sábado, 28 de novembro de 2009
O discurso presidencial e a erradicação do "segundo flagelo"
Desde logo e com todas as cautelas que é preciso observar na abordagem do discurso político oficial, quando, sobretudo, ele se apresenta com propósitos reformadores/moralizadores, temos que convir que desta vez o Presidente José Eduardo dos Santos soube, de algum modo, quebrar a linha defensiva do nosso “cepticismo estratégico” do qual, acabamos por ser mais vítimas, do que responsáveis.
Sendo o actual “país real” o grande responsável por tal “limitação” da nossa perspectiva que, acreditamos, atinge todos os angolanos imunes à propaganda em maior ou menor grau, tem que ser esse mesmo “país real” a funcionar como o seu melhor e mais eficaz antídoto, naturalmente com matizes radicalmente diferentes.
Tal desiderato só será possível alcançar com acções práticas e consequentes, orientadas com determinação e muita vontade política para a erradicação do “segundo mal”, que agora, pelos vistos, passou para o lugar da frente, caladas que estão as armas da guerra, já lá vão mais de 7 anos.
Ao reconhecer como reconheceu a incapacidade do MPLA, de que é líder incontestável, em controlar o seu “pantagruélico” Governo, o Presidente JES escancarou as portas para ser ele o principal alvo de todas as críticas em nome da coerência, pois como se sabe ele é igualmente o grande responsável desse mesmo governo.
Apesar de JES ser um “animal político” por excelência, com mais de trinta anos de experiência no poder, gostaríamos de acreditar que, desta vez, algo mais, para além da sua própria sobrevivência e prestígio, em vésperas de mais um Congresso, o levou a admitir que as coisas não andam nada bem no território que ele continua a controlar melhor do que ninguém, com todas as falhas que ele próprio também já admite nas linhas e entrelinhas do seu discurso.
Assim sendo e enquanto se aguardam pelas consequências das suas palavras que já começaram, entretanto, a fazer-se sentir, como o atesta o (ainda) lacónico comunicado da PGR, divulgado na passada terça-feira, vamos admitir que o país, conforme soube acabar com o flagelo da guerra dos canhões, pode estar agora a dar inicio ao combate decisivo contra o “segundo flagelo” que é bem mais difícil de erradicar, mas já com algumas certezas garantidas quanto ao seu sucesso a médio prazo.
Chamem-lhe corrupção, chamem-lhe falta de transparência, chamem-lhe má distribuição do rendimento nacional, chamem-lhe o que bem e melhor entenderem, mas de facto esta “guerra” contra a apropriação indevida dos recursos públicos por uma minoria de angolanos, não pode ser adiada por mais tempo, sob o risco de estarmos apenas a edificar um barril de pólvora, por mais prédios que se construam na atafulhada e cada vez mais intransitável baixa de Luanda.
Gostaríamos sinceramente de convencer os dirigentes deste país a entenderem, de uma vez por todas, que quanto mais recursos públicos forem desviados para os bolsos de particulares, mais difícil será fazermos tudo o resto, que é o que já está a acontecer, diante da persistência negativa dos índices do nosso desenvolvimento humano.
Por tudo isto e por muito mais e em nome da urgência de se alterarem as actuais e preocupantes tendências, aqui estamos, desta vez a tentar ver uma luz no fundo do túnel que as palavras de JES podem ter acendido.
PS- Este texto resultou de um pedido que me foi formulado pelo Novo Jornal para comentar a intervenção feita por JES na reunião do CC do MPLA realizada a 19 de Novembro.