No debate deste fim-de-semana sustentei que não há muita (quase nenhuma) vontade política da parte de quem de direito (mas não só, acrescento) em promover de forma mais sistemática e sistémica a reconciliação nacional como um valor fundamental de uma sociedade pós-conflito, pois as apostas da propaganda oficial têm outras prioridades, sendo a principal a promoção da imagem de JES como o "salvador da pátria/arquitecto da paz" e a manutenção no poder do MPLA.
Nestas apostas, muito dificilmente a verdadeira reconciliação entre os "irmãos desavindos", que tem a ver, sobretudo, com a aceitação incondicional do outro, entraria com algum relevo/impacto.
Neste âmbito, em nosso entender, uma mensagem fundamental a passar seria (tentar) convencer os angolanos que o facto de pensar e ser diferente, ser adversário político, ser do poder ou da oposição ou ainda não ser nada (independentes, indiferentes, indecisos, apolíticos, apartidários, objectores de consciência), não impede que continuemos a ser angolanos e a querer o melhor para o país que é de todos nós, sem excepções, nem privilégios, na base da igualdade de oportunidades e da obediência à lei.
Em resumo estamos a defender a ideia da pátria/patriotismo acima dos partidos, dos líderes e dos interesses políticos do momento.
Todos eles hão-de passar, mas Angola é para ficar com todos, porque é de todos.
O que é mais preocupante é que não tem havido o mínimo espaço institucional para este tipo de abordagem, que ultrapasse o circunstâncial proporcionado por algum discurso ou debate de fim-de-semana.
Mesmo a mais recente iniciativa da propaganda oficial aparentemente voltada para o desanuviamento/coesão da sociedade, a campanha de resgate dos valores morais, pareceu-nos estar profundamente ligada a alguns receios (ainda não assumidos) com a conservação do poder relacionados muito particularmente com a necessidade de se "domesticar" as gerações mais jovens, que cada vez assumem mais abertamente o seu descontentamento/frustração pela situação social, rompendo com todas as normas e convenções.
Sinto por outro lado que haverá alguma dificuldade estratégica em promover a reconciliação nacional num quadro de aberta competição pré-eleitoral, sendo, entretanto, este o grande desafio, ou seja, saber conciliar os dois valores que são igualmente democráticos: o respeito e coabitação pacífica com o outro ao lado da discordância e da aposta em sermos melhor que ele na identificação dos problemas e na procura de soluções.
Está já provado que o unanimismo é um péssimo conselheiro e que a luz nasce mesmo da discussão.
A CPI sobre a Intolerância Política que tem a província do Huambo como seu teatro principal de operações, está a levantar questões muito sensíveis ao nível da coabitação entre "irmãos desavindos", sendo quanto a nós, a mais complicada, aquela que relaciona a violência sectária com a existência de alguma instrumentalização político-partidária já no âmbito da caça ao voto.
Esta instrumentalização é que é perigosa e pode, de facto, deitar tudo a perder, pois é muito díficil apagar fogos ateados com um tal propósito.
Vamos pois pensar primeiro no país e na coesão nacional.
Eu sei que este apelo pode até parecer patético e ingénuo, mas é assim que eu penso mesmo, pelo que reitero aqui a necessidade de se avançar com as campanhas de educação cívica anteriormente propostas com base no discurso de JES no 4º Congresso Extraordinário do MPLA.