhadora a comprar bens caros, casas e tecnologia, fazendo-os dever cada vez mais, até que se torne insuportável. O débito não pago levará os bancos à falência, que terão que ser nacionalizados pelo Estado"
-Karl Marx, in Das Kapital, 1867 "Acredito que as instituições bancárias são mais perigosas para as nossas liberdades do que o levantamento de exércitos. Se o povo Americano alguma vez permitir que bancos privados controlem a emissão da sua moeda, primeiro pela inflação, e depois pela deflação, os bancos e as empresas que crescerão à roda dos bancos despojarão o povo de toda a propriedade até os seus filhos acordarem sem abrigo no continente que os seus pais conquistaram"
-Tradução de uma "boca" atribuída a Thomas Jefferson que foi o terceiro Presidente dos EUA e o principal autor da Declaração da Independência Americana (1802)
5 comentários: António Vilarigues disse... 1. A frase de Marx não existe. è uma piada de um jornal satírico dos EUA;
2. Apenas o primeiro período da frase de Thomas Jefferson foi de facto proferida por ele (ver Wikipedia)O que não invalida que ambas sejam verdadeiras. Os autores é que foram outros...
António Vilarigues - Portugal
MESU MA JIKUKA disse... Dois séculos depois, muito actual. Aliás a ciência é assim. 26 de Março de 2009 11:11 Gil Gonçalves disse... “A competição não é a emulação industrial, é a emulação comercial. Atualmente, a emulação industrial só existe em função do comércio. Há até fases da vida econômica dos povos modernos em que todos são tomados por uma espécie de vertigem para lucrar sem produzir. Esta vertigem especulativa, que retorna periodicamente, desnuda o verdadeiro caráter da competição que busca escapar da necessidade da emulação industrial”. (Karl Marx, 1817 : 110-111)«os refúgios fiscais, as jurisdições secretas e os mil e um canais de evasão fiscal e cambial em todo o mundo para ali refugiar-se; a irresponsabilidade dos grandes bancos e empresas industriais de buscar lucros fáceis e abundantes na especulação financeira; e, envolvendo isto tudo, a compulsão de crescer, de consumir, de crescer mais, de consumir mais, e de inundar a terra com lixos e rejeitos de todo tipo. Esta é, numa palavra, a tônica da fase avançada do capitalismo mundial: lucrar sem produzir. Enquanto 850 milhões de seres humanos padecem e morrem de fome na Terra, outros ganham fortunas sem produzir, apenas especulando. Um sistema econômico que é irracional, ineficiente e imoral, do ponto de vista da maioria dos habitantes e dos ecossistemas do planeta. E que reproduz continuamente uma profunda divisão das sociedades e da espécie em classes sociais, que transcendem os territórios nacionais e se globalizam.»In Marcos Arruda. Ladislau Dowbor 27 de Março de 2009 1:56 Walnandes disse... Isso é trabalho dos actuais materialístas/imediatístas, que só olham para os seus estómagos e dos seus. E passam a vida a vida a insultar quem idealiza a "vida/sociedade" de forma diferente, de: utopístas, agitadores, dogmáticos, apressados...Bloco de sofístas! 27 de Março de 2009 1:59 Anónimo disse... Dramático é perceber que para alegria de poucos e tristeza de milhões,vemos o mundo desta forma!O capital a rodar diariamente de bolsas em bolsas, no afã do maior rendimento possivel enquanto a produção quem se importa.Fome.. quem se importa....desemprego...quem se importa.A miséria humana cada vez mais degradante.Capitalistas, podem esperar que a tua hora vai chegar! 28 de Março de 2009 6:20

domingo, 22 de março de 2009

Sem cadernos eleitorais não voto nunca mais!

