Se os livros produzissem milagres, aqui está um em que gostaríamos, muito sinceramente, de acreditar, antes de mais por que está perfeitamente ao alcance de todos nós, enquanto profissionais do jornalismo.
O milagre em causa seria o de termos o único diário angolano a acertar, finalmente, o passo com a realidade complexa e contraditória de um país em transformação, que já proclamou no seu solo todas as liberdades fundamentais, começando pela própria liberdade de imprensa, que é aquela que mais nos preocupa.
Não queremos dizer com isso, que o Jornal de Angola (JA) esteja totalmente alheio a esta realidade que diariamente nos é apresentada nas suas colunas sem qualquer termo de comparação mais próximo.
Como se sabe o matutino continua a liderar este importantíssimo segmento do mercado jornalístico sem qualquer concorrente à vista, pelo simples facto deles não existirem.
Dizer que o Jornal não é de Angola, seria, manifestamente, uma injustiça que não queremos, nem devemos cometer, reconhecendo desde logo os altos e baixos (mais baixos do que altos) de um projecto que tem como grande limitação editorial alguns limites mais sensíveis que, aparentemente, lhe são impostos pelo seu próprio proprietário ou pelos seus representantes.
Dizemos aparentemente, para descontar o fenómeno conhecido por excesso de zelo tão cultivado pelos quadros intermédios da “nossa nomenklatura”, o que também se entende, conhecendo nós, razoavelmente bem, o país real que estamos com ele todos os dias.
De facto não há outra forma de se fazer carreira, particularmente ao nível do chamado aparelho ideológico. De outra forma, a porta da rua é mesmo a serventia da casa. Todos nós sabemos que é assim. Não adianta disfarçar.
Um destes limites está claramente reflectido na ausência de qualquer reparo mais crítico (ou mesmo satírico) à figura de Sua Excelência, com algumas raríssimas excepções pelo meio, sendo a mais (re) conhecida a do colunista João Melo, que tem sabido fazer a diferença pela positiva (opinião publicada) no seio da sua “grande família”.
Agora, não temos qualquer dúvida em afirmar que o JA pode fazer muito mais jus ao nome do seu grande título (com mais de um milhão de km2) do que actualmente o faz.
O défice que é particularmente notório na atenção que devia dedicar a outra Angola. Ao país que não é oficial, ao país que não está ligado ao poder, ao país que não ouve nem comenta discursos, ao país do cidadão-comum, ao país da exclusão social e da pobreza generalizada, ao país que renasce todos os dias mas que ainda não acredita no futuro, ao país do cidadão revoltado com as demolições de todos os camartelos, ao país que ainda está muito longe de ser reflectido convenientemente nas colunas do matutino.
Não queremos dizer que o JA não publica notícias ou reportagens deste outro país, que acaba, entretanto, por ser residual na distribuição do espaço total que o jornal dedica ao país no seu conjunto.
Se este "Livro de Estilo" permitir que o Jornal de Angola se aproxime mais deste país que é tão nosso quanto o outro, ajudando, como se propõe, os profissionais do JA "a produzirem mensagens informativas com elevada qualidade", então teremos consumado o milagre em que gostaríamos, sinceramente, de acreditar.
Até lá, vamos continuando a ler o JA com saudades do nosso extinto "Diário de Luanda"…
Na altura, há mais de 30 anos, pelo menos tínhamos uma alternativa ao nível
da imprensa diária, que tarda em ressurgir, outro milagre em que gostaríamos de acreditar em 2009.