Um dos temas abordados este domingo no Semana em Actualidade da TPA, que marcou o regresso do Ismael Mateus após um mês de ausência, foi a remodelação governamental.
Após cerca de 3 anos à frente do Governo Provincial de Luanda, Francisca do Espirito Santo (FES) foi "retirada da circulação" abrindo caminho para o regresso à capital de José Maria dos Santos que estava a fazer um "estágio" no KK como Vice-governador, com resultados pouco animadores.
De uma forma geral, os nossos comentários foram muito pouco simpáticos em relação ao consulado de FES. Estávamos, contudo, longe de imaginar que afinal, o que dissémos, acabou por se revelar um "elogio" ao lado das duras palavras proferidas esta segunda-feira pelo Presidente José Eduardo dos Santos na tomada de posse dos novos governantes.
Sem se tratar já de uma grande novidade, esta "mania" de JES "fritar" os seus colaboradores, distanciando-se da governação como se nada tivesse a ver com a ela, sentiu-se que o "óleo" usado desta vez para o efeito estava demasiado quente, a traduzir, possivelmente, mais um ponto de viragem.
Exactamente para aonde, é o que resta saber, sem alimentarmos qualquer tipo de expectativa, pois já faz parte do discurso político, nesta e noutras paragens, prometer dias melhores, quando já não há mais nada de substancial para dizer.
JES que "disparou" indiscriminadamente sobre todos os exonerados, não tendo sequer poupado Assunção dos Anjos que deixou o governo a seu pedido por razões "atendíveis", justificou a remodelação parcial com a necessidade de superar dificuldades e constrangimentos.
Depois atacou alguns chefes que nos diferentes níveis continuam a trabalhar com métodos desenquadrados das normas e com dificuldades de adaptação à nova era.
“Nos processos de transformação social há sempre elementos que oferecem resistência à mudança. O nosso caso não é diferente. Assumimos há dois anos o compromisso de realizar mudanças nos nossos métodos de gestão e de trabalho"
Mais uma nova era de gestão responsável e transparente da coisa pública, foi anunciada por JES a fazer lembrar-nos o seu já esquecido futuro que devia começar ontem."O futuro começa agora"- lembram-se?
A promoção e a assunção de uma atitude mais firme de combate à indisciplina e à desorganização e uma melhor defesa dos interesses nacionais, foram os reforços de verba propostos pelo "OGE" presidencial.
Esta da "defesa dos interesses nacionais" foi verdadeiramente a cereja em cima do bolo das nossas desgraças. Uma cereja que o novo Governador de Luanda não perdeu a oportunidade de "saborear", como veremos mais adiante.
Qualquer leitura que se faça das palavras de JES, ela só pode apontar numa direcção que é convergente.
Os exonerados foram literalmente trucidados pelo "Pai Grande" na praça pública.
Nunca como desta vez, em situações do género (remodelações), JES foi tão explícito na forma como chamou os antigos "bois" pelo seu nome.
*******************************************************************************
Uma Governadora que não deixa saudades
*******************************************************************************
No caso concreto da ex-Governadora de Luanda tais palavras encaixam-se bem na anterior apreciação preliminar que já aqui fizémos sobre o seu desempenho, descontando todas as sobreposições, usurpações e bloqueios institucionais e orçamentais que sabemos serem mais do que muitos e que acabam por transformar a gestão da capital numa missão impossível.
Ajusta-se assim na perfeição a bombástica apreciação feita por Bento Bento, segundo a qual o GPL é "um cemitério de quadros".
Mas mesmo com este e outros descontos, as coisas não mudam muito de figura a favor da gestão de FES, pois o que está em causa nesta altura é a transparência, a moralização e a equidade, como sendo os pressupostos da boa governação/administração da coisa pública.
Nos dias que correm o grande objectivo/desafio é o combate à corrupção institucionalizada e generalizada que é materializada no dia-a-dia através da famigerada e devastadora "lei da gasosa/cabritismo", que acaba por ser a grande responsável pelo insucesso das políticas sociais do Estado angolano, por mais que nos "vendam" algumas estatísticas optimistas, como o aumento da esperança média de vida dos angolanos.
A realidade está aí e não engana ninguém. As estatísticas enganam e de que maneira.
Já começo mesmo a preferir a "lei da bala". Enquanto uma pessoa armada pode matar vários dos seus semelhantes numa hora, mas depois termina os seus dias na cadeia ou enforcado, um gestor corrupto na maior das calmas e sem nunca ser acusado de nada, pode asfixiar lentamente milhares de pessoas carentes na sequência da manipulação de preciosas verbas públicas destinadas a concretização de projectos sociais.
No caso do GPL e em nosso entender, não se trata tanto do assalto directo ao tesouro público (cabritismo). Aqui o ataque é sobretudo dirigido aos cidadãos e aos empresários/investidores (gasosa).
A área do licenciamento das obras, numa cidade que voltou a crescer de forma extraordinária, tem sido a grande mina de enriquecimento ilícito de um conjunto de funcionários da base ao topo. É um ver se te avias. É até fartar, vilanagem...
Sintomático desta realidade foi o apelo que o novo Governador lançou aos seus circunspectos e apreensivos colaboradores no sentido de colocarem sempre a salvaguarda do interesse público em primeiro lugar em detrimento de todas as motivações particulares que, em abono da verdade, são aquelas que mais ordenam e que acabam por condicionar toda a manobra da governação/administração.
Nas poucas palavras que proferiu na tomada de posse foi notória a sua insistência na tecla do interesse público versus interesse particular, como se estivesse já a radiografar a situação herdada.
De uma forma geral o cidadão sente no seu quotidiano que há claramente uma "privatização" do Estado angolano, sendo os governos provinciais e as administrações municipais "bons exemplos" desta dura e traiçoeira realidade.
Contariando todas as nossas expectativas iniciais no que toca a moralização da administração, sentimos que durante o consulado de FES estes e outros ataques aos bolsos dos munícipes, conheceram um incremento considerável, tanto em quantidade, como em qualidade (valor monetário).
A corrupção atingiu efectivamente patamares nunca antes vistos, tendo em conta os elevadíssimos montantes envolvidos nas diferentes "transacções" ocorridas na área do licenciamento das obras. Destes montantes nem um chavo foi parar às contas do Estado.
PS1-Com a nova lei sobre a governação local e tal como chamou a atenção Bornito de Sousa, já há possibilidades dos executivos provinciais passarem a contar com mais recursos fiscais para resolverem os problemas das suas jurisdições. A ver vamos, como é que esta descentralização fiscal vai funcionar de agora em diante.
De nada adianta, contudo, descentralizar se o "apetite" dos funcionários que arrecadam os recursos se mantiver o mesmo e sem qualquer controlo.
Não nos esqueçamos do que disse o PM caboverdeano, José Maria das Neves.
"O petróleo de Cabo-Verde é a boa governação". Até parecia uma piada para os governantes angolanos.
Definitivamente, Francisca do Espírito Santo não vai deixar muitas saudades.
Ela corre o sério risco de ficar na história apenas como tendo sido a primeira mulher que governou o "planeta" Luanda.
E pouco mais, se quisermos ser simpáticos...