Tem início dentro de mais alguns dias o período anual de actualização do registo, o que significa falar necessariamente da actualização dos cadernos eleitorais e da sua importância estratégica enquanto pilar fundamental e estruturante do processo eleitoral. Como se sabe, os tais cadernos, previstos na lei como sendo a principal garantia de rigor, controlo e transparência do processo eleitoral, particularmente orientada para a nevrálgica vertente do apuramento dos resultados, acabaram por ser os grandes ausentes da disputa realizada em Setembro do ano passado. Foi-se assim por água abaixo a tão propalada e aclamada solução tecnológica do Consórcio que organizou o registo eleitoral, tendo a unicidade do voto ficado dependente apenas de um bocado de tinta indelével, o que é manifestamente insuficiente para se prevenir a ocorrência de situações de duplicidade. De facto todo o projecto do registo eleitoral que custou uns largos milhões de dólares ao erário público não faz qualquer sentido sem a utilização dos cadernos eleitorais que são parte integrante e indissociável do mesmo, constituindo-se, aliás, na sua peça mais estratégica. Os cadernos funcionam como uma espécie de apoteose do registo eleitoral, sendo eles, por estarem na parte final do processo, que efectivamente confirmam a eficácia de todo o sistema, o que não aconteceu com as eleições legislativas de Setembro último. Para além da identificação de todos os cidadãos com capacidade eleitoral activa, diremos que o objectivo fundamental do registo é a produção dos cadernos eleitorais que permitem depois que se passe a fase seguinte que é a votação propriamente dita no dia D. A lei angolana é demasiado clara sobre a importância incontornável dos cadernos, ao referir que só após se verificar que a identidade do eleitor está em conformidade com o Caderno Eleitoral, o que pressupõe riscar ou colocar um sinal estabelecido no documento, ele estará em condições de receber o boletim de voto para consumar o seu direito democrático. Este é que o procedimento normal (modo de votação) que deve ser seguido e que não foi em Setembro pelas razões que todos conhecemos (mais ou menos) mas nem todos aceitamos de ânimo leve como o fizeram algumas entidades que têm responsabilidades acrescidas a nível nacional. Custa-nos por isso aceitar que o Tribunal Constitucional num dos acórdãos produzidos na sequência das reclamações que lhe foram endereçadas tenha passado tão ao largo da gritante e preocupante ausência dos cadernos eleitorais no dia da votação, como se fosse apenas um pormenor e não a base de todo o sistema. Mais grave do que isso foi o TC entender que “o uso obrigatório da tinta indelével que se verificou em todo o País, identificou os cidadãos que já tinham votado e, tal como se verifica noutros sistemas eleitorais, oferece garantia técnica suficiente, idónea e notória de asseguramento da unicidade do voto”. A fazer jurisprudência este entendimento derruba pela base os fundamentos do edifício eleitoral angolano, constante da legislação em vigor, onde a tinta indelével surge apenas como uma medida de protecção complementar da unicidade do voto que é executada já depois do cidadão ter consumado o seu direito. De facto quem melhor que os cadernos eleitorais garante os direitos e os interesses dos cidadãos? Quem melhor que os cadernos eleitorais assegura “que todos eles (princípio da universalidade) e somente eles (princípio do registo eleitoral) possam votar e votem uma única vez (princípio da unicidade de voto)”? Como garantir efectivamente que a vontade dos eleitores foi livremente expressa nesta ou naquela direcção se a base de controlo de todo o processo que são os cadernos eleitorais esteve ausente? Fica-nos por isso difícil entender o preclaro Juiz Conselheiro do TC, Onofre dos Santos, quando afirmou o ano passado que “todas as violações de procedimentos previstos na lei, por muito que devam ser assinaladas e merecer censura, não deverão prevalecer contra os resultados desde que estes correspondam à vontade livremente expressa dos eleitores e não tenham condicionado, afectado ou diminuído a sua capacidade de votar nem as garantias de que apenas os eleitores possam ter exercido o seu direito de voto e que o possam ter feito uma única vez”. Em meu entender só mesmo com a utilização dos cadernos eleitorais é possível ter-se este controlo, é possível verificarem-se todas as reclamações, é possível segmentarem-se os resultados, mesa por mesa, município por município e por aí adiante. Só mesmo com os cadernos eleitorais e à semelhança do que se faz em todo o mundo democrático que já atingiu a maioridade, é possível realizarem-se eleições livres, justas e transparentes. Em matéria de democracia os cadernos eleitorais estabelecem a fronteira entre a confusão e a civilização. Foi o que nos propusemos fazer o ano passado com toda a legislação aprovada e com todo o sistema que foi montado pelo tal Consórcio. Lamentavelmente não conseguimos. Falhámos redondamente na fase mais decisiva do processo, na sua recta final, com toda aquela confusão que teve Luanda como palco principal (mas não único) e cujos autores estão por “descobrir” e responsabilizar, se é que algum dia o serão, para não variar. Por tudo isto e muito mais tomei a grave decisão, enquanto cidadão-eleitor, de só voltar a participar em eleições no meu país, quando me garantirem que os cadernos eleitorais serão utilizados na sua plenitude e em conformidade com o que a nossa lei dispõe. É tão simples quanto isso. “Sem cadernos eleitorais não voto nunca mais!”- será o meu slogan eleitoral de agora em diante para pressionar quem de direito a não repetir a barraca de Setembro. Como sei que esta garantia só poderei obter (confirmar) na hora de entrar na assembleia de voto, vou ter de aguardar pela convocação das próximas eleições, que em princípio deverão ocorrer ainda este ano, no âmbito da normalização da vida politico-constitucional do nosso país, após mais de 15 anos de interrupção da vida de um Estado Democrático de Direito, que tínhamos começado a edificar em 1992. Na altura, ainda a vivermos a época das vacas gordas e com o PIB a dar saltos de cavalo na propaganda oficial e no jornalismo de ressonância, fui das pessoas que não vi um grande inconveniente na concretização faseada desta normalização, com a realização primeiro das legislativas e um ano depois das presidenciais. Agora já não posso aceitar que este desiderato que foi objecto de um consenso nacional com as reservas que se conhecem, seja atirado para as calendas gregas, com o argumento de que é necessário fazer aprovar primeiro a nova constituição e só depois convocar as eleições presidenciais. Curiosamente até estou de acordo que se aprove a constituição neste entretanto, desde que as eleições presidenciais se realizem dentro do prazo previsto, o que já não nos parece possível com a agravante de em 2010 termos o CAN na agenda. De acordo com o meu amigo Ismael Mateus tal só seria possível se o modelo de legitimação do Presidente da República, a ser incluído na futura constituição, for a opção pela via indirecta, isto é, através do parlamento. Trata-se, como se sabe, e depois das declarações feitas por JES em Lisboa, de uma opção que continua bem em cima da mesa, apesar de KK, o homem que pisca à direita e vira à esquerda, se ter esforçado por nos convencer que a conversa das indirectas não passava de uma invenção do Chivukuvuku e de mais alguns analistas. “Esqueceu-se” do Moco que é do seu partido e que já foi seu superior hierárquico. Como também se sabe, esta opção viola de forma particularmente ostensiva o próprio consenso nacional que esteve na origem do calendário da normalização que foi aprovado no Conselho da República em 2007 e que agora está a ser posto em causa. Para além de todos os argumentos jurídicos que já foram esgrimidos, se tivermos o mínimo de honestidade, temos de reconhecer que ninguém na altura pensou que ao elegermos a nova Assembleia Nacional, estávamos igualmente a escolher o novo Presidente da República. Tudo, em termos de campanha eleitoral, como é evidente, teria sido diferente. É pois em nome deste mínimo de honestidade que o país deveria continuar a orientar o seu rumo em direcção ao futuro que a todos pertence e que todos desejamos que seja o mais próspero, mas sobretudo que não tenha nada a ver com o passado de guerra e devastação. Caso contrário estamos mal, muito mal mesmo.

