domingo, 25 de abril de 2010
(FLASHBACK-ABRIL 2001)- Luanda, as obras e a paciência que se esgota
Ponto prévio: Este artigo dado à estampa há cerca de dez anos, parece ter sido escrito ontem.
Passados que são já alguns, longos e penosos meses desde que Luanda entrou em obras, pode-se dizer que a nossa cidade está actualmente transformada numa verdadeira máquina trituradora de carne humana.
De facto os luandenses e todos os seus convidados nacionais e estrangeiros que se atrevem a circular pelas principais artérias da capital estão a ser diariamente triturados pelas máquinas de um governo que mesmo quando quer facilitar, acaba por complicar demasiado a vida dos cidadãos, a tal ponto que as pessoas ficam sem perceber o que realmente se pretende.
Para consolação temos uma administração que todos os dias nos pede desculpas pelas antenas da rádio e da televisão, sabendo à partida que quer as aceitemos quer não, as coisas vão continuar a sua marcha. Lentamente.
Como se as desculpas curassem alguma coisa. Como se as desculpas nos devolvessem os neurónios gastos a pensar nervosamente, desesperadamente, em mil e uma alternativas para não sucumbirmos ao cerco total que o Governo montou a esta cidade de São Paulo de Assunção que já foi de Loanda, quando era mais pequena, mais simpática e mais colonial.
Luanda agora escreve-se com um ú apertado, que todos os dias se afunila ainda mais, com todos os prazos de conclusão das diferentes obras já ultrapassados.
(…)
Mas que estranhas obras públicas serão estas que por onde passam deixam a população ainda pior do que já se encontrava?
Para agravar tudo e mais alguma coisa, a caprichosa terra angolana descobriu este ano os prazeres dos banhos de chuveiro, depois se ter cansado da caneca; estamos naturalmente a falar dos famosos banhos de lata que têm entre os angolanos os seus maiores apreciadores à escala planetária. Por razões técnicas, um bom banho de lata, note-se, é para ser tomado a dois. Note-se igualmente que a humanidade deu um salto importante na sua evolução quando descobriu o chuveiro.
Foram exactamente estes intensos banhos de chuveiro que vieram refrescar a memória de todos nós que a certa altura ainda acreditamos que Luanda tinha finalmente entrado em obras para resolver os seus graves problemas estruturais. Nada disso. Afinal, está-se apenas a dar uns toques nos passeios e nos jardins e pouco mais, com a edificação de umas “estranhas” passagens inferiores e superiores pelo meio, com que se pretende devolver, em termos mais visuais do que práticos, o “orgulho” perdido da capital.
(…)
Ficamos a saber, sem saber exactamente de que se trata, que Luanda já tem, faz algum tempo, um estudo elaborado pelo Banco Mundial sobre as linhas mestras de desenvolvimento das suas infra-estruturas. Mais do que isso o referido “manual” já recebeu a bênção do próprio executivo que, pelos vistos, só agora com as chuvas parece ter tomado uma decisão em relação à sua implementação. Muito mais do que isso e para nosso espanto total, ficamos igualmente a saber que Luanda continua a não ter um Plano de Desenvolvimento da Cidade, que só agora vai começar a ser elaborado por um grupo de trabalhos que ainda nem sequer foi constituído.
Enquanto procuramos saber algo mais sobre as tais linhas mestras do Banco Mundial, a sentença, em forma de “atestado de incompetência”, já foi ditada.
Luanda representa demasiada areia para o “katukutuku” de Aníbal de Rocha, tendo a este respeito o governador ouvido do “Camarada Presidente” alguns “mimos” que passamos a citar pela importância das suas prováveis consequências futuras.
“ A ordem de grandeza e a complexidade dos problemas acumulados ultrapassa de longe a capacidade e a competência das administrações locais do Governo Provincial, para os equacionar e resolver”.
Caro Aníbal,
Posto isto só nos resta desejar-lhe boa sorte para o resto da caminhada que se propôs realizar, com a certeza de que Luanda é Angola e o resto é mato, estando por isso mais ou menos condenadas ao fracasso todas as tentativas de se governar a capital a partir de uma estratégia de poder local.
Por outro lado, fica de algum modo difícil perceber quem é que está efectivamente a coordenar ( se é que existe mesmo alguma coordenação) as obras que transformaram Luanda no actual suplício para os seus habitantes.
Pela informação colocada na via pública fica-se com a ideia de que a maior parte das obras nem sequer tem como proprietário o Governo de Luanda, tendo sido as referidas encomendadas por organismos da administração central.
Assim sendo estaremos certamente a cometer alguma injustiça se apenas transferirmos para o vetusto palácio da Ingombota todo o nosso desconsolo pelas privações, verdadeiras torturas diárias, a que temos vindo a ser sujeitos.
Seja como for, o rosto que mais tem dado a cara em toda esta “trapalhada” é efectivamente o de Aníbal Rocha.