segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

O futuro de JES, os cenários de Marcelo e os ventos do Magreb

["A Capital" convidou-me a comentar um comentarista, o que não é muito normal, já que cada um faz os comentários que melhor entender, por mais estapafúrdios que possam ser. Os factos são sagrados, mas os comentários são mesmo livres. Chamando-se o comentarista Marcelo Rebelo de Sousa (MRS), entendi a importância dada ao ilustre cidadão e constitucionalista português, mas continuo a pensar que os comentários dos comentaristas não devem ser objecto de outros comentários, a não ser em debate organizado para o efeito. Acedi, entretanto, comentar MRS, porque o tema é da maior importância e de reconhecida actualidade, tendo em conta os ventos fortes que estão a soprar a partir do Norte de África.] O futuro do Presidente José Eduardo dos Santos voltou a ser tema de destaque além-fronteiras, desta feita a partir de Luanda e através das especulações do comentarista político português, Marcelo Rebelo de Sousa (MRS), tendo como palco a TVI, onde o constitucionalista tem lugar cativo aos domingos, no seu prime-time. Como é evidente, o comentarista assumiu as referidas especulações como sendo apenas da sua lavra e da sua inteira responsabilidade, no âmbito do já recorrente exercício de antecipação de cenários, na base de hipóteses prováveis, que os comentaristas políticos fazem normalmente para ganharem tempo e protagonismo e ao mesmo tempo pressionarem subtilmente quem de direito. É um pouco a recuperação da história da mitologia grega dos oráculos e das pitonisas. Em abono da verdade, estamos em crer que, se o mais famoso adivinho desses tempos, de seu nome Tirésias, ressuscitasse agora e fosse transportado para a realidade angolana dos nossos dias, ele teria a sua actividade muito dificultada, senão mesmo inviabilizada. Voltaria mais rapidamente do que estaria a pensar ao seu túmulo. Conta a lenda que o tal de Tirésias que era tilho de Everes e da ninfa Cariclo, conhecia o passado, o presente e o futuro, além de interpretar o vôo e a linguagem dos pássaros. Em Angola ele precisaria de saber interpretar outros voos e outras linguagens. Estaria feito ao bife, como se costuma dizer. Não é a primeira vez e certamente não será a última, que ouviremos o “prolixo” Marcelo Rebelo de Sousa traçar cenários para a política angolana, onde de facto a insondável figura de JES é central e incontornável, para não utilizarmos outros adjectivos mais espaçosos. Nada do que disse, contudo, MRS no passado domingo já não foi dito por aqui na nossa comunicação social em intervenções igualmente especulativas dos seus mais distintos analistas. Nestas abordagens futuristas já se incluiu até o cenário da sucessão de JES pelo seu primogénito, na senda do que vem acontecendo um pouco por toda a África, tendo o último recuo nesta tendência sido registado no Egipto, onde Hosni Moubarak, por pressão da praça de Tharir, acabou por dar o dito pelo não dito em relação aos planos iniciais com seu “Kamalzinho”. Em resumo MRS admitiu dois cenários. Como resultado do próximo congresso extraordinário do MPLA marcado para Abril, JES anuncia a sua retirada e não volta a ser o candidato presidencial, mantendo contudo a liderança do partido até ao Congresso de 2014 (40%). No segundo cenário, JES mantém-se como candidato para pensar em abonar a presidência durante o próximo mandato, caso venha a ser eleito (60%). Na linha de sucessão, MRS colocou Carlos Feijó, Manuel Vicente e Fernando da Piedade Dias dos Santos, entre outros potenciais candidatos não nomeados. Basicamente e citando de memória foi este, mais ou menos, o conteúdo dos cenários montados a partir de Luanda pelo analista português numa tentativa de fazer alguma futurologia, tendo como referência a possibilidade de JES ter já definido o que pensa fazer em relação ao seu futuro. Em meu entender e apesar de já me terem garantido que JES não quer ser o Mugabe de Angola, continuo a não ver no futuro mais próximo sinais concretos que apontem para a possibilidade de estar já em marcha algum período de transição no seio do MPLA, tendo em vista a substituição do “candidato natural”. Pelo contrário e conforme minha previsão anterior feita aqui na “Capital”, tudo o que me é dado a observar, particularmente ao nível da gestão da coisa pública, aponta para a manutenção de JES no poder enquanto a Constituição lhe permitir.MRS passou completamente ao lado deste terceiro cenário, que para mim é o mais provável, embora a actual conjuntura africana/internacional criada com os últimos acontecimentos da Tunísia e do Egipto possa aconselhar a uma nova reflexão em torno desta sensível problemática, que continua a ser o grande tabú dos “camaradas