terça-feira, 17 de março de 2009

A oração de sapiência de Pepetela

1-"A nossa megalomania nacional, verdadeiro traço de carácter, ou, segundo o vetusto Kardiner, um marcador da nossa personalidade de base, provém de julgarmos o país incomensuravelmente rico. Os colonizadores, nos anos sessenta e setenta do século passado, repetiram tantas vezes esta lenda, que ela passou a fazer parte do nosso código genético, por assim dizer, e agora é difícil voltar atrás e admitir o contrário, que somos de facto e por enquanto, apesar de algumas indubitáveis vitórias, um país miserável, incapaz de alimentar suficientemente os seus filhos, incapaz até agora de matar no ovo as diferentes epidemias que nos assolam, incapaz de avançar numa clara política de desenvolvimento sustentado."
(...)
2-"Mantida em relativo silêncio, a ganância no entanto pauta cada vez mais as nossas vidas. Há pessoas que são tão viciadas nela como outros são na heroína ou na liamba. Quanto mais riqueza têm mais querem ter, açambarcando verdadeiros latifúndios agrários ou amamentando grupos económicos tentaculares, os chamados polvos da nossa economia. As notícias publicadas sobre o assunto pecam por defeito, mas o que vai aparecendo é suficiente para se detectarem as ramificações e associações entre os diferentes centros desses poderosos predadores que um dia saíram do nada para a fortuna, abocanhando tudo o que seja tragável, isto é, que dê lucros, de preferência imediatos. Porque a ganância torna o indivíduo sôfrego e apressado, treinado na arte de somar mentalmente com rapidez, deixando poucos traços ou pistas evidentes no terreno. Se a ganância se tornou num traço característico da humanidade, o que receio acontecer, então não há alternativa e estamos votados à catástrofe, terminando por darcabo do planeta Terra e de toda a vida no seu interior."
(...)
3-"Um marcador que serve para comparar os países em função das diferenças entre as partes do sistema social é o chamado índice de Gini, que em Angola, segundo um estudo, atingiu em 2005 a taxa de 0,62. Este número revela uma das mais fortes diferenciações sociais do mundo. Quer dizer, os ricos são muito ricos e os pobres muitíssimo pobres. É resultado da tal ganância que leva alguns a enriquecerem a qualquer custo. Para esses, a ética é o mesmo que moldar estrelas em galáxias distantes, algo de absolutamente estranho e absurdo. Quer dizer, precisamos de imprimir ética no mercado e nos mercadores. O estado e todas as instituições criadas para o efeito têm de se preocupar com a necessidade de os processos sociais seguirem normas, expressas por leis, de alto rigor. E que os cidadãos, quaisquer que sejam, não só cumpram asleis mas se sintam honrados por as cumprir. Isso é ética."
[Extractos da Oração de Sapiência proferida na Universidade Agostinho Neto por Artur Pestana (Pepetela) na abertura do novo ano académico do ensino superior (13/03/09)]

domingo, 15 de março de 2009

Os engarrafamentos, a saúde pública e o canteiro de obras

1-A semana passada um dos ouvintes que participou no debate de quarta-feira promovido pela LAC disse algo com o qual eu estou inteiramente de acordo. O cidadão em causa afirmou que os engarrafamentos que se processam em Luanda já são um problema de saúde pública. Um grave problema de saúde pública acrescentaria eu, algo surpreendido com a perspicácia deste analista do nosso quotidiano. Adiantou o mesmo ouvinte que diante da nova epidemia, é necessário adoptarem-se medidas que tenham em conta a gravidade da situação sanitária criada com os engarrafamentos. Que medidas serão essas, se é que ainda existe alguma possibilidade técnica de fazer frente ao flagelo que todos os dias ameaça a nossa estabilidade e nos retira paulatinamente o mínimo de qualidade de vida a que temos direito. De facto já não se trata de uma simples analogia este casamento dos engarrafamentos com a degradação da saúde das pessoas. É real. Pelas suas consequências é mais do que evidente que os engarrafamentos já estão a afectar de forma particularmente grave a saúde de uma parte muito considerável dos largos milhões de luandenses (quantos seremos nesta altura?) que por aqui sobrevivem, com a nossa atenção dirigida particularmente aos mais novos, às crianças. Restará agora os especialistas apurarem até que ponto o “stress” produzido pelas intermináveis horas no trânsito para percorrer meia dúzia de quilómetros todos os dias, está a atacar (e de que forma) o estado de saúde dos infelizes habitantes desta desgarrada metrópole.Antes de mais e para os efeitos que estamos aqui a discutir é importante referir que na definição da OMS saúde é muito mais do que a ausência de dor ou mal-estar físico. Saúde para OMS “é o estado de completo bem-estar físico, mental e social, não consistindo somente da ausência de uma doença ou enfermidade.” Com base nesta definição não parece haver qualquer dúvida quanto ao facto dos engarrafamentos estarem a prejudicar gravemente a saúde dos luandenses, sendo para já difícil determinar a extensão e a profundidade dos estragos. Depois da cólera e da raiva, temos agora os engarrafamentos numa devastadora linha de ataque que está a levar-nos ao desespero completo. Como se sabe, os engarrafamentos trazem consigo um aumento acentuado da criminalidade o que significa dizer perigo de morte para qualquer um de nós e a qualquer altura, como resultado dos repetidos ataques dos “nossos” predadores que estão cada vez mais violentos e cruéis, como se estivessem a celebrar a conquista de uma cidade que os hostiliza, que não lhes dá emprego, que não lhes dá futuro. Não será exactamente este o caso de Luanda? As violações das virgens do Cassequel do Buraco e os constantes assaltos que as casas de algumas ruas daquela comunidade são alvo por parte de conhecidos meliantes (vizinhos) falam bem desta fúria destruidora que não encontra adversários a altura, embora as prisões estejam a abarrotar e todas as semanas a policia nos apresente mais umas dezenas de delinquentes. Cadeias super-lotadas e criminalidade em flecha, é uma realidade que nos deixa ainda mais preocupados, por mais que a polícia nos queira sossegar com as suas estatísticas positivas que falam de um recuo das acções delituosas e de um aumento dos casos esclarecidos. No nosso modesto entender, isto quer dizer que os “soldados do crime” têm mais substitutos do que se poderia imaginar, muitos mais mesmo, que até causa arrepios fazer projecções. 2-Não aceitar o relacionamento da saúde pública com os engarrafamentos e passar a vida a dizer, como tristes e irritantes papagaios, que o governo está a trabalhar para melhorar a vida das pessoas, é fazer tudo menos jornalismo. Já aqui o dissémos há umas semanas na crítica que fizémos ao “jornalismo de ressonância”. Voltamos a dizê-lo hoje para destacar que o balanço das obras públicas em Luanda em termos de impacto na solução dos problemas das populações é negativo, é decepcionante, é preocupante. É um balanço que não nos pode deixar contentes o que seria o nosso grande desejo, embora, também já aqui o dissémos, não sejamos daqueles que fazem festas ou passam a vida a agradecer o governo por estar apenas a cumprir com as suas obrigações, com a utilização de recursos que a todos pertencem. Os monumentais engarrafamentos deste ano (ainda só com meia dúzia de chuvas) estão a ser muito mais violentos e sufocantes do que os do ano passado, o que quer dizer que as tais obras e os tais canteiros não estão a resultar, como era suposto. Quanto mais tempo, vamos ter de esperar? Depois de já se terem passado alguns anos desde que as primeiras intervenções começaram a ser feitas nas estradas principais, secundárias e terciárias da província de Luanda, a capital deveria apresentar este ano um outro aspecto em matéria de circulação rodoviária que é fundamental, que é estratégica para a vida de qualquer metrópole. O que assistimos nos dias que passam é que tudo se está a agravar em matéria de circulação de pessoas e bens, como se tivéssemos voltado aos tempos da guerra transportada agora apenas para Luanda. Tudo e mais alguma coisa, ao ponto de termos a cidade paralisada várias vezes nos últimos tempos, o que nos anos anteriores não acontecia com tanta frequência. Diante deste quadro e perante tendências que não são nada animadoras neste e noutros domínios da vida dos luandenses, só resta preparar para o pior, ir buscar as últimas resistências ao baú das nossas esperanças e perguntar até quando vamos continuar nesta passada. Alguém disse que as chuvas são o único fiscal que os empreiteiros não conseguem enganar. Acrescentaria eu que os engarrafamentos são, nesta altura, o único partido da oposição que o Governo teme realmente, contra o qual os seus cerca de 82% do eleitorado conquistado em Setembro do ano passado, pouco ou nada valem. E não valem, porque estão quase todos bloqueados pelos mesmos engarrafamentos.

