quinta-feira, 23 de julho de 2020

A Transparência e a Actividade Jornalística (Nov-2004)*


[O jornalismo é mais um produto que está no mercado, com todas as características especiais que possa ter, que de facto existem, e são pacificamente reconhecidas por todos, entre produtores e consumidores.
Sendo um produto que circula no mercado está naturalmente sujeito à fiscalização, sendo aqui igualmente especial este tipo de acompanhamento, feito antes de mais pela consciência crítica e a capacidade de observação de cada um dos consumidores.
Em qualquer produto para consumo humano, o que mais preocupa o consumidor é saber se ele está ou não contaminado com alguma bactéria ou vírus mais ou menos perigoso para a nossa saúde.
Numa outra latitude, o jornalismo também não constitui excepção, havendo no entanto aqui que utilizar um microscópio especial para detectar as eventuais ameaças à saúde das pessoas que tomam contacto com o referido produto.
Lamentavelmente, embora em doses ainda limitadas, o jornalismo angolano começa a ficar contaminado por um dos vírus mais perigosos que ataca o nosso produto.
É o vírus da chantagem e da extorsão, a configurar um evidente ilícito penal, absolutamente incompatível com qualquer perspectiva de abordagem do fenómeno jornalístico, mesmo nas condições concretas e muito especiais de um país chamado Angola, onde tudo pode acontecer. E acontece mesmo.
É como nas guerras verdadeiras.
Mesmo para as guerras existem convenções que limitam certas intervenções dos beligerantes em nome do direito humanitário.
São as famosas convenções de Genebra que, desgraçadamente, a maior parte das guerras ignora, pisoteia, agride. Viva a Paz!
Por exemplo não se pode matar um inimigo se ele estiver desarmado. Não se podem maltratar ou torturar os prisioneiros de guerra. Não se podem usar certas armas letais.
Na minha dupla condição de produtor e consumidor de informação participei a semana passada, como palestrante, nas Jornadas sobre Comunicação Social promovidas pelo CEFOJOR, uma iniciativa que já vai na sua quarta edição.
As Jornadas parecem assim, pela mão firme do Mário Costa, ter entrado já para o calendário anual das poucas actividades relevantes relacionadas com o nosso panorama mediático.
Relevantes sobretudo no plano da reflexão profissional, ao “serviço do bom jornalismo”, numa altura em que nos aproximamos de um dos períodos mais complicados para a vida da comunicação social e dos jornalistas em qualquer país.
Estamos a falar das eleições que se avizinham de uma data colocada no horizonte de Setembro de 2006, com todas as expectativas que elas encerram. Boas e más.
Estamos preocupados com o andar da nossa carruagem mediática, pelo que decidimos propor à classe, desta tribuna, no espírito da auto-regulação, a discussão e adopção de uma convenção contra a chantagem e a extorsão, considerando tais ilícitos, como limites absolutamente inultrapassáveis por quem anda nas nossas lides.
É uma espécie de mínimo denominador de comum que pensamos ser possível discutir serenamente e adoptar rapidamente em Assembleia-Geral de todos os interessados em combater o mencionado vírus.
Estão todos convidados a tomar parte no encontro que ainda não tem data marcada.]
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Inventada ou não pela globalização, a transparência está na moda, e ainda bem que assim o é.
O problema é que a moda está a custar a pegar, embora todos manifestem simpatia e muito apreço por ela, considerando-a uma onda bué fixe!
Discursos, intenções e proclamações, num desfile por conhecidas passarelles, onde famosos estilistas e esbeltos manequins vendem da melhor forma as suas habilidades.
A transparência é daquelas modas que não faz mal a ninguém, que não coloca problemas de idade, nem de sexo, nem de raça e muito menos de religião.
Está ao alcance de todos por uma módica quantia que habitualmente não ultrapassa vontade efectiva e real de cada um em querer ser transparente, sobretudo quando se tem responsabilidades públicas.
Aí a transparência vira exigência, vira cultura, por razões demasiado óbvias para o mais comum dos cidadãos.
Tendo em conta as críticas dos mais ferozes adversários da globalização, e como suposto produto da mesma, a transparência parece-nos ser claramente aquele que menos choca com as particularidades culturais de cada povo deste planeta-terra.
Antes pelo contrário, ela, a transparência, assume-se como um valor intrínseco e por excelência da própria globalização, entendida esta como uma filosofia de vida mundial que tenta juntar no mesmo saco, que ainda é de gatos, referências que nos são comuns e que podem viabilizar consensos à escala universal, como a democracia das urnas e o respeito pelos direitos humanos.
