Elogiei na ocasião o CPL pela escolha do tema, porque acho que tudo quando diga respeito a resgate de valores estruturantes é da maior importancia para uma sociedade à deriva como a nossa, em que os interesses da conjuntura são agora aqueles quem mais ordena.
Como é evidente o MPLA, por razões óbvias, tem uma grande responsabilidade política pelo actual estado de coisas, estando por isso (também) nas suas mãos, a responsabilidade de inverter as tendências mais preocupantes que actualmente infernizam a vida dos angolanos, sobretudo com a adopção de políticas públicas mais consentâneas com as prioridades sociais, o que passa necessariamente por uma melhor distribuição do rendimento nacional, tendo como referência principal o emprego e o salário e o combate contra a má gestão do erário público.
A perspectiva geral da mesa redonda organizada pelo CPL não teve exactamente em linha de conta a dicotomia entre valores e interesses que eu fiz questão de destacar nas breves considerações que teci como moderador da prelecção de Luís Kandjimbo que abordou o papel da sociedade civil perante os imperativos do resgate dos valores culturais.
Estou convencido que a crise de valores que hoje vivemos também é o resultado da forma como este país tem estado a ser governado pelo MPLA, num processo que já leva mais de três décadas e que já conheceu várias etapas distintas do ponto de vista dos objectivos a alcançar.
Claramente esta última etapa, que tem a ver com a implantação da economia de mercado, tem sido muito má para a preservação dos valores estruturantes da nossa sociedade, da nossa dignidade e da nossa angolanidade.
O individualismo, o egoísmo, a ganância, a insensibilidade, o salve-se quem puder, a truculência, a corrupção são os novos valores que têm estado a corroer o nosso tecido social e de que maneira, contribuíndo para a completa fragilização das relações humanas com base no respeito pelo outro e na solidariedade humana.
Mesmo dentro da mais elevada hierarquia do MPLA, sente-se que as pessoas agora só se movimentam com alguma determinação, se os seus interesses, pessoais ou de grupo, estiverem em causa, ou se houver mais alguma vantagem para amealhar no cofre das poupanças pessoais ou para alocar ao pacote dos investimentos patrimoniais.
A administração pública transformou-se na principal arena das disputas de interesses que integram a colorida manta de retalhos ou enchem o saco de gatos em que se está a transformar o MPLA, com todas as consequências conhecidas.
Foi pois muito bom que o CPL tenha inscrito na sua agenda a questão do resgaste dos valores, mesmo se a sua perspectiva não tenha tido em devida conta o peso negativo e preponderante dos interesses da conjuntura, que são alimentados sobretudo pela superestrutura e que acabam depois por esvaziar os discursos politicamente correctos e recheados de boas intenções.
O CPL que já deu sinais claros que não está de acordo com algumas intervenções mais musculadas do GPL, pode ir muito mais longe e aprofundar este debate em torno dos valores vs interesses, chamando a atenção da hierarquia para a sua importância e para a sua assumpção.
Nesta campanha, o CPL não se pode esquecer que, muito dificilmente, a sociedade irá acreditar nos seus propósitos moralizadores, se o exemplo não partir de cima, do topo da hierarquia que nos governa, mas que tantas vezes nos ignora ou nos hostiliza.
Identificadas que estão as fragilidades e os desvios na base da nossa sociedade, é mister que se olhe com muita atenção para o topo da pirâmide, de onde os exemplos que nos chegam também não são nada animadores e acabam, muitas vezes, por justificar todos os outros atropelos.
(cont)