Directas versus indirectas ou a falta de sintonia entre os camaradas?

A segunda visita de estado (a primeira foi em 1987) que o Presidente José Eduardo dos Santos efectuou a Portugal em trinta anos de consulado, que se prepara para assinalar em Setembro próximo, foi marcada politicamente pelas próximas eleições presidenciais angolanas.
A perspectiva com que JES aflorou o tema desagradou profundamente vários círculos locais, ao mesmo tempo que evidenciou aparentes problemas de falta de sintonia política no seio do MPLA. Problemas deste tipo, note-se, já começam a ser recorrentes, numa altura em que alguns analistas cada vez mais falam da existência de uma "agenda pessoal de JES" que nem sempre está em consonância com a estratégia geral do partido no poder. É um cenário dificil de confirmar, mas há de facto alguns sinais que apontam nessa direcção, sobretudo quando em abordagem está o dossier da sua sucessão, que pelos vistos se mantém um tabú da vida política nacional. Não houve, entretanto, nenhuma novidade nas declarações feitas em terras portuguesas, já que o linkage estabelecido entre a convocação das próximas eleições presidenciais e a aprovação da nova constituição tem vindo a ser assumido por outras fontes afectas ao regime, depois do próprio JES ter dado o pontapé de saída nessa direcção. A novidade estará, talvez, no impacto mediático da declaração presidencial já que foi feita num país estrangeiro que nos é muito próximo, com toda a cobertura jornalística que as suas palavras tiveram dentro e fora de Angola. Importa referir que o mais recente destes pronunciamentos foi produzido pelo principal porta-voz do MPLA, Norberto dos Santos (Kwata-Kanawa), em declarações ao Novo Jornal (NJ), ao afirmar peremptório que as “presidenciais serão realizadas já com a nova constituição”. Depende por isso, acrescentou, “da velocidade com que ela ficar concluída”. Da parte do Presidente JES o que efectivamente houve desta vez em Lisboa, foi apenas uma reafirmação do que ele já havia dito em Luanda em Novembro do ano passado quando, pela primeira vez, condicionou claramente a realização das eleições presidenciais à aprovação de uma nova constituição. Dos Santos que falava na abertura de uma reunião do seu partido, introduziu igualmente pela primeira vez na agenda política nacional a possibilidade das eleições presidenciais virem a ser realizadas por via indirecta, fazendo recurso à existência de uma corrente defensora desta via, cuja origem, na ocasião não especificou, deixando o campo totalmente aberto às mais variadas conjecturas e especulações. Terá sido exactamente este, na avaliação convergente de vários analistas, o propósito do “balão de ensaio sobre as indirectas” engenhosamente lançado por JES diante dos membros do Comité Central do MPLA, fazendo tábua rasa da existência de um conjunto de princípios contidos na actual Lei Constitucional que impedem a sua revisão ou alteração para além dos limites constantes no seu artigo 159. Diante do crescendo de protestos e de reacções menos positivas que a ideia das indirectas causou junto dos mais diferentes círculos políticos e académicos, o MPLA sentiu-se forçado a esclarecer que não tinha nada a ver com a ideia das indirectas, tendo algumas das suas figuras de proa feito, neste âmbito, pronunciamentos bastante "mal-humorados". Na referida entrevista ao NJ e à semelhança do que já havia feito o SG do MPLA, Dino Matrosse, Kwata-Kanawa (KK) acusou pessoas “ como Abel Chivukuvuku e vários analistas políticos” de serem os responsáveis pela colagem do seu partido à ideia das indirectas.
Já se fizeram inclusivamente, apontou, “debates na Rádio Ecclésia em que as pessoas falam como se tivessem ouvido o MPLA ou o seu líder dizer que queriam seguir esse caminho”.
O porta-voz do MPLA esqueceu-se, possivelmente, de nomear o seu companheiro de partido, Marcolino Moco (ex-SG do MPLA e ex-PM), que também participou num desses debates, onde manifestou as mesmas preocupações em relação ao estranho relacionamento do partido no poder com as indirectas. Apesar de se ter esforçado por esclarecer que o MPLA defende a eleição do PR por “voto directo e universal”, sintomaticamente KK foi depois incapaz de confirmar se o ante-projecto constitucional da sua formação vai excluir do texto a opção pelas indirectas. “Não posso dizer agora se vai ou não. Apenas posso dizer que ainda não o elaborámos”- destacou KK. Em Lisboa o Presidente José Eduardo dos Santos voltou a falar das indirectas como uma possibilidade que se mantém no mesmo plano que as directas, estando tudo dependente do modelo que a nova constituição vier a adoptar. É ponto assente, por razões demasiado óbvias, que o modelo será desenhado com o lápis rubro-negro do MPLA de acordo com a sua estratégia política. Uma vez mais JES deixou em aberto o mesmo “espaço de manobra” que já havia endossado quando, o ano passado, pela primeira vez, introduziu o tema das indirectas no debate político nacional. De facto para quem diz, como afirmou KK, “que as indirectas não existem na cabeça do MPLA”, acusando todos quantos, alegadamente, estão a imputar ideia ao “Eme” de estarem a “fazer jogadas políticas”, é, no mínimo, difícil de entender que JES não tenha aproveitado esta oportunidade na capital portuguesa para esclarecer de uma vez por todas qual é a posição do partido maioritário. "Se tudo correr normalmente, estamos em crer que dentro deste ano será aprovada a Constituição. Em função da modalidade escolhida - eleição por sufrágio directo ou indirecto, através do parlamento -, definiremos o calendário eleitoral para as eleições presidenciais", disse o Chefe de Estado angolano.
Para além disso, JES afirmou em Lisboa que a eleição não será feita na base da actual Constituição, mas com base num novo texto que está a ser definido por uma comissão parlamentar, e que será depois submetido a consulta pública, antes da aprovação.
As declarações de JES em Portugal não estão de facto em sintonia com os recentes pronunciamentos de Norberto dos Santos, pois era suposto que depois da “contra-ofensiva” mediática do MPLA não mais se ouvisse falar das indirectas como sendo uma possibilidade real, pelo menos no seio do maioritário. O MPLA, na opinião de alguns analistas, continua a pautar a sua conduta pela chamada “lógica da infalibilidade”, aceitando muito dificilmente dar a mão à palmatória, quando, por algum motivo, como soe dizer-se, “põe a pata na poça”, como parece ser agora o caso das indirectas e muito particularmente da alteração dos limites materiais da revisão constitucional. O MPLA, ainda segundo os mesmos analistas, quer sair sempre bem em todas as fotografias que tira, mesmo quando está contra a luz de algumas evidências que procura contornar. Sendo o primeiro a seguir a máxima segundo a qual em política a ingenuidade paga-se caro, o “partido dos camaradas” não admite depois que os seus adversários avaliem da mesma forma as suas movimentações/intenções.