Não é certamente esta a praxis da globalização de que vamos tendo notícias que inundam diariamente os espaços informativos que vamos consumindo, muitas vezes com o sabor amargo das imposições brutais dos donos do planeta que se dão ao luxo de destruir civilizações inteiras em nome sei lá do quê, para depois realizarem conferências internacionais de doadores à caça de migalhas.
Na moda está igualmente o jornalismo. Uma moda mais antiga que, entretanto já pegou, que já tem raízes profundas em todo o mundo e graças à qual todas as outras modas vão chegando com maior ou menor rapidez ao conhecimento da opinião pública.
É de facto graças a actividade jornalística, com todos os defeitos que a mesma possa enfermar, o principal dos quais parece ser a manipulação da realidade, que as pessoas se vão apercebendo que existem outras modas dentro e fora do país, como é o caso da muito badalada transparência, transformada já na principal dor de cabeça de muitos executivos, sobretudo daqueles que não conseguem resolver os problemas dos seus cidadãos sem a ajuda de uma tal de comunidade internacional.
Nesta comunicação resolvemos associar estas duas modas, a transparência e a actividade jornalística, partindo antes de mais da constatação que são necessariamente múltiplos e complexos os ângulos existentes quando se pretende abordar um tal relacionamento que é a todos os títulos profundamente dialéctico.
Na impossibilidade de conferirmos a esta modesta comunicação a abrangência quilométrica de uma tese de doutoramento que ela precisaria para dissecarmos a problemática em causa de todos os seus ângulos, vamos ficar-nos por dois deles que terão um pouco mais a ver com a temática deste painel dedicado ao jornalismo de especialidade, na sua vertente económica.
Vamos assim, primeiro, ater-nos à transparência enquanto exigência fundamental do jornalismo económico do ponto de vista do desempenho dos seus profissionais, com as atenções particularmente voltadas para o seu relacionamento com as fontes.
Em nome da honestidade, temos de reconhecer que a realidade mediática angolana a este nível já inspira alguns cuidados à semelhança do que se passa noutros sectores, incluindo a justiça, onde a conjuntura de apertos, dificuldades e salários incompatíveis, dominada por uma grande variável chamada gasosa, explica muitos comportamentos difíceis de entender à primeira vista. Será possível fazer alguma coisa contra esta tendência, que acaba por ser ditada pelo próprio mercado?
Uma interrogação que desde já deixamos à consideração dos presentes, conscientes de que as coisas estão cada vez mais complicadas para quem pretende sobreviver neste mercado. 
Em nome da sobrevivência de projectos e postos de trabalho, os fundamentos mais estruturantes do jornalismo de referência têm estado a recuar para posições pouco confortáveis para uma profissão que tem a missão de estar a atenta a tudo e todos, em defesa do interesse público.
Por outras razões e com outros objectivos assiste-se ao mesmo recuo em outras paragens do mundo, onde, era suposto os jornalistas terem todas as condições e mais algumas em matéria de independência, para o cabal exercício da sua actividade.
Os EUA, para a surpresa de muito boa gente, oferecem-nos situações bastante complicadas onde o chamado jornalismo financeiro está a transformar-se num parceiro ideal de empresários e investidores, alguns dos quais são os próprios jornalistas.
Algo triste ocorreu ao longo do tempo, confessa-nos a jornalista norte-americana Diana B. Henrique reflectindo sobre a realidade em transformação do exercício da profissão nos States na área do jornalismo financeiro.
Para a nossa confrade norte-americana à medida que a audiência pretendida se tornava mais limitada, acontecia o mesmo com os jornalistas, com os seus horizontes.
Diana Henriques diz-nos que actualmente o jornalismo financeiro nos EUA, “raramente tange as cordas sonoras dos temas emocionantes do grande jornalismo. A maioria simplesmente grunhe e cochicha”.
O segundo ângulo desta abordagem tem a ver com a capacidade de um jornalismo económico transparente e actuante contribuir para uma gestão transparente de um dos bens mais preciosos que qualquer sociedade tem à sua disposição que é o seu erário, o seu tesouro público. O destaque aqui será conferido ao jornalismo investigativo, o grande ausente da nossa praça onde por vezes é confundido com outras intervenções mais superficiais que não têm de facto a profundidade e a consistência que são exigidos a um tal jornalismo. Uma ausência que tem várias explicações, uma das quais será o receio alimentado pelos próprios jornalistas de sofrerem algumas consequências menos simpáticas para a sua saúde física, num país tão violento como é o nosso.
Para além de todas as conhecidas desgraças que têm vindo a assolar os países em vias de desenvolvimento, está hoje mais do que provado que a má gestão da coisa pública começa a emergir como sendo a principal causa do atraso e da pobreza.
