sexta-feira, 26 de novembro de 2010

(Flashback/Novembro 2000) O Inquérito de Proust

Em Novembro de 2000, o falecido Manuel Dionisio mandou-me o bilhete que se segue:
"Meu caro: Marcel Proust ("A La Recherche du Temps Perdu" - obra monumental que se pode encontrar em português, sendo que a edição mais pequena é de sete volumes, pelo menos - perdoa o rappel - mas ainda de "O amor de Swan", etc.) elaborou um famoso inquérito que tem o seu nome e que ele submeteu à intelectualidade do seu tempo. Bom, não me preciso de me alongar mais: Eis o inquérito que a secção GENTE do Jornal de Angola te submete para responderes. Um abraço, MD
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P-Qual a tua virtude favorita? Acho que todas já são muito poucas para me dar ao luxo de estar a escolher apenas uma delas. Vivemos num mundo demasiado defeituoso. P-Principais qualidades de um homem. Ser suficientemente amigo do seu vizinho para não permitir que ele ande na rua a pedir esmolas ou a comer nos contentores. Esta qualidade é particularmente admirada por mim nos homens que têm responsabilidades ao nível dos poderes públicos. P-Principais qualidades de uma mulher. Se for a nossa só depois dela se ir embora é que a gente passa a ter uma ideia do que é que perdeu. De resto, são todas muito fixes, enquanto não começam as makas. P- Qual a ocupação preferida? Jornalismo e banhos de mar. P-Qual a tua principal característica? Com o passar dos anos, as características também se alteram. P- O que é para ti a felicidade? É não ter receio de enfrentar o amanhã, coisa difícil de acontecer em Angola. Até ver. P-O que é a miséria? É o fim da picada. P- Qual a tua cor e flor preferidas? Já foi o azul. Hoje é o verde. Quanto a flores não tenho nenhuma preferência especial. A minha ignorância nesta área é tão grande que acho que para além das rosas, não sei distinguir mais nenhuma. Gosto de rosas brancas. P- Se não fosses tu mesmo quem gostarias de ser? A mesma pessoa sem alguns defeitos de fabrico que possuo. P- Onde gostarias de viver? Em Nova-Yorque, depois de Luanda. P- Quais os teus autores de prosa preferidos? Para além de jornais e revistas, cada vez leio menos. Fico-me com o Gabriel Garcia Marquez. P- Quais os teus poetas preferidos? Não tenho nenhum. Acho que nunca acabei de ler um livro de poesia. P- Quais os pintores e compositores? Nada a assinalar de particular em relação à pintura. Quanto à música estou numa fase em que o Djavan resolve a maior parte dos meus problemas. Nunca confessei isto a ninguém, mas o melhor trabalho musical feito cá na banda para mim foi o “Coisas da Vida” do André Mingas. P- Teus heróis preferidos na vida real? Aquele parente, cujo nome desconheço, que enfrentou na Praça Tianamem o tanque de guerra do exército chinês. Na Birmania também vive uma senhora, que eu muito admiro muito pela coragem com que tem enfrentado a ditadura local. P- Teus heróis preferidos na ficção? Quando era puto gostava muito do Fantasma e do Robin dos Bosques. P- Tuas heroínas preferidas na ficção? Nada a assinalar. P- Qual a tua comida e bebida preferidas? Calulu de bacalhau com choco. Vinho tinto, scotch e água. P- Quais os teus nomes preferidos? Nomes simples do tipo Ana. P- O que não toleras? A perseguição política e o culto da personalidade. Mas tem mais. P- Quais os personagens históricos que detestas? O Torquemada e o Hitler à cabeça de uma interminável lista de canalhas. (cont)