sábado, 14 de março de 2009

Dardos para o Morro

Shadydreams disse... Ola:Decidi atribuir ao seu blog Morro da Maianga o Prémio Dardos, pelo qual se reconhecem os valores que cada blogger, emprega ao transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc. que, em suma, demonstram sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, entre suas palavras. Esses selos foram criados com a intenção de promover a confraternização entre os bloggers, uma forma de demonstrar carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web. Este prémio obedece a algumas regras. Para as cumprir leia o meu último post no Diademadeangola. Obrigada. Um abraço de MJ 13 de Março de 2009 17:00

quinta-feira, 12 de março de 2009

De Padre para Papa: Os recados de Raul Tati

É urgente africanizar a igreja em África
"O problema fundamental que se coloca é que Roma não está disposta a admitir que no interior da Igreja haja experiências diferentes e legitimas sobre a maneira de celebrar o mistério da fé e de viver o evangelho em África".
(...)
"Enquanto os nossos Bispos não tiverem consciência da dimensão e do peso da sua responsabilidade como líderes desta igreja, enquanto não sacudirem as peias do tradicionalismo e do conservadorismo e se fizerem passar por meros “catequistas de Roma” (expressão de um Purpurado de quem me faço tributário!), constrangidos à obediência dócil e à dependência financeira, a África será sempre “terra de missão” e Roma ver-se-á obrigada, através da Propaganda Fide, a sustentar economicamente essa Igreja desprovida de auto-suficiência econômica e completamente dependente das colectas obrigatórias.
(...)
"Angola no contexto das Conferências Episcopais da África subsariana, pontifica como a Conferência Episcopal mais branca (cerca de 43%), apesar de ter um clero autóctone idôneo e bem preparado. Isto não preocupa?
(...)
"Gostava, antes de morrer, de ver algum africano à frente de uma Diocese italiana, francesa, portuguesa, espanhola ou germânica. Há centenas de padres africanos a trabalhar por lá e não são nem menos capazes menos menos santos que os seus colegas europeus".
Salvai-nos, que perecemos! (Mt. 8,25)
"Desde a nomeação do sucessor do primeiro Bispo de Cabinda, os nossos olhos viram e os nossos ouvidos ouviram coisas inéditas na história desta igreja. Vimos a infâmia dos militares armados dentro dos templos a espancar os fiéis que só pretendiam rezar; vimos indivíduos do SINFO infiltrados nas assembléias de culto para gravar homilias dos padres “reaccionários”; vimos o Arcebispo de Luanda e Administrador Apostólico da Diocese a ser vaiado em plena missa crismal;"
(...)
"Hoje a Diocese de Cabinda não passa de uma sombra de si própria. Calaram os profetas, dispersaram as ovelhas, esvaziaram os seminários (já não temos Seminário de filosofia em Cabinda e em Luanda nenhum seminarista teólogo) e enfraqueceram a coesão desta igreja. O ministério dos padres está reduzido à pastoral misseira, o resto do tempo é para os negócios"
(...)
"Um novo Pentecostes urge para a Igreja em Cabinda e quem sabe a visita do Romano Pontífice não venha a ser um grande refrigério espiritual para milhares de cristãos cabindeses sedentos da verdade, da justiça e de uma reconciliação profunda. Mas enquanto Jesus dorme ainda na barca, vamos gritando: Senhor, salvai-nos que perecemos!" [Extractos de um artigo de opinião assinado pelo antigo Vigário-Geral da Diocese de Cabinda, Padre Raul Tati, cuja primeira parte o Angolense já publicou na sua última edição com a promessa de concluir a apresentação do texto esta semana.]

quarta-feira, 11 de março de 2009

Uma boa causa: "EM DEFESA DO QUE RESTA DE LUANDA"

