segunda-feira, 7 de junho de 2010

A midia não é um mercado "normal"

O mercado da comunicação social não é um “mercado normal” onde se podem fazer “transacções normais”, como se estivéssemos a vender uma fábrica de sapatos, para depois a transformarmos numa outra unidade virada, por exemplo, para a produção de papel ou de massa de tomate. Por outras palavras neste mercado existe a chamada liberdade condicionada ou vigiada o que quer dizer que uma única empresa ou um único accionista maioritário por mais dinheiro que tenha não pode comprar todos os órgãos de comunicação social, no caso vertente que estamos com ele, não pode tomar conta de todos os semanários luandenses. A lei fundamental deste país não permite que tal aconteça, tendo a este respeito o Estado assumido a responsabilidade directa de impedir que a concentração se verifique, através da supervisão que foi entregue parcialmente ao Conselho Nacional de Comunicação Social (CNCS) . (Não confundir com Ministério da Comunicação Social, que também deveria ser chamado, em princípio, a ter uma voz activa neste tipo de movimentação. Como não conheço o seu novo estatuto orgânico e muito menos o anterior, aguardarei por mais informações a respeito.) Trata-se, contudo, no caso do CNCS de uma supervisão de fachada pois o Conselho limita-se a receber a informação das empresas que adquirem activos no mercado dos médias, sem ter qualquer capacidade de agir, caso verifique alguma movimentação “estranha”. Contrariamente ao que acontece noutros ordenamentos jurídicos, a Lei angolana não confere ao CNCS poder de impugnar ou vetar um determinado negócio, competindo-lhe apenas “colaborar na fiscalização do cumprimento das normas referentes a participação de capital nacional e estrangeiro nas empresas de comunicação social”. A questão que deve ser discutida imediatamente é como é que (com quem) esta colaboração deve ser efectivada, pois está implícita a existência de outras estruturas envolvidas na mesma fiscalização. A Lei de Imprensa e na sequência do correspondente postulado constitucional, proíbe “ a concentração de empresas ou órgãos de comunicação social, numa única entidade, de modo a constituir monopólio ou oligopólio, pondo em causa a isenção e o pluralismo da informação e a sã concorrência”. Para se saber quem é quem neste mercado, a lei exige que “as acções das empresas de comunicação social que assumam a forma de sociedade anónima têm de ser todas nominativas”. Mais do que isso, a lei diz que devem ser remetidas ao CNCS para efeitos de respeito pela liberdade de concorrência, “ a relação dos detentores de participações sociais nas empresas de comunicação social, a sua discriminação, bem como a indicação das publicações que àqueles pertençam, ou a outras entidades com os quais mantenham uma relação de grupo”. E mais do que isso a lei não diz, mas dizemos nós. A “anormalidade” deste mercado é, pois, ditada pelo próprio Estado, porque em causa está a protecção de um bem maior que a todos interessa manter intacto e à salvo de outros interesses inconfessos que podem, eventualmente, perseguir uma obscura agenda anti-constitucional e anti-democrática. É assim que a nossa Constituição estabelece, é assim que está bem e que deve continuar a ser. Nada a reclamar da nossa parte. O bem maior que se pretende proteger é um direito fundamental, chamado LIBERDADE DE IMPRENSA, que de facto pode ser posto em causa se qualquer dia em Angola todos os jornais e revistas pertencerem a uma “investments” qualquer. Já basta termos o Estado/Governo/Partido no poder a dominar a paisagem mediática na assustadora proporção que se conhece. Neste âmbito a esperança idosa de virmos a ter um serviço público de informação renasceu agora com o compromisso assumido na nova Constituição, mas pode voltar a ser um sol de pouca duração, para não variar. Nos Estados Unidos onde a constituição, através da sua primeira emenda proíbe que se regulamente de qualquer forma a imprensa, existem as mais agressivas leis anti-trust que impedem o estabelecimento do monopólio em qualquer segmento do mercado como sendo a melhor garantia da liberdade de concorrência e por extensão da própria liberdade, enquanto direito fundamental e abrangente dos cidadãos. Em Angola o debate a sério sobre esta “maka” ainda nem sequer começou.