Não tem como não fazer parte desta saga, a não ser, que aconteça mais algum "milagre", quando esta parte da nossa história for escrita.
Foi a primeira angolana a enfrentar José Eduardo dos Santos e Jonas Savimbi na corrida ao cadeirão presidencial para o qual, diga-se de passagem, ainda ninguém foi democraticamente eleito.
Talvez seja esta a sua derradeira consolação e dos 11.475 angolanos (0,29%) que votaram nela em 1992.
Por si só este facto é mais do que suficiente para lhe prestarmos aqui a nossa homenagem na hora do adeus aos 68 anos de idade, 18 dos quais dedicados à politica activa em Angola, após o seu regresso ao país no inicio da década de 90, com os ventos de Bicesse.
Mas há muito mais na sua trajectória que merece atenção e destaque para quem observa a vida política angolana com olhos de ver para além do cardápio que nos é servido pelo banquete oficial.
Anália de Victória Pereira foi de facto uma mulher corajosa (no sempre volátil contexto político angolano) que se destacou como líder de um partido da oposição, pelas suas contundentes críticas à governação do MPLA, particularmente na vertente da (falta) transparência do Executivo e da manipulação da comunicação social.
Anália nunca gostou de engolir sapos e sempre que pôde, nomeadamente na Assembleia Nacional, soube chamar as coisas pelos seus próprios nomes, o que fez dela uma das referências da oposição parlamentar mais detestadas pela bancada do maioritário.
Um lamentável incidente com a sua pessoa, no âmbito de uma acesa troca de galhardetes com um colega da situação ficou famoso pela negativa depois da sua reputação mais intima ter sido posta em causa.
Um conhecido semanário da capital "nomeou-a", com Vicente Pinto de Andrade, para a categoria dos "dois não negros mais atrevidos" que, entretanto, na avaliação do seu editor, só teriam alguma chance de chegarem à Presidência da República "se houvesse um terramoto de uns fortes graus na escala de richter e de mercalli".
O mesmo semanário tentou traçar-lhe o destino e refrear-lhe as ambições ao sentenciar que seria mais fácil um camelo passar pelo buraco da agulha do que Angola vir a ter um Presidente mulato.
De facto Analia não conseguiu chegar à Presidência.
O terramoto da vida pregou-lhe a última partida numa escala que não poupa ninguém, incluíndo certos profetas que continuam a fazer leituras da realidade africana que são cada vez mais desfocadas, que têm cada vez menos a ver com o que os africanos realmente pensam, quando têm a oportunidade de escolher livremente os seus dirigentes.
Desta vez não se trata de um lugar comum.
Como mulher, Anália deixa efectivamente um grande vazio na política angolana que vai ser muito dificil preencher.