O abaixo-assinado pode ser subscrito: Na UNAP, Associação Chá de Caxinde e sede da Ordem dos Arquitectos de Angola. O documento será endereçado ao PR, com conhecimento à Governadora, Ministra da Cultura, Comissão da Cultura da Assembleia e representação da UNESCO em Luanda. Já foram recolhidas trezentas assinaturas. São precisas muitas mais. Nós, abaixo assinados, cidadãos nascidos ou residentes em Luanda, ACREDITANDO que o que torna uma cidade singular é o seu património histórico e cultural, traduzido pelos hábitos das suas gentes, mas igualmente pelas pedras, construções, espaços e edifícios que foram sendo introduzidos ao longo dos séculos da sua génese. TENDO tomado conhecimento que se continua a autorizar a destruição de património público, entre prédios classificados como foi o Palácio de Dona Ana Joaquina, ou por classificar, como o Mercado do Kinaxixe, este último considerado internacionalmente uma das obras arquitectónicas mais importantes do Movimento Moderno, e proposta por Óscar Niemeyer para ser considerado Património da Humanidade pela UNESCO. PREOCUPADOS com as destruições quase diárias, e reconstruções arbitrárias, a que a cidade vem assistindo e que atentam contra a história, as tradições, a evolução e a identidade dos luandenses. NÃO ENTENDENDO igualmente a total ausência de zonas verdes, jardins e parques, impedindo-a de ter os pulmões necessários à absorção da poluição alarmante que sofremos. CONVENCIDOS que o aumento do tráfego, a indisciplina, a falta de campanhas insistentes de educação cívica e moral, estão a desembocar numa situação quase impossível de ser revertida. CONSTATANDO a existência de espaços imensos fora do centro da cidade, susceptíveis de serem utilizados e aproveitados para a construção de prédios altos, em zonas perfeitamente urbanizadas e com a infra-estrutura adequada, com parques de estacionamento e os acessos necessários para que as mesmas permitissem o crescimento, descongestionando o casco urbano existente, sem o descaracterizar. TEMENDO que os novos projectos megalómanos, que descaracterizam Luanda, não tenham acautelado com a profundidade exigível sequer as necessidades em infra-estrutura para o seu adequado funcionamento, e menos ainda questões essenciais, entre as quais ressaltam a ambiental, a ecológica, a cultural, a geofísica e a socio-cultural, E PORQUE OS FACTOS NOS INDUZEM A CRER de que a vontade não é de, com rigor e sentido humanista, levar as pessoas e serviços a desconcentrarem-se, mantendo a ideia de refazer a cidade, mas se continua a centralizar edifícios que poderiam perfeitamente ficar situados na periferia, como é o exemplo flagrante da sede da SONANGOL, DEFENDENDO QUE todas as cidades têm a sua História, e a nossa não é diferente das outras, E PORQUE há que defender a História e o Património de Luanda, mesmo admitindo que já é um pouco tarde, mas ainda assim convencidos que um País sem memória física é um País à deriva, sem identidade, E PORQUE pela dimensão de alguns dos projectos que estão a ser implementados, parece-nos ser legitimamente exigível os estudos ambientais e a mais ampla discussão e auscultação públicas, num acto de verdadeiro respeito pela democracia, REQUEREM a suspensão das acções em curso, e uma análise exaustiva na procura de locais alternativos para o desenvolvimento de todos os projectos que não tenham em consideração a preservação da componente histórica da cidade, do que resta do nosso valioso património arquitectónico, que não é só a cidade dos séculos XVII a XIX, mas também dos edifícios mais significativos do Movimento Moderno. Assídua disse... Iniciativa louvável. É preciso "não deixar calar os bons". Será possível disponibilizar o abaixo assinado Online? Assim os "diasporenses" seriam também incluídos. Já basta deixarem-nos de fora nas questões políticas... 11 de Março de 2009 7:40 Gil Gonçalves disse... Sim! On-line bate bem. 11 de Março de 2009 10:26 Anónimo disse... Excelente iniciativa. Se tiverem a petição online, nós assinamos, com tanto de identificação e e-mail, se necesário. Agora, para quando uma forte campanha de esclarecimento públicda, de que o cidadão José Eduardo dos Santos, conforme a Lei Constitucional Angolana, já não se pode candidatar á presidência da República? Não acham que seria um grande favor para todo o povo angolano, incluindo nós, os militantes do MPLA? 11 de Março de 2009 12:13