O caso nigeriano, com os mais de dois biliões de dólares desviados pelo já falecido Sani Abacha, fala bem desta nova realidade que, no seu conjunto, já terá custado ao continente africano pelo menos 140 biliões de dólares, de acordo com as estimativas avançadas há dois anos pelo Presidente Olusegum Obasanjo.
Não conseguimos saber qual foi a base da estimativa feita pelo actual Chefe de Estado nigeriano, um dos defensores, da aprovação a nível internacional de convenções que penalizem todos quantos estejam envolvidos em desvios de fundos públicos, incluindo os países e os bancos para onde as astronómicas somas são encaminhadas de forma fraudulenta.
 Seja como for, todos parecemos estar de acordo em relação ao impacto positivo de uma boa governação para a rápida resolução dos problemas sócio-económicos de qualquer país.
Em Angola foi o próprio Presidente José Eduardo dos Santos quem muito recentemente, por ocasião das celebrações do 29º aniversário da independência nacional reconheceu esta necessidade ao destacar a necessidade de se analisar os erros cometidos, a fim de os corrigir, melhorar a fiscalização e realizar mais inspecções financeiras.
O jornalismo económico está aí, com as portas bem abertas, para participar activamente neste esforço de correcção, que tem de ser necessariamente crítico, transparente e substantivo, para que um tal exercício possa resultar como deve ser e não ficar apenas no plano das intenções e das promessas, que acaba por ser a principal imagem de marca dos políticos, sobretudo em vésperas de eleições.
Entre as várias questões relacionadas com a transparência que se colocam ao exercício da actividade jornalística, pensamos que uma das mais estruturantes tem a ver com o conceito da objectividade, apontado  pelo académico brasileiro Perseu Abramo (PA), como sendo a pedra de toque para se fazer face aos perigos da manipulação, com maior ou menor sucesso em função de cada contexto mais específico.
Ele separa claramente a objectividade dos restantes conceitos que normalmente norteiam a actividade jornalística, no plano da ética e da deontologia.
Abramo que sustenta e bastante bem a impossibilidade do jornalismo ser imparcial, neutro e isento, que considera que nem sequer é desejável que tal aconteça, abre uma excepção para o binómio honestidade/desonestidade, partindo do pressuposto que todos devem por princípio louvar o pólo positivo da vida, o seu lado bom.
Em relação à objectividade as coisas são diferentes, encontrando-se aqui, para PA, a chave para a solução dos problemas de credibilidade e de transparência que o jornalismo levanta, tendo em conta todo o seu potencial manipulador da realidade.
 “A objectividade, diz-nos o Mestre brasileiro, tem a ver com a relação que se estabelece entre o sujeito observador e o objecto observável (a realidade externa ao sujeito ou exteriorizada por ele), no momento do conhecimento. A objectividade não é um apanágio nem do sujeito nem do objecto, mas da relação entre um e outro, do diálogo entre sujeito e objecto; é uma característica, portanto, da observação, do conhecimento, do pensamento.”
A questão fundamental que ele coloca está relacionada com a possibilidade concreta de procurar a objectividade e de tentar aproximar-se ao máximo dela.
Perseu Abramo acha que sim, que é possível e desejável fazer jornalismo com o máximo possível de objectividade.
Essa, aponta, “é a única forma de reduzir ao máximo o erro involuntário e impedir a manipulação deliberada da realidade.
O reino da objectividade é a informação, a notícia, a cobertura, a reportagem, a análise, assim como o reino da tomada de posição é a opinião, o comentário, o artigo, o editorial.
É fundamental, conclui Perseu Abramo, separar e distinguir informação de opinião, indicar as diferenças de conteúdo e forma dos géneros jornalísticos, e apresentar toda a produção jornalística ao leitor/telespectador para que ele perceba imediatamente o que é a exposição da realidade e o que é o juízo de valor.
Temos pois no conceito da objectividade, a pass-word mais estrutural para entrarmos com alguma segurança no mundo de um jornalismo económico transparente a altura dos desafios que o mesmo coloca para se poder afirmar como um parceiro sério e credível aos olhos de toda a sociedade e dos diferentes poderes com destaque para o político, sem ignorar o económico, num país onde esta fronteira não é nada fácil de estabelecer.
Uma rápida vista de olhos seguidamente para o relacionamento com as fontes, no seu sentido mais abrangente, onde parece estar localizado o principal calcanhar de Aquiles da nossa praxis jornalística, a projectar uma realidade cada vez mais movediça para a credibilidade dos profissionais e dos projectos editoriais.
