segunda-feira, 28 de maio de 2012

A lógica de Falcão ou a história das favas contadas...

Na sua mais recente entrevista a um órgão de informação estrangeiro, o porta-voz do MPLA, Rui Falcão disse uma "verdade" que chamou particularmente a minha atenção.
Aliás, repetiu esta "verdade", pois não é a primeira vez que ele faz tais contas com os números de militantes que o seu partido diz possuir, estabelecendo depois a inevitável lógica política eleitoral, o que é absolutamente normal do ponto de vista de qualquer discurso propagandístico partidário.
Antes de mais, convém salientar que não há para já no nosso ordenamento nenhuma instância independente reguladora da actividade partidária capaz de confirmar algumas informações mais sensíveis, como é esta dos números de militantes.
Em meu entender acho que também não é necessário, pois o resultado das eleições quando elas são efectivamente transparentes, é suficiente para confirmar a representatividade dos partidos e a consistência da sua respectiva propaganda.
Isto para dizer que qualquer partido pode dizer o que bem quiser à volta do seu acervo humano, que não há ninguém que lhe possa pedir responsabilidades.
Um partido pode dizer que tem 5 milhões de militantes e subir a fasquia para oito ou para dez na semana seguinte, que ninguém tem legitimidade para lhe pedir contas, em termos de confirmação, sobre a veracidade de uma tal declaração.
Para sermos mais concretos passamos a citar a declaração de Rui Falcão que chamou a nossa atenção.
“O MPLA, hoje, tem mais de cinco milhões de militantes, membros efectivos do Partido. Se nós fizermos contas e podermos somar a esses militantes os amigos e simpatizantes, o número crescerá substancialmente.
Um Partido, como o MPLA, que tem, ele próprio, mais de 60 por cento de votos garantidos não tem necessidade de não cumprir regras. O fantasma da fraude, ou de qualquer outra coisa, advém daqueles que sabem, antecipadamente, que não têm capacidade para ganhar as eleições. Quando eu lhe digo que o MPLA tem mais de cinco milhões de militantes, é preciso agregar a isso que esses cinco milhões de militantes estão organizados em cerca de 50 mil organizações de base.”
Do ponto de vista da propaganda partidária em ano de eleições este discurso é perfeito, mas pode ser igualmente usado pelos outros partidos, salvaguardadas as devidas distâncias.
Com menos enfase, note-se, a UNITA também faz recurso a este argumento do número de militantes estabelecendo a mesma lógica eleitoral que o seu adversário.
Por exemplo um partido aparentemente menos expressivo que o MPLA e a UNITA está igualmente no direito de afirmar que com base no seu cadastro de militantes tem mais de um milhão de potenciais eleitores, entre militantes, simpatizantes, amigos e familiares, o que de imediato lhe permite afirmar que em circunstância alguma irá aceitar que o seu resultado eleitoral seja muito inferior a este potencial e muito menos que o seu desempenho venha a ser passível de extinção ao abrigo da draconiana cláusula do 0,5%.
A outra questão que a declaração do porta-voz do MPLA levanta tem a ver com a colagem directa da massa militante de um partido ao seu resultado eleitoral.
Como sabemos em eleições transparentes, isto é, sem fraudes nem manipulações, não há vitórias antecipadas e muito menos favas contadas.
Também sabemos que os partidos quando estão no poder observam habitualmente a sua massa militante engordar por razões que têm mais a ver com a procura de facilidades/protecções/privilégios por parte de quem adere, do que propriamente políticas ou de outra natureza mais ideológica.
Em meu entender e pelo conhecimento que tenho da realidade angolana, com base no que aconteceu em 2008, não tenho dificuldades nenhumas em admitir que o cartão de militante nem sempre condiz com o cartão de eleitor, incluindo os que optam pela abstenção, o que para mim é absolutamente saudável do ponto de vista democrático. 

A leitura sobre a abstenção do ponto de vista político não é fácil e muito menos consensual.
Em definitivo, a lógica de Falcão não é uma lógica matemática, nem poderia ser, até porque o terreno da política, mesmo em realidades democráticas embrionárias, como é a angolana, é sempre movediço e propenso a muitas surpresas. 
Não há eleições com controlo remoto.
A recente história das eleições nas democracias multipartidárias está cheia de exemplos destes, com espectaculares reviravoltas nas previsões e nas sondagens.