segunda-feira, 9 de março de 2009

África, a barbarie guineense e a captura do Presidente sudanês

1- Sem nunca ter tido qualquer (a mínima) simpatia por Nino Vieira (o primeiro golpista da Guiné-Bissau-1980) e sem me preocupar grandemente com os bastidores do crime, direi apenas que o que se passou nos últimos dias em África não pode deixar ninguém indiferente, deixando tudo o resto para a investigação, tanto a criminal como a jornalística.
Deposito, entretanto, muito mais confiança nos resultados do trabalho da Cândida Pinto da SIC do que na intervenção dos polícias locais, se é que ainda existe por lá alguém com este estatuto propriamente dito.
Aos olhos do mundo o continente negro voltou a viver os seus tempos mais sombrios, mais sinistros, mais horripilantes. Depois de termos visto todo aquele sangue, à memória veio-nos imediatamente a história de Patrice Lumumba.
Preso, amarrado, espancado, selvaticamente torturado e morto, o cadáver do nacionalista congolês foi desfeito num tambor de ácido, para nunca mais se ouvir falar dele. Como se isso fosse possível.
Mobutu que o diga. Com o brutal assassinato na passada segunda-feira (2/03) de Nino Vieira, na Guiné-Bissau, África regressou ao seu pior estilo, regressou aos trágicos acontecimentos que foram enchendo a crónica continental ao longo dos anos 60 e 70, com sucessivos banhos de sangue mais ou menos colectivos. O estilo em questão é o das catanadas. Angola, como se sabe também não esteve ausente desta lancinante trajectória, tendo tido, aliás, uma importante e robusta participante estatística no capítulo da eliminação física dos adversários internos e externos com a realização de um dos maiores banhos de sangue de que há memória em África. Com o banho de sangue com que o corpo de Nino Vieira foi abundantemente “lavado” dentro da sua própria casa e ao lado da sua família e após sofrimentos indescritíveis, África voltou a transmitir ao mundo a pior mensagem que se poderia fazer circular nesta altura. África voltou a exportar o horror e a violência sem limites que em poucos minutos fizeram desaparecer do mapa tudo quanto era sinal mais ou menos positivo em matéria de estabilidade mínima para se poder pensar em desenvolvimento. África é novamente a imagem do continente para evitar ou para esquecer. O que se passou na Guiné-Bissau é de facto muito grave. Depois de termos ouvido o “eterno” Zamora Induta, na maior das calmas, dizer que não houve nenhum golpe, ainda ficamos mais assustados, mais perturbados. Meia dúzia de militares esfolam vivo o Presidente da República na sua própria casa e não houve golpe de estado? Os mesmos militares desaparecem da circulação, ninguém os procura, ninguém sabe deles, poucos saberão quem são eles efectivamente e vem o Zamora Induta dizer que não há problemas por aí além, que está tudo controlado e que a constituição vai ser respeitada. Não sei mesmo se haverá um golpe de estado maior do que este, que acaba de ter lugar na Guiné-Bissau.
Sinceramente, não consigo ver um golpe mais perfeito e mais sangrento com a agravante de ninguém saber agora quem vai ser o próximo a ser esfolado pelos militares, caso mais algum político se lembre de os incomodar.
De facto quando se retira da circulação o principal simbolo do estado que é o seu Presidente da República a golpes de catana, não pode haver mais dúvidas nenhumas em relação ao facto de ter havido um golpe de estado na Guiné-Bissau.
Que maior ameaça pode pesar sobre um regime democrático do que estar refém da violência e da impunidade dos militares? Viver na Guiné-Bissau passa a ser a partir desta semana um risco ainda maior, para quem pensar que o país já é um estado democrático e de direito.
Esqueçam esta suposição. A Guiné-Bissau é um buraco, é uma verdadeira armadilha montada pelos militares, ficando por saber em toda esta trama qual é o papel dos tais traficantes colombianos que andam por lá a pavonear-se e, pelos vistos, a influenciar a vida política do país de forma cada vez mais ostensiva com meia dúzia de tostões e uns tantos hamers.
A recente troca de acusações entre Nino e Tamaio com o tema do tráfico no meio da disputa entre os dois históricos defuntos, fala bem desta influencia e do seu impacto pernicioso na vida dos guineenses.
Depois de Luanda, a Guiné-Bissau já é mais um espaço geográfico do nosso planeta onde se pode aplicar o principio de Murphy segundo o qual nada está tão mau que não possa ficar pior. O Manecas Costa, o único ídolo que tenho nesta altura na Guiné-Bissau, que me perdoe, mas para a sua Guiné (onde só estive uma vez na minha vida) não viajo nunca mais, nem com tudo pago, colete à prova de bala e demais garantias de segurança. Só tenho pena é do Amílcar Cabral. Ele não merecia isso.
Felizmente que a sua outra pátria, Cabo-Verde, hoje virou mesmo jardim, como história de sucesso da democracia e da boa-governação em Africa.
Uma realidade que ultrapassou mesmo o sonho marxista de Cabral e do seu partido único, o PAIGC. 2- O Presidente do Sudão, um tal de Al Bachir, que anda para ali a mandar matar os nossos patrícios em Darfur (mas não só) foi, finalmente, “promovido” à categoria de arguido e mandado capturar pelo Tribunal Internacional. Todos criticavam o califa de Karthoum, que, entretanto, se estava nas tintas para tudo e todos ao mesmo tempo que prosseguia implacável a sua caça ao homem com as suas selváticas milícias. Com este mandado os seus colegas de poleiro que o criticavam dias antes por estar a patrocinar limpezas étnicas começaram, entretanto, a pensar melhor, talvez a pensar na sua própria situação, tendo chegado à rápida e óbvia conclusão que o pobre do Bachir não pode cair na alçada de um tribunal qualquer, porque os Presidentes em África estão acima da lei nacional e internacional. Al Bachir é mais um cromo sangrento desta África violenta que nos decepciona profundamente e nos faz envergonhar todos os dias. O mandado de captura que agora pesa sobre ele traduz bem os extremos a que se chega em África onde a impunidade dos poderosos faz deles verdadeiros deuses da morte nas nossas terras. Devido ao seu petróleo, dificilmente Al Bachir será algum dia capturado, mas por si só este mandato de captura já é a melhor “condecoração” que lhe poderia ser oferecida depois de ter mandado cometer tantas atrocidades contra os seus nacionais. E agora não me venham cá com tretas sobre soberanias nacionais. Quando alguém passa o seu reinado a trucidar os seus conterrâneos, seja por que razão for, alguém tem que o mandar parar. De outra forma os massacres vão continuar e as organizações internacionais não passarão de alegres clubes onde os diplomatas se vão divertir e gastar o dinheiro dos contribuintes discutindo e aprovando resoluções cheias de nada.

terça-feira, 3 de março de 2009

General Kangamba, o mediático

A única coisa que a imprensa luandense, que tem vindo a cobrir com alguma regularidade as movimentações políticas, desportivas e sociais do General Bento Kangamba, ainda não "descobriu" é onde é que a mediática figura vai buscar os seus rendimentos, enquanto empresário, como também ele é apresentado em público.
Esta semana o nóvel General conseguiu a proeza de ter sido notícia, pela positiva, em três semanários luandenses, a saber: Angolense, Capital e Agora.
Se calhar até foi citado por mais outros, que não tivemos a oportunidade de ler.
Agora parece que também é a "kangambar" que a imprensa local se faz entender melhor, num país onde os jornais privados são, por regra, muito pouco "simpáticos" no tratamento dispensado a figuras ligadas ao poder.
Este não é, certamente, o caso de Bento Kagamba que, nesta altura, pela visibilidade mediática que conseguiu atingir já é uma espécie de novo "herói" da opinião pública menos atenta aos bastidores da movediça realidade angolana.

As parangonas da semana

segunda-feira, 2 de março de 2009

A crise é para todos: A Sonangol não pode continuar a agir como se fosse um outro estado

