Sem o dizer explicitamente no texto da sua mais recente declaração, a UNITA na voz do seu líder, Isaías Samakuva, voltou a ameaçar com o seu abandono da Comissão Constitucional (CC), caso o MPLA mantenha a intenção de ir para a frente com o seu sistema atípico político-eleitoral que elimina do futuro mapa constitucional a eleição presidencial, entre outras "originalidades" constantes do Projecto C.
Nesta altura do debate, segundo a UNITA, são dez as questões em relação às quais não foi possível obter qualquer consenso.
"A UNITA considera que a Constituição de Angola deve reflectir a vontade de todos e não apenas de um Partido. Existem pelo menos dez questões sobre as quais não há consenso no seio da Comissão Constitucional, das quais destacamos: a questão da terra; a conformidade dos símbolos nacionais ao regime democrático; o sistema de governo; o controlo e tutela da comunicação social do Estado pelo Executivo; a independência da justiça eleitoral; a descentralização política; a gratuitidade do ensino para todos até ao nível médio; e as disposições transitórias."
As preocupações da UNITA estão, entretanto, concentradas na legitimação da figura do Chefe de Estado/Presidente da República.
"Há uma questão de fundo que não pode ser resolvida com o princípio da maioria. É a questão do sistema de governo, que inclui tanto o modo de eleição do Presidente da República, como a separação e a interdependência dos poderes dos órgãos de soberania. Esta é uma questão legal que o princípio maioritário deve respeitar, porque o princípio da maioria deve subordinar-se ao princípio da legalidade. Ou seja, só se utiliza a votação para se decidir sobre questões legais. Os Deputados não podem votar questões ilegais. A proposta do MPLA é ilegal porque viola dois princípios que a Lei impõe ao poder constituinte como limites materiais, nomeadamente o princípio da eleição directa e o princípio da separação de poderes".
Samakuva acha que o debate só pode prosseguir com a presença do seu partido na Comissão Constitucional depois do Tribunal Constitucional se pronunciar sobre esta matéria.
"A UNITA considera que a eleição do Presidente da República deve ser formal e materialmente diferente da eleição dos Deputados. As eleições presidenciais e legislativas podem ocorrer no mesmo dia, mas devem ser separadas; quer dizer, deve haver dois boletins de voto e duas urnas para estas duas eleições.
Por esta razão, achamos que a Assembleia Nacional deveria recorrer ao Tribunal Constitucional (TC) para interpretar a lei e resolver esta questão, emitindo uma opinião vinculativa e definitiva. Não podemos pactuar com ilegalidades. Por isso, não iremos participar em nenhuma votação de ilegalidades."
O recurso ao TC, caso ele venha a acontecer, apresenta-se apenas como um ligeiro obstáculo na marcha do rolo compressor do MPLA que tem na sua agenda o mês de Janeiro para fazer apovar na CC o texto da sua eleição e o primeiro trimestre do corrente ano para dar por concluído todo o processo constituinte.
Ao que se sabe, nesta altura, a própria UNITA devido à sua reduzida representação parlamentar não tem capacidade legal para convocar o Tribunal Constitucional, o que dificultará bastante a concretização desta sua "manobra dilatória".
Mas mesmo que a UNITA consiga que o TC venha a emitir o acórdão solicitado, também é muito pouco provável que aquele organismo, devido à sua composição política, lhe deia razão.
Neste particular admite-se, entretanto, que o TC venha a enfrentar o seu mais complexo desafio desde que foi criado em 2007, considerando que o artigo 159 da actual Lei Constitucional, relativo aos limites materiais do poder constituinte, não deixa muito espaço para manobras juridico-políticas favoráveis aos actuais e conjunturais desígnios do MPLA/JES.
Nesta batalha ao nível da opinião pública contra o rolo compressor do MPLA, a UNITA parece ter perdido mais uma batalha importante, pois até ao momento a campanha de recolha de assinaturas está muito longe de se ter aproximado da fasquia do milhão de cidadãos.
Seria de facto uma grande oportunidade para a UNITA sustentar com factos a tese da fraude eleitoral que diz ter sido vítima em 2008, onde o seu score rondou os 400 mil votos.