terça-feira, 22 de março de 2011
Relações Angola/EUA à prova de barco
O barco americano (Maersk Constellation-MC) que esteve retido no Porto do Lobito por duas semanas foi o segundo tópico do debate deste domingo no Semana em Actualidade.
A tentativa do MPLA, através do seu principal porta-voz de serviço, RFPA, de relacionar os contentores de munições que o MC carregava a bordo e que estiveram na origem da bronca com as autoridades portuárias do Lobito, com a situação política em Angola a apontar para uma possível ingerência norte-americana em Angola, pareceu-me ser excessiva e mesmo algo provocatória.
Foi o aspecto politicamente mais sensível do caso, a traduzir o momento menos bom que as relações entre Luanda e Washington estão a atravessar, depois da maka do encerramento das contas bancárias da embaixada/ANIP, a que podem estar associados outros elementos ainda encobertos, mas que já começaram a alimentar alguma literatura nos corredores do poder angolano, com destaque para o texto que José Mena Abrantes publicou recentemente, sob o título "A Revolução Rosa de Porcelana e as Marionetas".
É estranho que o nível das relações bilaterais que parecia já ter atingido a sua velocidade de cruzeiro, depois de todas as turbulências anteriores, não tenha conseguido fazer face, com um outro desempenho, a este contra-tempo, que aparentemente não tem nada de extraordinário.
A administração Obama mostrou-se disponível, dentro das suas possibilidades, para junto de quem de direito ajudar a resolver o bloqueio que foi imposto pela banca comercial estadunidense a todos os dinheiros provenientes de Angola, por alegada falta de transparência com que se movimentam os dinheiros públicos entre nós.
Voltando ao caso do navio, soube-se que os primeiros contactos para a solução do caso foram bastante tensos, com a parte angolana a acusar efectivamente os representantes dos Estados Unidos de tentarem enganar as autoridades portuárias, com propósitos inconfessos.
Felizmente para o relacionamento bilateral que os ânimos se acalmaram e que prevaleceu o bom senso depois dos esclarecimentos prestados pelo armador do navio, que nunca foi ouvido pela imprensa.
Ao que julgamos saber a sua versão dos factos é diferente daquela que foi veiculada pelas autoridades portuárias do Lobito e retomada pelo comunicado do Ministério das Relações Exteriores (MIREX).
A possibilidade da Maersk vir a ser processada em tribunal, conforme ficou explícito nas ameaçadoras “alegações finais” deste primeiro round, seria uma boa oportunidade do caso ser definitivamente esclarecido a bem da verdade, tendo como referência a aplicação dos princípios do contraditório e da igualdade de circunstâncias no tratamento das partes em conflito.
Ao que consta e como nota de roda-pé, com este mini-braço de ferro ocorrido no Lobito, as autoridades angolanas quiseram enviar uma mensagem muito específica ao "amigo americano".
Tendo em conta a sua quase ilimitada capacidade/poder de influenciar tudo e todos, o executivo angolano não entende (ou não quer entender) que um governo não possa resolver um determinado problema por mais complicado que ele seja.
A não ser, que esse governo não esteja realmente interessado em fazê-lo.
Este tipo de abordagem já se tinha verificado com a França, por ocasião do caso Pierre Falcone.
Na altura tal, como está a acontecer agora com o indigitado embaixador norte-americano, também o francês ficou na "bicha" da acreditação longos meses, a tal ponto que Paris chegou a encarar a possibilidade de repatriá-lo.