1-A Sonangol Holding, SH, (será que ainda tem o estatuto de EP?) para além de outros pergaminhos, também é conhecida por ser uma empresa que nunca apresentou em público as suas contas devidamente auditadas. É pelo menos esta a informação que temos visto, com alguma frequência, aqui e acolá, sempre que alguém de dentro ou de fora faça uma abordagem mais em profundidade sobre o desempenho do sector petrolífero angolano. Já é mesmo uma imagem de marca da SH não auditar as suas contas. Em termos de prestação de contas, a Sonangol habituou-nos, uma vez por ano, por ocasião do seu aniversário e em conferência de imprensa, a umas “dicas” provisórias sobre os resultados globais da sua actividade. Foi o que aconteceu uma vez mais este ano, por ocasião do 33º aniversário da holding, com o garboso Engenheiro Manuel Vicente rodeado por todo o seu “staff”, a debitar para a comunicação social os habituais milhões que agora já são biliões, graças aos quais o país se vai mantendo à superfície de uma navegação financeira que, entretanto, se complicou bastante depois de tudo quanto tem estado a acontecer à escala planetária em matéria de crise e de impactos. É absolutamente normal fazerem-se conferências de imprensa, pelo que não há nada a apontar ao facto da Sonangol comunicar aos jornalistas os seus resultados dando assim a conhecer ao país a sua saúde ou a falta dela. A ter em conta os últimos dados avançados pelo seu PCA, a Sonangol continua a respirar saúde q.b., e a alimentar o País com as necessárias receitas que o OGE tanto precisa para dar conta do seu recado nas várias frentes a que tem de acudir. Estas contas são, entretanto, do ano passado, pelo que, ainda não reflectem a nova conjuntura económica internacional que tem estado a afectar particularmente o preço do petróleo, com todas as consequências que se adivinham para a redução dos biliões a que a Sonangol está habituada. 2-Como não estivémos na conferência de imprensa não temos uma ideia das perguntas que foram colocadas a Manuel Vicente e aos seus pares. Se lá estivéssemos estado, certamente que lhe perguntaríamos pelas razões que estão na origem da Sonangol, também ter como imagem de marca, o facto de não apresentar em público as suas contas auditadas. Antes de mais talvez fosse necessário explicar aos menos entendidos nestas lides o que é que significa auditar, para todos sabermos exactamente do que é que estamos a falar e de qual é a nossa grande preocupação em relação ao desempenho da Sonangol. Na sequência de uma volta rápida pelo Wkipédia “descobrimos” que auditoria “é um exame cuidadoso, sistemático e independente das actividades desenvolvidas em determinada empresa ou sector, cujo objectivo é averiguar se elas estão de acordo com as disposições planeadas e/ou estabelecidas previamente, se foram implementadas com eficácia e se estão adequadas (em conformidade) à consecução dos objectivos. As auditorias podem ser classificadas em externa e interna. Os profissionais de auditoria de demonstrações financeiras são certificados e devem seguir rigorosas normas profissionais nos Estados Unidos e em diversos outros países. Entre as principais empresas de auditoria independente (e externa) estão: Deloitte, PwC, KPMG e Ernst & Young”. De facto uma coisa é uma conversa com jornalistas, por mais acutilantes e incisivos que os profissionais possam ser na colocação das suas perguntas, a outra é a empresa apresentar ao auditor interno ou externo, toda a informação existente para que se possa aferir, com a necessária propriedade, se a sociedade está efectivamente a ser bem gerida. Sabemos por exemplo, que por força da nossa própria lei as empresas públicas são obrigadas a apresentar ao Ministério das Finanças os elementos demonstrativos da sua situação financeira e patrimonial que permitam a elaboração da execução do Balanço do OGE. 3-Ao abrigo da lei angolana, a Sonangol deve encaminhar ao Ministério das Finanças, até ao final do dia 31 de Março de cada ano um Relatório de Contas integrado pelo relatório do Conselho de Administração, o balanço e demonstração de resultados e a proposta sobre a sua aplicação, a demonstração da origem e aplicação de fundos, o parecer do Conselho Fiscal. Depois disto, a Inspecção Nacional de Finanças emite um parecer sobre os documentos apresentados e remete o mesmo a apreciação do Ministro das Finanças e do Ministro que superintende o sector de actividade. Em concreto, a questão que colocaria ao PCA da Sonangol se tivesse ido a conferência de imprensa, seria saber se a sua empresa está efectivamente abrangida por este regime e se tem cumprido com o mesmo. Depois disto e em função da sua resposta, perguntar-lhe-ia se era possível a opinião pública ter acesso as demonstrações previstas nas exigências da lei, particularmente aquela que tem a ver com a origem e a aplicação de fundos, por causa das movimentação da petrolífera angolana além fronteiras e para além das suas competências estatutárias. Ao ouvir-se o Eng Manuel Vicente falar, fica-se com a impressão que de facto a Sonangol é um estado dentro de um outro estado, ficando por saber qual é o estado que tem mais poder. Se o nosso Estado, se o Estado da Sonangol? É que, pela lei, a Sonangol não pode de per si decidir o que é que vai fazer no próximo ano, sem antes o seu plano ser aprovado pelo Governo, que é o único proprietário da empresa. Compete efectivamente ao Ministério das Finanças em regime de autorização prévia, autorizar a Sonangol a tomar decisões em matérias como aumento de capital e emissão de obrigações, convertíveis ou não em acções ou quaisquer outros títulos e valores mobiliários. 4-Por tudo isto e por muito mais é que achamos que a Sonangol, enquanto empresa pública, deveria ter a rédea um pouco mais curta. Neste momento de profunda crise a afectar tudo e todos, custa-nos um bocado ouvir Manuel Vicente dizer que a Sonangol vai continuar a gastar recursos públicos no exterior como até aqui, com planos para incrementar ainda mais esta movimentação que é claramente perdulária para muitas apreciações. Já ficou claro, que não há o mínimo de consenso em relação a estratégia que a Sonangol tem vindo a seguir com os tais investimentos na praça portuguesa. Não seria mais ajuizado Manuel Vicente fazer primeiro as contas com o Governo das suas últimas compras, apresentar o seu programa de investimentos e só depois vir cá para fora dar-nos a conhecer como é que a Sonangol vai evoluir este ano? Ao que parece e depois dos pronunciamentos feitos esta semana pelo seu PCA, a Sonangol vai continuar a comportar-se no exterior como se nada de grave tivesse acontecido, ignorando mesmo a brutal quebra verificada com as acções que comprou no BCP. Não basta MV vir dizer-nos que a Sonangol não perdeu milhões e ponto final. Tem de prová-lo o que só será possível com uma auditoria independente às suas contas, que tarda em ser feita, se é que algum dia o será. Como é evidente, não podemos estar de acordo com esta postura e o mínimo que exigiríamos da administração da Sonangol é que ela nos convencesse, no âmbito de um debate contraditório com especialistas e políticos, que o rumo que pretende continuar a seguir é aquele que realmente mais interessa ao país. Atenção, tem de ser efectivamente um debate contraditório. 5-Esperemos que a próxima interpelação ao Governo já solicitada pela bancada parlamentar do MPLA, venha a traduzir-se num bom momento de forma política, frontalidade e transparência, para que este debate tenha lugar em nome da defesa do que é realmente o interesse público. Neste momento de crise é possível mobilizar os angolanos independentemente das suas diferenças, desde que o Governo seja o primeiro a fazer prova de que está realmente de boa fé na reavaliação que pretende fazer da sua intervenção. As vacas emagreceram. É preciso que seja o Governo e os seus titulares a apertarem realmente o cinto, com a redução do gasto público que alimenta o seu exagerado (verdadeiramente pantagruélico) consumo privado, porque cá em baixo (na secção dos famélicos) já não é possível poupar mais.