Estamos, sintomaticamente, a falar de um mercado onde o investimento publicitário é manifestamente insuficiente para garantir a sobrevivência dos diferentes projectos, com todas as consequências perversas que daí resultam, sem dúvidas muito más conselheiras para quem quer abraçar a transparência como bússola para a actividade jornalística.
A problemática das encomendas e da publicidade encapotada surge necessariamente neste contexto de dificuldades e ameaça de facto tomar conta do nosso panorama mediático, como uma alternativa em termos de sobrevivência.
Mas, mais grave do que isso, sem dúvidas muito mais grave, porque configura já um comportamento passível de condenação judicial, são as informações de muito boa fonte a que vamos tendo acesso sobre a existência de casos de chantagem e extorsão difíceis de entender e muito menos de aceitar.
Isto, sublinhe-se, por mais dificuldades que determinado projecto possa estar a enfrentar.
Isto, note-se, por menos reservas morais que a sociedade possa exibir no seu conjunto, com as atenções voltadas lá para cima, de onde de facto deveria vir o exemplo e claramente não vem.
Aí sim, aí é o fim da picada.
Já o escrevemos noutros espaços que qualquer pessoa ou instituição está no direito de contactar determinado jornalista por achar que ele é o profissional mais adequado para dar o melhor tratamento ao assunto que gostaria de ver estampado para consumo da opinião pública.
Até aqui não vemos qualquer problema que possa ferir a ética e a deontologia profissionais. Aliás, os próprios gabinetes de imprensa que hoje pululam por tudo quanto é instituição, são bem o reflexo desta necessidade de “vender” a melhor imagem junto da comunicação social, sem haver necessidade, muitas vezes, de se recorrer à publicidade paga. Uma entrevista, um artigo ou uma reportagem assinado por um reputado jornalista sobre determinado caso, empresa, instituição, projecto ou iniciativa vale muito mais do que uma página inteira de publicidade do tipo eu sou o melhor do mundo, depois de mim há pouco mais por aí.
Ao ser contactado directamente por pessoa particular ou por entidade colectiva, seja ela privada, governamental, partidária ou religiosa, o jornalista que aceita o “canto da sereia” tem que vincar imediatamente a sua postura profissional em obediência aos “sagrados sacramentos do métier”.
Tudo bem, acho que a história que me sugere tem evidente interesse público, só que terei que trabalhar com outras fontes para além da sua, sobretudo porque em jogo está o nome de uma outra pessoa”.
Esta poderia ser uma resposta a ser dada a quem convida o jornalista para escrever aquele tipo de história onde existe uma acusação clara ou velada contra alguém.
Assim sendo, tudo bem, a “encomenda” pode ser perfeitamente aceite, até porque se estará a lidar não com uma encomenda no verdadeiro sentido da palavra, mas apenas com uma pista segura, o chamado furo, que é o que jornalistas precisam para quebrarem a rotina de quando em vez.
Lamentavelmente o que se está a passar com o jornalismo entre nós é, muitas vezes, a aceitação da encomenda sem condições, o que leva a que o jornalista contactado se transforme num puro instrumento de quem está na “ofensiva” por qualquer motivo.
Estas referências, que como é evidente não esgotam as questões atinentes à problemática da transparência ou da falta dela no exercício da actividade jornalística, servirão certamente para alguma coisa em termos de orientação do debate que pretendemos suscitar nestas jornadas preocupadas com o bom jornalismo, ou melhor, com a falta dele.
Mais rapidamente, vamos agora olhar para o segundo ângulo desta abordagem que tem ver com a contribuição que um jornalismo económico transparente e actuante pode dar à gestão de um dos bens mais preciosos que qualquer sociedade tem à sua disposição que é o seu erário, o seu tesouro público. Uma gestão que se pretende, obviamente, transparente.
O Nobel da Economia Joseph Stiglitz, defende a transparência no governo e afirma que a mídia é essencial na promoção da boa governação.
"A liberdade de expressão e a liberdade de imprensa não somente tornam menos prováveis os abusos dos poderes públicos, mas também aumentam a probabilidade de que as necessidades sociais básicas da população sejam atendidas," afirma Stiglitz.
O académico está convencido que "melhorias na informação e nas normas que regem a sua divulgação podem diminuir o alcance desses abusos em ambos os mercados e nos processos políticos. Muitas das decisões tomadas na arena política têm consequências económicas”.
Além disso, acrescenta Joseph Stiglitz, “informações melhores e mais oportunas resultam em alocações de recursos melhores e mais eficientes”.
O jornalismo económico a altura das suas responsabilidades é um "factor de desenvolvimento" capaz de contribuir para melhorar a responsabilidade, criar mercados eficientes e sociedades ricas de informação.
Só empresas de média financeiramente independentes estão, entretanto, em condições de desempenhar da melhor forma o seu papel, como produtoras de um jornalismo económico eficaz.
Tendo em conta o que se passa com a realidade angolana, percebe-se facilmente neste contexto a importância estratégica desta independência que em condições normais seria o resultado tanto da economia como da habilidade da própria empresa em fazer com que um determinado ambiente económico lhe seja vantajoso.
A eficácia do jornalismo económico enquanto promotor da transparência na governação reside em grande parte na sua capacidade de investigar o que vai mal, assumindo-se deste modo como um factor de dissuasão.
A imprensa, sustenta o professor de jornalismo Silvio Waisbord, de nacionalidade  norte-americana, deverá tornar o governo responsável, publicando informações sobre questões de interesse público, mesmo se essas informações revelarem abusos ou crimes perpetrados por autoridades.
A partir dessa perspectiva, aponta, “o jornalismo investigativo é uma das mais importantes contribuições prestadas pela imprensa à democracia. Ele está relacionado com a lógica de responsabilidade mútua em sistemas democráticos. Ele fornece um mecanismo valioso para monitorar o desempenho das instituições democráticas, em sua definição mais ampla que inclui organismos governamentais, organizações cívicas e empresas públicas”.
A centralização dos meios de comunicação nas democracias contemporâneas, segundo Sílvio Waisbord, “torna as elites políticas sensíveis às notícias, particularmente às "más" notícias que frequentemente causam comoção pública. A publicação de notícias sobre más condutas públicas e económicas pode provocar investigações judiciais e parlamentares.”
Em Angola já é facilmente visível o impacto devastador de tais notícias, embora as suas consequências nem sempre sejam as mais desejadas e prolongadas em termos de melhoria da gestão da coisa pública, com a consequente penalização dos eventuais infractores.
Um impacto que é sempre directamente proporcional à qualidade e profundidade da matéria dada à estampa.
Como bússola orientadora para esta intervenção tem-se o conceito da objectividade atrás referido, com base na equação formulada pelo seu progenitor, o Professor Perseu Abramo.
O conhecimento da realidade é tanto mais objectivo quanto mais o sujeito observador não se prende às aparências, procura envolver totalmente o objecto da observação, busca seus vínculos com o todo ao qual pertence, bem como as interconexões internas dos elementos que o compõem, investiga os momentos antecedentes e consequentes no processo do qual o objecto faz parte, reexamina o objecto sob vários ângulos e várias perspectivas”.
Se o sujeito observador faz isso, Abramo conclui que ele tem grandes probabilidades de conhecer, com o máximo de objectividade possível, o objecto real em que está interessado. 
Rigor e competência é pois o que se exige do jornalista na apreensão do real.
Para tal o conselho do francês Claude Julien, é que o “jornalista enquanto observador deve ser capaz de situar todo o problema nacional no seu contexto mundial, prever as evoluções prováveis, apelar a um campo extremamente diversificado de conhecimentos. Se encerra a sua visão num círculo demasiado estreito, será certo que deformará a sua percepção da realidade, deformá-la-á por amputação de um elemento essencial, condenar-se-á a fazer dela um julgamento errado. Sem o querer, ele engana o seu público.”
Reside aí a importância do jornalismo investigativo, pois o seu produto, por resultar de um outro tratamento mais cuidado, é sem dúvidas muito mais resistente aos habituais desmentidos e outras tantas acusações menos simpáticas, com que normalmente os jornalistas são brindados, quando as suas matérias chocam com determinados interesses bem colocados, particularmente ao nível da super-estrutura.
Quanto a nós o problema de fundo em Angola está relacionado com a normalização politico-constitucional em curso, com a entrada do país no ciclo democrático, o que pressupõe antes de mais a realização periódica de eleições, com toda a componente de prestação de contas que o democrático exercício encerra.
É por esta via que a democracia acaba por encher as barrigas vazias de promessas não cumpridas, de planos não executados, de orçamentos desviados, com um simples não de quem elege no candidato ou no partido que durante os últimos quatro ou cinco anos teve um determinado mandato e não o cumpriu à contento do eleitorado.
Quando inaugurarmos este ciclo, maior importância do ponto de vista da sua eficácia terá certamente o jornalismo económico enquanto parceiro de toda a sociedade na edificação de um sistema de governação transparente.
*Comunicação apresentada às Quartas Jornadas Técnicas da Comunicação Social promovidas pelo CEFOJOR/Luanda/ 25 de Novembro 2004